Capítulo IX

1803 Words
O som da voz dele, menos duro, a fez agarrar-se à realidade. Isadora respirou fundo, lutando contra a vertigem. A cada inspiração, o pânico recuava um pouco. Quando conseguiu erguer os olhos, ele a observava com calma. Não havia compaixão explícita, mas também não havia crueldade. Era quase… atenção. Ela piscou, surpresa pela ausência da pressão. — Você não entende. — disse, ainda rouca. — Não eram pessoas normais. Eles faziam coisas… coisas horríveis. Ele ergueu a sobrancelha. — E você sabe disso como? — Porque eu vi. — murmurou, e o peito apertou novamente. — Não tudo. Mas ouvi. Eu ouvia minha mãe chorando atrás das portas. Ela voltava com marcas, hematomas. — O olhar dela ardeu. — O silêncio pairou. Ele tocou a pasta, mas não abriu. Olhava para ela de um jeito diferente agora, como quem mede não apenas palavras, mas dores. — Se tudo isso é verdade… — disse devagar — por que nunca foi à polícia? Isadora sentiu o corpo gelar. Ela riu sem humor, uma risada amarga que quebrou no ar. — Eu tentei, depois do incêndio eu os contatei várias vezes... — confessou. — Eu fui. Com medo, tremendo, mas fui. Ele inclinou a cabeça. — E? — E eles já sabiam. — a voz dela desabou em um sussurro. — Eles me olharam como se eu fosse louca. Como se eu estivesse inventando. Um dos homens da casa… eu reconheci. Ele estava lá, com eles. O silêncio ficou ainda mais pesado. Ela ergueu os olhos, desesperada. — Você entende agora? Não são pessoas normais. Não é um lugar comum. É uma rede. Eles… eles controlam tudo. — O peito subia e descia rápido. — Se você é um detetive, se realmente está atrás da verdade, então precisa acreditar em mim. Ele permaneceu imóvel. O olhar escuro, por um instante, vacilou. Não era dúvida clara, mas também não era a certeza fria de antes. — Um detetive? — ele repetiu, como se experimentasse o gosto da palavra. — Sim. — ela insistiu, agarrando-se à ideia. — Você tem que ser. Ninguém mais poderia estar me interrogando assim. Ninguém mais teria acesso a tudo isso. — O olhar dela se encheu de súplica. — Se for isso, então… então eu estou do seu lado. Ele não respondeu. Apenas a encarou, em silêncio. E, pela primeira vez, não parecia certo de qual era a verdade. A tensão ficou suspensa no ar. Ele pegou a bandeja e a afastou, mas desta vez não por crueldade. Apenas porque precisava sair. Levantou-se, a pasta de couro sob o braço. — Vamos ver. — disse baixo, mais para si do que para ela. — Amanhã. A porta se fechou com firmeza, deixando-a no escuro. Isadora caiu de lado na cama, o corpo ainda trêmulo. Não sabia se havia conseguido algo, mas tinha certeza de uma coisa: pela primeira vez, ele hesitara. E, do outro lado da porta, Dante — embora ela ainda não conhecesse o nome — caminhava pelo corredor em silêncio. As palavras dela ecoavam na mente, chocando-se contra as verdades que ele aprendera a vida inteira. Se ela mentia, era uma atriz brilhante. Se dizia a verdade, então talvez tudo que ele conhecia estivesse podre desde a raiz. E essa dúvida, pequena, mas crescente, começava a corroer mais do que qualquer resistência dela. Depois que foi deixada sozinha, Isadora sentiu a noite pairar na janela, mas naquele quarto silencioso, um barulho chamou a sua atenção. Um vento que assobiava em uma greta da porta e indicava que a mesma fora deixada aberta. Ela estava sentada na cama, os olhos fixos na parede, o corpo ainda tremendo dos últimos dias. Um instinto antigo a fez olhar para a porta: estava meio aberta. Um erro? Ou um convite? Ela não sabia — mas a ideia de liberdade era irresistível. Respirou fundo e, com o coração disparado, deslizou para fora da cama. Cada passo ecoava no corredor. O corredor parecia mais longo, mais estreito, e o ar carregava uma sensação de abandono que a instigava e apavorava ao mesmo tempo. Ela sabia que ele poderia estar em qualquer ponto. Quando alcançou a porta principal do corredor, o mundo pareceu se abrir por um instante. Um corredor vazio, o cheiro de madeira polida e um fio de luz. Ela sentiu adrenalina correndo nas veias, e o medo se misturava a uma estranha sensação de expectativa — medo de ser pega, mas também medo do contato inevitável que já havia sentido antes. Um som atrás dela. Uma sombra surgindo de forma quase imperceptível. Antes que pudesse reagir, um braço forte a agarrou, prensando-a contra o corpo dele. A força era esmagadora: suas costas encontraram a parede com um impacto s***o, os braços dela presos ao lado do corpo, cada músculo tenso, impotente. — Tente fugir de novo — disse ele, a voz baixa, quase um sussurro, mas carregada de ameaça. — Eu quase acreditei que você quisesse minha ajuda. O coração dela acelerou ainda mais, a respiração curta. Ele não precisava falar mais; o peso do corpo dele sobre o dela, a proximidade, cada movimento calculado, dizia tudo. Ela não era nada. Nenhum gesto dela passaria despercebido. Ele segurou o queixo dela com firmeza, inclinando o rosto para que ela olhasse para ele. A intensidade do contato era sufocante, mas ainda assim, havia uma linha invisível: ele não a tocava de forma s****l, mas provocava medo e adrenalina. — Rato num labirinto. É assim que você é, Isadora — murmurou, os olhos escuros estudando cada reação. — Corre, tenta escapar, mas não há saída. Não para você. Enquanto a adrenalina percorria o corpo dela, a mente tentava formular uma resposta, mas o ar parecia pesado demais, as pernas trêmulas demais. Ele a empurrou levemente para frente, forçando-a a recuar. O toque dele nos braços, no ombro, nos pulsos — cada contato era um lembrete de que ela não podia escolher nada. — Você não pode escolher onde ir — disse, e aplicou um toque seco na sola do pé, apenas para reforçar a ideia de controle. — Não pode escolher quando comer. Ele aproximou o polegar da boca dela, pressionando levemente. O gesto não era s****l, mas a tensão criada era inegável, a adrenalina e o medo pulsando em cada centímetro do corpo dela. — Não pode escolher o que vestir. — Ele segurou a alça da blusa dela, rasgando-a de forma que ficasse quase exposta. Ela tentou agarrar a peça para cobrir-se, mas ele soltou e disse, quase indiferente: — Você não precisa fazer isso. Eu só sinto raiva, nojo… desejo não tem espaço aqui. Você existe porque eu permito. Isadora engoliu em seco, os olhos arregalados, sentindo o corpo reagir involuntariamente ao toque e à proximidade. A humilhação, o medo e a adrenalina se misturavam em uma sensação que a deixava trêmula e alerta. Ela estava completamente à mercê dele — e ele sabia disso. — Entendeu? — disse ele, recuando apenas o suficiente para deixar o ar entre eles carregado de tensão. — Cada movimento, cada pensamento, cada impulso seu… está sob meu controle. Ela não respondeu. Engoliu a saliva seca, tentando recuperar o fôlego, mas o pânico e a excitação do contato físico a deixavam vulnerável, indefesa. Cada toque dele, cada gesto, cada comando era um lembrete brutal de que ela não poderia escapar. Então, ele tirou da manga um pequeno frasco com líquido claro, derramando algumas gotas no pano que esfregou em seu pulso. Ela sentiu o efeito lentamente, uma sonolência que tentava resistir, o corpo relaxando involuntariamente sob o toque calculado dele. — É isso, rato — disse ele, enquanto o aroma do líquido se misturava ao ar do corredor. — Você não é nada sem mim. Não pode escolher, não pode decidir. Labirinto. Preso. Frágil. Ele a empurrou levemente contra a parede, apenas para sentir a reação dela, o corpo dela tenso contra o dele, e disse com frieza calculada: — Amanhã, vamos continuar. Mas agora, descanse. Isadora, meio dopada, caiu sentindo o corpo pesado e a mente girando. A última imagem que ficou foi a dele se afastando, o corpo dominante e a presença esmagadora preenchendo cada espaço da sua mente. Ela estava ferida, humilhada, vulnerável… mas viva. E, no corredor silencioso, ele permaneceu parado por alguns segundos, pensando. Pela primeira vez, algo nela o desconcertava. A resistência dela, o medo misturado à adrenalina, a insistência em se proteger, provocavam uma curiosidade quase humana. Não havia compaixão real, mas havia atenção. Ela, presa no quarto novamente, sentiu a humilhação e o medo, mas também uma estranha consciência: ele havia testado não apenas sua mente, mas seu corpo. E, ao fazê-lo, mostrara quem controlava cada movimento dela — e que fugir era inútil. O ar dentro do quarto parecia denso, quase impossível de respirar. A luz difusa atravessava as cortinas pesadas, tingindo as paredes de cinza e marrom. A bandeja de comida no canto parecia inútil, e a cama, sobre a qual Isadora permanecia sentada, se transformara em uma prisão silenciosa, uma extensão do vazio que preenchia cada canto do seu corpo. Ela m*l conseguia mover os braços; os músculos estavam rígidos, trêmulos. Não havia lágrimas, apenas o peso da falta de esperança. Cada respiração parecia um esforço consciente, cada batida do coração ecoava como uma lembrança de que ainda estava viva — e ainda precisava enfrentar aquilo. Ele entrou sem avisos. Não havia gestos dramáticos, apenas a presença que preenchia o espaço. Carregava uma bandeja de comida, mas o movimento era lento, deliberado. Cada passo soava como se quisesse marcar território, e não havia dúvidas: cada detalhe era calculado. — Não mostrei aquele vídeo para ninguém. — Ele deixou a frase fluir, calma, direta, sem levantar o olhar. — Nem para a polícia. Se tivesse mostrado… você estaria presa agora. Está me ouvindo? Ela engoliu em seco, mas nada aconteceu. Não havia reação física, não havia emoção. Um vazio absoluto a mantinha imóvel. A comida parecia irrelevante diante do que ela carregava dentro de si. — Estou te dando a chance de se explicar. — Ele pousou a bandeja na mesa lateral, os olhos finalmente buscando os dela. — Esta é a última oportunidade. Depois disso… não haverá mais chances. Isadora sentiu o frio da resignação envolvendo cada músculo. A mente parecia desligada, os pensamentos secos, cortados de qualquer esperança. O chão do quarto, a cama, as paredes, até o cheiro da comida — tudo parecia distante, quase irrelevante. Ela já havia perdido qualquer sentimento de controle. Mas então, algo dentro dela se moveu. Uma fagulha pequena, quase inexistente: a necessidade de contar tudo, de se libertar do peso que carregava há anos. — Eu… vou falar. — murmurou, a voz rouca, sem emoção. — Não importa quem você seja. Não importa o que vá fazer comigo...
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