Dois dias, 48 horas. Havia dois dias que eu estava aqui, estava tendo praticamente uma overdose. Estava me sentindo um peixe fora d' água. A terra fora de órbita. O fogo sem queimar. Não sai da porta pra fora, comer e dormir é chato quando se faz repetidas vezes, sem dizer que minha boca se abriu só para receber comida e um mosquito acidentalmente ontem na varanda.
Estava em uma ilha deserta. Estava no escritório, olhando para a agenda e procurando o número dele, do cara que me colocou no mundo e aqui nesse lugar. Não demorei para achar e colocar pra chamar.
Ele só precisava atender. Eu poderia ir embora, mas pra onde? Com o que? Virar alguém em situação de rua não faz parte dos meus planos.
Assim que coloquei o telefone no ouvido fiquei ansioso, se eu tiver jeito eu consigo voltar. Meu pai não é o monstro que todos pensam. Não estou tentando convencer vocês, mas a mim mesmo que ele não é o monstro que todos pensam. Assim que atendeu escutei algo não muito agradável.
– Alô? – Voz de mulher?! Esse número é privado, como uma mulher atendeu o celular dele? – Alô?
– Quero falar com meu pai – o silêncio se estendeu por alguns minutos. – Olha só, tenho urgência, pode falar que não tenho o dia todo?
Só foi depois de mais alguns longos segundos que escutei uma voz falando " e o seu filho" que eu senti que teria uma resposta.
– Alex? – Respira cara, seja bom.
– Não, James.
– Filho, algum problema, não esperava sua ligação.
–Também não esperava uma atendente. Esperou muito eu virar as costas?
– Isso não te diz respeito.
- Pai, desculpa se fui rude agora, mas eu quero ir embora daqui. O mais rápido que puder, aqui é praticamente uma ilha deserta.
– Você está aí só a dois dias.
– Pai… Escuta, mamãe está gelada comigo, meu irmão não é meu amigo e não fala comigo. Tá difícil ficar aqui, principalmente, não tenho lazer, sem internet, sem algum lugar pra ir, sem amigos.
– James, não posso fazer nada.
– Me dá mais uma chance, posso mudar.
– Você vai ficar um ano com sua mãe. Vinte anos não é idade pra você ser um garoto malcriado.
– O que?! Eu não vou ficar um ano aqui.
– Só voltarei a mover uma palha pra você daqui um ano, sua mãe também. Você que faz o lugar que vive.
– m***a! – Falei, desligando o telefone e sentado no sofá de cabeça baixa.
Vai lá fazer m***a James. Não tinha a mínima ideia do que fazer a partir de agora.
Até meu pai recuou. E olha que pedi com jeito.
– Estar aqui não é um bicho de sete cabeça – Levantei meu olhar até meu irmão na porta, me olhando. – Faça as coisas, estude, trabalhe… Vira homem e assuma sua identidade.
– Não enche minha paciência, Alex.
- Olha, pra não falar que sou um irmão r**m, se você voltar a estudar, eu te dou carona, pra você ir, melhor que ir com a mamãe, menos humilhante também.
– Não sei se vou voltar realmente, estudar a noite... Ainda não sei – Confesso. – Eu reprovei duas vezes no último ano cara, não sei se vou dar conta.
- Inteligência nunca foi seu forte.
– Deboche é o seu forte, Alex?
– James, não seja um i****a – Eu olhei de cara f**a pra ele. – Você está fazendo papel de derrotado, reage!
Foi as últimas palavras até ele me dar as costas. Reagir é difícil.
Olhei para um quadro de um rosto de cavalo e sorri, ignorando toda a minha situação atual.
Será que eu ainda sabia andar de cavalo? Fazia tanto tempo. Me levantei e fui direto para o quarto, trocar de roupa e ir para o celeiro, quando era pequeno andar de cavalo me fazia bem, na verdade correr me faz bem. Velocidade. Preciso disso, talvez isso me proporcione uma brincadeira divertida.
Assim que cheguei no celeiro, eu fui direto para um das salas onde ficavam as celas, quando olhei para o canto, eu vi ela. Minha antiga cela, havia ganhado no natal, cinco anos atrás. Era uma das melhores celas que havia no mundo, estilo montaria. Peguei e levei até a cerca que ficava de fora do celeiro.
Agora faltava o cavalo. Não vi cavalo nenhum por aqui.
Comecei a caminhar de volta pra casa, pra ser mais exato, indo pra cozinha. Quando entrei, vi quem eu procurava.
– Onde estão os cavalos? – Minha mãe olhou diretamente pra mim, como se eu tivesse falado grego. – Quero dar uma volta na fazenda.
– Não temos mais cavalos de passeio.
– Uma fazenda sem cavalo? – Perguntei, pasmo e chateado.
– Temos cavalos, só que não são de passeio.
– Mãe, não existe um cavalo pra só andar?
– Os cavalos daqui são de porte grande, especiais para competição.
Desde quando temos isso? Três anos longe, James.
– Onde estão os cavalos? – Perguntei.
– James, os cavalos são… Seu irmão acabou de descer pra lá, pegue a trilha do fundo e desça, no antigo curral. Fala com ele.
– Muito obrigada, até logo.
E lá vamos nós andar mais um pouco, demoraria bem uns sete minutos até eu chegar. O antigo curral era onde ficava o gado para engorda. Muita coisa mudou aqui, a trilha que estou é a mesma, mas o que vejo mais a frente me deixa curioso.
Fico parado do lado de fora de uma porteira, eu consigo ver de cara duas éguas com cria, o que me impressiona é o tamanho dos animais.
Grandes.
De longe vejo que há um novo celeiro, maior que o de cima, vejo uma arena enorme, praticamente duas quadras de basquete, toda cercada por uma cerca de madeira. E quando vou me aproximando vejo um cavalo branco em galope rápido dentro da arena. Passo pelo celeiro e fico próximo a cerca da arena, quando olho para quem está no cavalo me vejo sem reação.
Uma mulher? Assim que o cavalo contorna a arena a cavaleira que o monta olha pra mim de relance, mas logo desvia o olhar e passa voando por mim. Fico por segundos ali vendo aquilo, até sentir algo encostando no meu ombro. Me afasto e me viro, vejo Alex me olhando.
– O que faz aqui? – Olho para sua mão que tem duas seringas, que me faz me mover para longe dele.
– Cavalo… Quero andar.
– James, você sabe andar de cavalo?
Calma.
Calma.
– Melhor que você ainda, não lembra? – Então ele balança a cabeça e passa por mim, ele levanta a mão e faz um gesto de pare. A guria vai diminuindo aos poucos até que a corrida vira galope fraco. Alex abre uma porteira e entra na arena, antes dele conseguir fechar, eu coloco a mão e entro junto, vendo o cavalo se aproximar e uma garota tirar um capacete revelando um cabelo preto. Bem preto. E depois um rosto.
Estou apaixonado.
– Conseguiu notar a respiração? – Alex falou, enquanto pegava a rédea da mão da garota, que desceu do cavalo em um pulo. Uau, meu cupido deve estar na porteira rindo e mascando capim, com um palito na boca e falando que é ela.
– Melhorou muito, o fôlego está voltando. Isso é ótimo! Uma semana e ele está livre.
Eu engoli um seco com a voz fina e alegre.
A garota era linda, linda e com olhos negros bonitos demais para ignorar, claro, o corpo esguio e tonalizado em uma roupa que não era muito bonita pra ela, mas sem roupa certamente ficaria mais valorizada.
– Temos só as últimas duas, o doutor foi exato dessa vez – Assim que meu irmão falou isso a garota olhou diretamente pra mim, me olhou de cima a baixo e desviou o olhar. Quem é ela? – Você vai ficar ou já está indo?
– Já estou indo, só vim te dar uma força – Senti que eu estava sobrando, quando eu estava prestes a ir embora a garota me olhou e fez eu ficar com um olhar. – Quem é você?
Perguntou, olhando pra mim firme, curiosa.
– James.
– Meu irmão, te falei dele, lembra? – Os dois se olharam, um olhar debochado e sem graça antes de se virar pra mim de novo.
– Sou Samantha – ela ergueu a mão só que preferi ignorar, mesmo ela ficando sem graça. – Alex, já estou indo. Amanhã treino, vamos aproveitar até os últimos minutos de férias.
A menina sorriu, mostrando uma fila de dentes brancos com covinhas, que me fez ficar olhando pra ela só pelos sorrisos bonitos que se formou no rosto dela. Mesmo tentando ignorar, eu tinha que olhar. Era quase uma joia no meio daquele lugar.
Mas, podia apostar, que meu irmão havia feito a minha caveira.
– Não quer que eu te leve?
– Não, alguém precisa mais da sua atenção.
A garota sorriu mais uma vez e passou por nós, pela cerca e depois começou a caminhar rumo a sede. Depois que voltei a minha atenção a Alex, ele me encarava.
– Não temos mais cavalos para passeio.
– Qualquer um serve, pra passeio ou não.
– Não vou te entregar um animal, esquece!
– São só cavalos – Falei, já quase desistindo da ideia. – Desde quando vocês estão com cavalos assim?
– Você nunca ligou pra isso, não é James?
– Nunca precisei – Ele olhou pra mim e balançou a cabeça. Ele começou a puxar o cavalo branco para fora da arena até em frente ao celeiro, travou a corda em um poste, enquanto tirava as travas da cela. – Quem é a garota, alguma namorada sua?
– Amiga.
– Amiga, que r**m. Quando vai falar que gosta dela?
– James, eu tenho uma namorada – Fiquei parado olhando pra ele, que nem me olhava. - Lamento, não vou te emprestar nenhum cavalo, nem nada que for meu pra você se apropriar.
– Seu?
– Sim, todos os cavalos são meus. Mamãe só está com um, ele é um ótimo cavalo, mas se conseguir parar nele, vai na fé.
– Desde quando tem cavalos? – Perguntei, já começando a lembrar de uma competição que ele participou quando tinha onze anos. Me lembro bem, ele ganhou nos tambores em suas categorias, primeiro lugar.
– Comecei a competir, ganhei várias coisas fazendo isso, no fim estou aqui. Agora eu sou um pequeno criador, com a posse de dezessete animais, animais que você deve ficar longe.
– Isso tudo é raiva de mim? Alex, você tem que esquecer as coisas. Passado é passado maninho.
– Vá para o inferno.
– Onde está o cavalo da mamãe?
– No pasto de baixo – Alex foi até o rosto do animal e tirou a corda guia, deixando só a rédea. Jogou a corda pra mim e sorriu. – Boa sorte, o cavalo é um branco com uma mancha acima dos olhos. Se pegar outro, eu o faço te derrubar.
Depois das doces palavras ele soltou o cavalo no pasto de cima, junto com as duas éguas, pegou o caminho que levava até a sede logo depois.
Suprirei quando fiquei sozinho. Olhei para a porteira que dava passagem para o pasto de baixo, dividido em dois com os cavalos de alguma forma divididos.
Havia cinco de um lado e quatro de outro.
Assim que entrei no que havia o cavalo branco com a mancha na cabeça, vi que os outros cavalos ficaram calmos, mas o cavalo se afastou e praticamente ficou pronto para correr.
Fui me aproximando aos poucos. Olhando para os olhos do cavalo e para as patas.
O cavalo era enorme, do tamanho e força que supostamente tinha. Assim que fiquei a dois metros o cavalo disparou e impediu que eu colocasse a corda. O cavalo só parou de correr em volta da cerca depois de quatro a três minutos.
Repeti o movimento e quando eu estava de novo perto dele, o animal começou a correr disparado.
– Filho da p**a! – Gritei e tive que esperar o cavalo parar novamente. Assim que parou, eu fui novamente pra cima dele, dessa vez um pouco mais rápido, mesmo assim não adiantou, ele voltou a correr e eu quase peguei uma pedra pra jogar nele. – Isso é só uma volta, vamos parceiro. Deixa eu pegar você.
Eu estava me sentindo uma b***a falando com um cavalo.
Eu ia conseguir fazer isso, agora era questão de mostrar honra e mostrar que eu não sou um i****a.
AVISO - Mais um capítulo fresquinho pra vocês (finalmenteeee), para ficar por dentro adicione o livro na biblioteca, comente sempre nos capítulos para eu poder saber o que vocês acham do livro e deixe o seu voto maravilhoso ou me sigam para receber novidades e atualizações. Até amanhã com mais um capítulo fantástico. Att, Amanda Oliveira, amo-te. Beijinhos. Hehehehe até