Lyla
Agora, os olhos gélidos dele encaravam os meus, uma intensidade que me fazia sentir como se o ar estivesse sendo retirado de meus pulmões. Uma estranha sensação de ansiedade percorreu meu corpo, como uma corrente elétrica deslizando pela minha espinha. Naquele momento, tudo parecia tão intenso e surreal que, por um breve instante, questionei minha sanidade. Mas essa sensação desconcertante não durou muito. Logo ouvi passos atrás de mim.
Um segundo homem saiu da mesma sala que o cara de olhos penetrantes que estava à minha frente. Diferentemente de seu colega, o novo homem tinha olhos verdes profundos e cabelos negros que pareciam absorver a luz suave das velas ao redor, um contraste perfeito com a figura impressionante de seu companheiro loiro, que exibia uma enorme cicatriz cortando seu rosto do nariz até o maxilar. Eu não conseguia desviar o olhar dele, como se estivesse hipnotizada, mas não conseguia também ignorar o medo que começava a me consumir.
O moreno pigarreou, talvez em busca de amenizar o clima tenso, mas a ansiedade no ar era palpável. Eu não pertencia a este lugar.
— O que faz aqui? — perguntou o loiro, sua voz forte ressoando com uma ferocidade que se encaixava perfeitamente na sua aparência robusta.
— Procuro o toalete, — respondi, tentando soar o mais firme e composta possível, apesar do nervosismo que escapava entre as notas da minha voz.
O moreno abriu um sorriso gentil, o tipo de sorriso que parecia prometer segurança em meio ao caos.
— Eu mostro para você, — ele disse, e seu tom suave era reconfortante.
— Não, vossa alteza, isso é trabalho para criados, — o loiro interrompeu, seu olhar era de reprovação. Meu coração disparou ao ouvir "vossa alteza", uma formalidade que parecia estranha e distante, como se eu estivesse em um conto de fadas que se desenrolava ao meu redor.
— Vossa alteza? — Perguntei, com a voz saindo mais assustada do que queria. — Perdão, que falta de educação a minha. — Me curvei rapidamente, sem saber se isso ajudaria a desviar a atenção da meu desconforto.
— Tudo bem, tudo bem, — o príncipe disse, sua voz carregava uma leveza que acalmava um pouco meu coração acelerado. — Acompanhe-me, vou mostrar onde fica o toalete.
Certeza? Eu não tinha certeza de que poderia confiar em alguém aqui, mas não tinha outra opção. Ele me guiou até uma porta discreta. Entrei e fiz o que tinha que fazer, tentando me recompor enquanto lavava o rosto e observava minha imagem no espelho. Ao sair, notei que os dois ainda estavam ali, me aguardando como se eu fosse a pessoa mais importante do mundo.
— Você não é daqui, certo? — o loiro perguntou, sua curiosidade estava clara.
— Não, cheguei hoje, na verdade. — Respondi, e logo notei Max erguendo a sobrancelha enquanto olhava para o príncipe. — Espero não ser um problema...
— Max, sem investigação agora, é festa, — o príncipe repreendeu, e o loiro apenas deu de ombros, mantendo o olhar fixo em mim enquanto seguíamos pelo corredor de volta à festa.
O olhar dele era penetrante, quase como se estivesse avaliando cada aspecto da minha aparência. Isso me deixava desconfortável, uma sensação incômoda de ser analisada em um lugar onde me sentia tão deslocada. O que ele queria de mim? Um calafrio percorreu minha coluna.
Assim que entramos no salão da festa, decidi me afastar dos dois e procurar as garotas com quem havia conversado mais cedo. A presença de Max era opressora, e eu precisava de um momento para respirar.
No caminho, esbarrei com uma moça que parecia igualmente deslocada e, em meio ao caos, um vislumbre de esperança iluminou meu coração.
— Perdão, — disse, apressando o passo.
— Tudo bem. — Ela respondeu com um sorriso radiante. — Iris.
Encarei-a confusa, e então percebi.
— Lyla. — Apressei-me a dizer, tentando me sentir mais à vontade.
— Muito prazer! Está sozinha? — Iris perguntou timidamente, seus olhos eram uma mistura de curiosidade e preocupação.
— Por enquanto sim, por quê? — Respondi, um pouco hesitante.
— Eu também estou. Gostaria de um pouco de companhia... — Ela disse, sua voz baixa e convidativa.
— Por mim tudo bem, — sorri de volta, aliviada por finalmente encontrar alguém com quem me conectar em meio a tanta incerteza.
Iris era uma menina adorável, seus cabelos castanhos lisos caindo sobre os ombros e uma multidão de sardas adoráveis adorando seu rosto em um charme juvenil. Embora sua aparência fosse amigável e calorosa, havia algo em torno dela que parecia atrair olhares de desaprovação, um leve desconforto nas interações das pessoas ao seu redor.
Enquanto papeávamos e as risadas foram se intensificando, eu me sentia mais à vontade, como se, na presença dela, o peso da realidade estivesse ligeiramente mais leve. A cada história que contávamos, eu via o quão inteligente e incrível ela era. As conversas fluíram, e, enquanto experimentávamos um pouco de hidromel, que era extremamente doce e revelador, me deixava mais relaxada, mas a sensação de desconforto persistia.
Os olhares gélidos estavam de volta. Quando me virei novamente, o homem — Max — estava lá, e meu coração disparou. Ele parecia estar me despindo com o olhar, e isso me deixou nervosa. Um silêncio se fez, e, por um breve momento, eu me afastei de suas intensas íris azuis, mas algo me puxou de volta.
— Ly! — A voz de Iris me tirou do transe, seu olhar curioso encontrando o meu.
— Oi, oi? — Eu deixei escapar, ainda atordoada.
— Ele é bonito, não é? — Ela disse com um sorrisinho presunçoso, e eu me permiti sorrir levemente. — Porém, não recomendo que se envolva; ele é um puro cafajeste, já tirou a pureza de inúmeras garotas da vila e nunca quis assumir nenhuma.
Arregalei os olhos, surpresa com a revelação.
— Fica tranquila, ele não faz o meu tipo, — afirmei, mas tinha certeza de que essa afirmação não refletem a verdade. Minhas emoções estavam uma bagunça, e o último que eu precisava era me envolver com um cara como Max.
— Sei, — ela disse, entre risos, parecendo cética.
Iris continuou a me contar as fofocas da vila, e eu, como uma boa fofoqueira, incentivava cada história. Enquanto isso, as imagens de Max me perseguiam — sua presença estava sempre entrelaçada entre as nossas conversas, como uma sombra constante e irritante.
— E então, você não vai acreditar no que aconteceu com a Clara! — Ela me contou sobre uma menina que estava gravida, e eu estava tão absorvida na história dela que quase deixei de lado a ansiedade que o olhar de Max me causava. Estava quase na melhor parte quando uma voz grave ecoou na sala.
— Com licença, senhorita. — Meu coração disparou, e olhei para Iris antes de encarar o dono da voz que parecia nervoso.
— Me concede essa dança? — O pedido me pegou de surpresa, e um frio percorreu meu corpo.
Senti um arrepio ao ouvir, e pelo canto do olho, percebi o olhar assassino que Max lançou. Eu só queria evitar qualquer tipo de conflito; um olhar um pouco mais e minha resolução começaria a desmoronar.
— Não sei dançar, — foi o que consegui articular, e ele me ofereceu um sorriso gentil, como se estivesse disposto a me ajudar.
— Eu te ensino, — ele disse, segurando minha mão, prestes a me puxar, quando a voz de Max ressoou proximamente.
— Algum problema por aqui? — A forma como ele disse isso fez com que o homem à minha frente tremesse visivelmente.
— Não, senhor... — ele começou, sua voz hesitante, mas não teve tempo de continuar, pois Max o cortou abruptamente.
— Não perguntei a você, — max disse firme e ríspido, fazendo o garoto parecer ofendido.
— Lyla? — A autoridade de Max ressoou como uma ordem, e uma onda de desconforto percorreu meu corpo. Max começou a criar uma bolha protetora ao meu redor.
— Eu não estou interessada, — fui rápida em minha resposta, encarando Max. O sorriso perverso dele parecia um desafio, como se ele estivesse esperando por aquilo.
— Ouviu bem, solte-a, — Max ordenou, e Dario — assim ele se apresentou — ia protestar, mas foi interrompido novamente.
— Não me importo quem é seu pai ou com quem estou falando, Dario... — Max disse com uma acidez que nunca imaginei que ele tivesse. — Seu pai poderia ser o rei que eu não ligaria, então siga seu caminho.
Dario saiu praticamente correndo e, pela primeira vez desde que entrei na festa, respirava mais aliviada. No entanto, a satisfação foi breve; Max agora me encarava com um sorriso presunçoso que me fez ficar incomodada.
— Eu sei me defender, não precisava daquilo, — consegui dizer, minha voz soando mais firme do que eu realmente me sentia.
— Ah, eu percebi, — ele respondeu, claramente se divertindo com minha indignação. Ele demonstrava uma confiança que eu não compreendia. — Mas, de nada. — Ele pisca, e a leveza dos seus movimentos só fazia aumentar meu desconforto.
— Vai se ferrar, — murmurei, mas o sorriso dele se alargou, como se minha raiva fosse combustível para seu entretenimento.
— Que ótima forma de agradecer alguém... — Ele disse, e a faísca de diversão que ardia em seus olhos fazia um nó se formar no meu estômago.
— Não pedi por sua ajuda! — retruquei, esperando que isso o calasse, mas em vez disso, ele apenas se aproximou mais, criando um espaço intimidador entre nós.
Com a tensão pairando no ar como um denso manto, percebi que estávamos extremamente próximos, provocando um ao outro como duas crianças que trocam provocações infantis. Ele parecia se divertir com minha cara fechada, a diversão dele irritando-me ainda mais.
— Que gatinha arisca... — Ele murmurou em um tom que deixava claro que isso era apenas uma brincadeira para ele. E eu apenas queria sumir.
Mordi o lábio para conter as palavras que estavam prestes a escapar. Eu não deveria me permitir sentir essa tensão, mas a maneira como ele olhava para mim me deixava em um estado misto de nervosismo e excitação.
Ele se aproximou lentamente, e, assim que nossos rostos estavam a poucos centímetros de distância, o ambiente se tornou excessivamente carregado. Mas, de repente, ele se afastou abruptamente, como se tivesse reconhecido algo além do nosso pequeno jogo. Um sorrisinho de satisfação se formou em seus lábios enquanto ele se afastava novamente, indo em direção ao príncipe, que nos observava com um olhar curioso.
Iris, do outro lado do salão, sorriu para mim como se houvesse detectado algo entre nós, e eu pressionei os lábios, processando tudo o que havia acontecido.
— Nem vem, — murmurei baixinho para ela, mas sua risada leve ecoou pelo salão, preenchendo o ar com um sopro de alegria que eu não tinha certeza se compartilhava.
E enquanto o evento continuava, meu coração acelerava por causa da incerteza e da adrenalina, navegando entre as interações sociais e o medo crescente de que essa nova realidade estivesse me consumindo — um mundo que eu nunca pedi para fazer parte, mas que agora parecia inevitável. A música tocava, e mesmo entre a dança e as risadas, a insegurança permanecia, um lembrete constante do quanto eu estava longe de casa e do que tudo isso poderia significar para mim.