ISABELLA
Não dava pra acreditar em como tudo mudou de uma hora pra outra. Até poucas horas atrás, Kaio era atencioso, me fazia sentir única. Agora, agia como se eu nem existisse. Eu me sentia usada, largada, como se fosse só mais uma na vida dele. Um peso enorme no meu peito me lembrava de cada detalhe da noite anterior, detalhes que agora me pareciam tão distantes.
Enquanto me vestia às pressas, eu tentava evitar o espelho. Não era só vergonha… era decepção, raiva, tristeza. Mesmo assim, não conseguia parar de pensar no que aconteceu. Quase prendi a respiração pra não fazer barulho ao sair do quarto; afinal, eu não queria encarar Kaio outra vez, não depois da forma fria como ele me tratou quando amanheceu.
Fui em direção ao quarto das crianças, pisando leve pra não acordar ninguém. Elas ainda estavam dormindo, tão serenas, alheias a todo o turbilhão que se passava dentro de mim. Eu fiquei ali parada, olhando pra elas, com a cabeça a mil. Foi quando Elza surgiu no corredor, cansada, mas agradecida.
— Bom dia, Isabella. Obrigada por ter ficado com as crianças ontem à noite — disse ela, me olhando com uma expressão sincera.
Eu fiz que sim com a cabeça, mas meu coração tava pesado demais pra uma resposta simples. Mesmo assim, tentei ser gentil.
— Não foi nada, Elza. Precisava de mim, e eu… bem, eu só vim. E como tá sua filha? Tá melhor?
Ela suspirou, um pouco aliviada.
— Tá melhor, graças a Deus. Era só uma febre passageira. O pai dela não sabia direito o que fazer, mas agora deu tudo certo.
Eu quis dizer que ela deveria ter ficado com a menina o tempo todo, mas ao mesmo tempo entendi que ela não podia estar em dois lugares ao mesmo tempo.
— Você devia ficar do lado dela, Elza.
— Eu sei… — ela deu um sorriso meio triste. — Me desculpa, Isabella. Eu não tinha direito de te chamar no meio da noite desse jeito. Vai pra casa, por favor. Eu dou conta do dia de hoje.
Fiquei olhando pras crianças por mais alguns segundos. Elas sempre foram tão apegadas a mim, e eu sabia que iam sentir falta quando acordassem. Mas, naquele momento, eu precisava de um tempo pra mim. Precisava processar o que tinha rolado entre mim e Kaio e tentar entender por que ele virou outra pessoa de repente.
— Tá… eu vou. Se precisar, sabe que pode me ligar, né? — minha voz saiu meio embargada, mas Elza não pareceu notar.
— Pode deixar, qualquer coisa eu aviso. E obrigada de novo, Isabella, de verdade. — Ela colocou a mão no meu ombro, e foi o toque mais reconfortante que eu senti desde a noite passada.
Eu assenti e dei um último olhar pras crianças antes de sair. Cada passo em direção à porta era como um lembrete de que eu tava indo embora do que quer que eu tivesse sentido antes, se é que senti alguma coisa verdadeira.
Saí de lá com o peito apertado, carregando uma mistura de vergonha, mágoa e uma enorme vontade de sumir por uns tempos. Precisava ficar sozinha, precisava entender como fui me deixar enganar tão fácil pela atenção de Kaio. E, principalmente, precisava descobrir uma forma de não me odiar tanto por ter acreditado que ele realmente se importava com aquele sentimento que estávamos sentindo, Mas pelo visto me enganei, e desta vez ... A culpa de ser enganada, foi toda minha.
....
Estava tão furiosa, mas mais do que isso, estava angustiada, por ser tão estúpida e i****a. Como eu fui me deixar levar de novo! Como ... fui deixar ser enganada outra vez, ser seduzida?
"Eu não quero pensar. Não vou mais pensar nele!"
As palavras saíram num sussurro firme, como se, ao dizê-las em voz alta, pudesse convencer a mim mesma.
Girei nos calcanhares e fui direto para o quarto, sentindo o corpo pesar mais a cada passo. O cansaço finalmente me atingiu com força, como se a exaustão tivesse ficado à espreita, esperando que eu me rendesse.
Sem me preocupar em vestir algo além da toalha, me joguei na cama e afundei no colchão, soltando um longo suspiro.
A casa estava silenciosa. A noite, fria. Mas, dentro de mim, ainda havia vestígios do fogo que Kaio havia acendido.
Não. Não vou mais pensar nele.
Fechei os olhos e me obriguei a relaxar. A respiração desacelerou. Os músculos cederam.
E, sem que eu percebesse, o sono veio pesado, me arrastando para um apagão profundo, sem espaço para devaneios ou lembranças.
Pelo menos por enquanto.
.....
O som do celular me despertou abruptamente, ecoando no quarto escuro. Estendi a mão tateando o criado-mudo até encontrar o aparelho. A tela brilhante exibia o alerta do alarme: Horário do jantar das crianças.
Foi só então que percebi—dormi o dia todo.
Soltei um suspiro pesado, sentindo o corpo afundar no colchão. Meu peito estava apertado, minha mente, um turbilhão.
Desliguei o alarme e, sem muita pressa, deslizei os olhos pelas notificações. Mensagens de Carla, de Elza, de amigos antigos… mas a única mensagem que eu queria ver não estava ali.
Kaio não mandou nada.
Nenhum pedido de desculpa, nenhuma explicação. Nada.
Fechei os olhos por um instante, tentando ignorar a pontada de frustração que subiu pelo meu peito. Mas era impossível. As marcas da noite anterior ainda estavam na minha pele. E, pior, estavam na minha mente. Tão vivas quanto nunca.
Mas pelo visto, só eu sentia isso.
Engoli em seco e passei as mãos pelo rosto, tentando afastar a lembrança do seu toque. Mas era inútil. O cheiro doce de mulher que ele carregava ainda parecia impregnar no meu subconsciente, me lembrando do quão estúpida eu fui em ceder.
Ele estava com outra antes de mim.
Ele apareceu embriagado naquela noite, e agora, tudo fazia sentido. Com certeza, se arrependeu.
E agora? Estaria tramando a minha demissão?
Fechei os olhos, sentindo a cabeça pesar de tantos questionamentos. O silêncio dele estava me deixando louca.
Eu esperei.
Esperei uma mensagem, uma ligação, qualquer coisa.
Mas nada veio.
No Outro Dia – Enfrentando o Desconhecido
Parei em frente à mansão e inspirei fundo.
O peito estava pesado, as mãos geladas. Eu não sabia o que esperar, mas decidi enfrentar.
Antes que pudesse hesitar, a porta se abriu, revelando Elza, que me recebeu com um sorriso caloroso.
— Até que enfim! — disse ela, animada. — As crianças sentiram sua falta, vão amar te ver chegar.
Sorri de volta, mesmo que de forma nervosa.
— Eles estão lá dentro com o pai? — perguntei, tentando parecer casual.
Elza franziu a testa, estranhando a pergunta.
— Não desta vez. Ele saiu cedo.
Meu coração deu um salto estranho.
— Saiu?
— Sim. Nem o vi sair. Deve estar com problemas... Ele só age assim quando está com algo em conflito.
Soltei um suspiro pesado, sem saber se me sentia aliviada ou ainda mais incomodada. Kaio estava me evitando.
Afastei o pensamento e entrei na casa, sendo recebida com gritos animados das crianças.
Zoe e Kaleb vieram correndo até mim, me abraçando com força.
— Isa! Você demorou! — Zoe reclamou, fazendo um bico adorável.
Afaguei seus cabelos, me forçando a sorrir. Pelo menos eles ainda me queriam ali.
Uma Semana de Silêncio
Os dias passaram, mas Kaio nunca estava em casa quando eu chegava.
Nenhum olhar, nenhuma palavra, nenhuma desculpa.
Eu tentei não pensar muito nisso, tentei seguir minha rotina normalmente. Mas a cada dia que passava, a sensação de frustração se transformava em algo mais corrosivo.
Raiva.
Como ele podia ser tão escroto?
Ele fugia de mim como um covarde. Como se fosse mais fácil apagar tudo, como se nada tivesse acontecido. Como se eu não tivesse significado absolutamente nada.
E isso… isso eu não suportava!
....