O relógio marcava meia-noite quando Albucacys e Guido estacionaram na porta da fazenda.
Foi uma boa hora para chegarem, porque Calton já estava saindo. A raiva ainda latejava dentro dele como um segundo coração. Quando viu os faróis iluminarem a estrada de entrada, parou o carro no meio do caminho. Guido desceu primeiro, erguendo a mão num gesto calmo, e Albucacys veio logo atrás.
— Calton! — chamou o irmão. — Espera um pouco.
Calton apertou o volante, respirou fundo e, por fim, saiu do carro.
. — Vem, temos uma coisa pra te mostrar. Não vai fazer besteira.
— Teve problema por causa da surra que dei no médico?
Não queria que o irmão tivesse problemas.
— Não. Depois da su.rra, várias mulheres o denunciaram — explicou Albucacys, com o tom mais baixo. — E ele está como foragido.
Calton arregalou os olhos.
— Po.rra… o cara fugiu?!
— Não exatamente. Salomão ligou pra ele — respondeu. — Agora Salomão e o doutor Osias estão juntos. Vem, entra no carro.
Obedeceu, mesmo confuso, e entrou. O carro avançou pela estrada de terra, os faróis cortando a escuridão.
— Onde estamos indo? — perguntou Calton, depois de alguns minutos.
— Pra sede do clube — respondeu o irmão. — E quando chegarmos, você vai entender.
O silêncio voltou.
Quando finalmente chegaram.
Albucacys o conduziu pelos fundos. Passaram por um portão secundário, que se abriu com a digital dele. Atrás, havia um jardim bonito, bem cuidado, com flores, bancos de pedra e uma cama suspensa balançando ao vento. Tudo parecia calmo demais — quase um jardim encantado.
Era a primeira vez que via aquele lugar.
Caminharam, uma jaula enorme esperava, feita de ferro grosso, com barras espaçadas o suficiente para deixar o ar entrar — e o medo sair.
Dentro dela, o médico estava ajoelhado, as mãos amarradas. O terno amassado, a gravata solta, o rosto suado e os olhos arregalados de puro desespero.
Ele gritava, mas o som da própria voz se perdia na imensidão do jardim.
A poucos metros, Dudu e Belinha o observavam. Não eram cachorros. Eram dragões-de-komodo, imóveis, a pele grossa e acinzentada refletindo a luz fraca, as línguas bifurcadas surgindo e sumindo lentamente, farejando o ar.
Do outro lado da jaula, Salomão fumava.
— Eu tenho um monte de processos — começou Salomão, . — Mas nenhuma mulher pode me acusar de assédio. Talvez Dorothy, mas ela é minha esposa. E quando um bab.aca desses faz uma m***a dessa, não é só o nome dele que suja. Suja o meu, o de Callebe também. Então ele vai pagar.
O médico tentava se afastar das feras, arranhava o chão com os sapatos, chorava. As criaturas se aproximaram lentamente, farejando o medo.
— Por favor! — gritou ele. — Eu juro que foi um engano!
Mas ninguém respondeu.
Calton permaneceu em silêncio, observando. Albucacys não desviou o olhar. Guido continuava imóvel, e Salomão tragava devagar, impassível.
Quando veio o primeiro ataque, o grito do médico , e o sangue se espalhou na grama. Os dragões avançaram, e, em poucos segundos, o que antes era um homem tornou-se apenas ruído e movimento.
Calton respirou fundo, o peito subindo devagar, deu um sorriso. Depois, se levantou,Albucacys foi levá-lo na fazenda.. Era noite de dormir com Severus, que andava como uma fera Mas a sorte é que Zoe tinha ligado.Tinha tomado sua decisão, iria estava indo para a fazenda — trazendo Dulce junto com ela.
Albucacys deixaria o irmão e voltaria para o clube. Iam todos dormir por lá naquela noite. Guido continuou no jardim; tirou a blusa que vestia e foi pegar uma manga no pé. Sentou-se e comeu ali mesmo, sem precisar de faca.
Salomão o olhou e xingou.
— Tio… — Guido não entendeu o olhar no primeiro momento
— Suma da minha frente com essa manga, Guido, ou te jogo dentro da jaula. Eu juro — disse Salomão, o olhar firme.
Mas Guido percebeu. Ele chupava a manga, e o suco escorria pelos lábios, se lambuzava. Não era só com a fruta que fazia aquilo, e presidemte sabia disso.
Guido se levantou rápido, limpando as mãos na calça, e saiu antes que o tio dissesse qualquer coisa.