Crislaine Narrando
Sair da minha zona de conforto não foi tão difícil. Quando Monike me chamou para vir à Rússia pela primeira vez, ela veio a negócios, e eu, a passeio. Lugar perfeito. Acabei me apaixonando, e aqui estamos há quase três meses. Só que esses três meses não foram exatamente por vontade própria. Sei que todos me deram um voto de confiança, mas eu também precisava fazer algo. Foi aí que surgiu uma oportunidade de mostrar para toda a tropa, para Monike e para o meu avô que eu realmente mudei, que eu realmente queria mudança.
Vi quando Yuri disse para Monike que precisaríamos infiltrar alguém que não tivesse o rosto conhecido, alguém que pudesse se passar por uma pessoa comum, mas que trouxesse todas as informações necessárias. Não pensei duas vezes e me candidatei. Monike não gostou muito da ideia. Achou precipitado, arriscado demais me envolver diretamente com um dos mafiosos mais perigosos da Itália. A máfia calabresa não tem dó de nada nem de ninguém. A única coisa que ainda prezam é a velha lei da máfia: não cobiçar a mulher do próximo e sempre respeitar a esposa de amigos ou aliados.
Tudo foi organizado. Minha única tarefa era fazer companhia para o italiano gostoso. Não parecia sacrifício nenhum. O que eu não imaginava era que ele queria algo a mais do que companhia ou um jantar de negócios. Ele me convidou para outro lugar. Como ele foi simpático e educado, não vi nada demais. Entrei no carro, e seguimos por uma longa estrada até chegar a um local quase deserto. Na entrada, homens fortemente armados faziam a segurança da casa. Entramos.
Era uma mansão enorme. A porta tinha quase quatro metros de altura, parecia coisa de gigante. Observei tudo: uma televisão grande, provavelmente umas 70 polegadas, o chão de porcelanato preto, as paredes brancas, a mesinha de centro combinando com o ambiente. Ele pode ser ogro, mas é bonito, gostoso, inteligente e organizado.
Depois de várias doses de bebida, acordo no dia seguinte, nua, na cama dele. Ele não estava ali. Me assusto porque não lembro de quase nada, nem como fui parar naquele quarto. Levanto, vou até o banheiro, tomo um banho e saio enrolada na toalha.
Carlo — Acordou, Bela Adormecida. — Ele diz, me entregando várias sacolas.
Abro e vejo que são roupas. Não entendi muito bem o porquê de tanta coisa, mas pego as sacolas, volto ao banheiro, me visto e saio de lá.
— Preciso ir embora. Meu pai e minha mãe devem estar preocupados comigo. — Minto, porque não posso mencionar Cascavel. Já basta ter ido para a cama com o inimigo, entregar Cascavel seria muita s*******m. Pelas minhas contas, estou aqui há uns 60 dias. Esse cara é louco. Ele acha que é meu dono. Preciso sair daqui.
Dou uma volta pela casa, observando tudo. Ele realmente tem bom gosto. Tento me manter calma, mas minha mente insiste em me levar de volta ao morro, à Cascavel. Eles devem estar super preocupados comigo. Aceitei sair dali achando que poderia curtir com alguém diferente, talvez ter uma noite de sexo gostoso e voltar para casa como se nada tivesse acontecido. Queria recomeçar, fazer novos amigos. Fui ingênua, e agora estou aqui, presa, sem saber como sair desse casarão.
Ele quebrou meu celular para impedir qualquer contato. Disse que poderia me dar outro, mas apenas se eu fosse uma "boa menina". Não sei por quanto tempo vou conseguir segurar essa barra. Estou sendo mantida em cativeiro por um inimigo mortal.
Carlo — Bom dia, princesa! Como dormiu hoje? — Ele pergunta, passando a mão nas minhas pernas.
Me encolho na cama. Ele me olha como todos os dias, com aquele olhar que parece querer me devorar viva. Apesar de todo o seu desequilíbrio, ele só encostou em mim na primeira noite, quando eu estava inconsciente. Desde então, não me obrigou a nada, mas sua presença me deixa sempre alerta.
— Para! Por favor, para! — Peço, chorando.
Ele acha que me forçar a ficar com ele vai mudar algo, mas isso só desperta gatilhos antigos. Me leva de volta ao passado, quando Gabriel ainda era vivo e usava meu corpo apenas para se satisfazer. Cansei de ser usada, de ser tratada como objeto. Vou sobreviver a isso. Vou sair daqui e mostrar para todos que sou capaz.
Carlo — Vamos tomar café. Ainda quero te levar a um lugar. — Ele diz, e eu arregalo os olhos. Será que ele vai me deixar ir embora?
— Eu quero ir para casa. Minha família deve estar preocupada. — Digo, mas ele apenas ri.
Quem é esse homem? Por que cismou comigo? Cascavel e a máfia russa precisam fazer alguma coisa! Não aguento mais ficar aqui. Preciso sair!
Carlo sai do quarto depois de pegar uma arma no closet e trancá-la de volta na gaveta. Quando vejo que ele deixou o telefone desbloqueado, me aproximo com cuidado. Não sei se é uma armadilha, mas decido ligar para o meu avô. Chama, chama, e nada. Tento Mendes no Brasil, esperando que ele possa fazer algo.
Ligação ON
Crislaine :Preciso de ajuda! É urgente!
Mendes : Você está bem? Onde você está? Eles estão atrás de você há meses! Por que não recusou essa proposta e voltou para casa? Ouça, a máfia não é como o morro. Eles não toleram traição. Esse telefone é descartável. Use com cuidado.
Crislaine :Ele deixou o telefone desbloqueado. Achei melhor ligar para o Rio do que para Monike. — Explico, enquanto ele resmunga do outro lado.
Mendes :Estamos mexendo os pauzinhos. Você será resgatada. Lembre-se: águia só anda com águia.
Ligação OFF
Apago o número e devolvo o telefone ao mesmo lugar. Deito na cama e espero. Não sei se fiz besteira. Só quero sair daqui. Espero que eles não demorem.