Tudo tem um preço.
E hoje, eu comprei uma mulher.
Não qualquer mulher — a filha do homem que destruiu a minha família.
Ela está sentada à minha frente, com o vestido claro colado ao corpo, as pernas cruzadas, o olhar abaixado como se ainda não tivesse entendido a merda em que se meteu. Mas eu entendi. Eu planejei. Cada segundo disso.
— Assine. — minha voz cortou o silêncio como um estalo de chicote. Coloquei a caneta sobre o contrato sem desviar os olhos dela.
Ela hesitou.
— Isso é... isso é um absurdo. — a voz dela tremeu, mas ainda tentou soar firme. Bonito. Corajosa. Mas burra. — Eu não posso... não posso me casar com um desconhecido por causa de uma dívida que nem é minha!
Ri baixo. Frio.
— Errado, Helena. — inclinei meu corpo para frente, apoiando os cotovelos na mesa de mármore entre nós. — Eu não sou um desconhecido. Eu sou o homem que está salvando o seu maldito pai da cadeia. E você é a filha perfeita, não é? A que vai fazer o que for preciso pra manter o sobrenome limpo.
Ela ergueu o olhar, finalmente. E foi aí que eu vi de novo aqueles olhos azuis me encarando como se eu fosse um monstro.
Ela estava certa.
E ainda assim, ela seria minha esposa antes do fim do dia.
— Por que eu? — ela sussurrou. — Por que... essa obsessão?
Inclinei a cabeça, como um predador se divertindo com a presa.
— Porque destruir o homem que matou meu pai nos negócios seria fácil demais. Eu quero que ele me chame de genro.
Quero que ele me veja tocando na filha dele todos os dias e saiba que nunca poderá fazer nada.
Quero que ele se ajoelhe... como você está prestes a fazer.
Ela empalideceu.
Mas não disse mais nada. Pegou a caneta. E assinou.
Era isso.
Helena Costa agora era minha.
Minha esposa por contrato.
Minha prisioneira por vingança.
Levantei-me devagar, vesti o paletó italiano com precisão cirúrgica e fui até o lado dela. Ela estava imóvel, como se tivesse congelado no tempo. Toquei o queixo dela com a ponta dos dedos, forçando-a a me encarar.
— Prepare suas malas, boneca. Amanhã cedo, vamos pra minha cobertura. E quero você na minha cama... como parte do acordo.
Seus olhos se encheram de raiva.
Ótimo.
Que me odeie. Que lute.
No fim, tudo nela vai me pertencer.
O helicóptero pousou no heliponto da cobertura exatamente às oito da manhã. Eu não gostava de atrasos, muito menos quando o assunto envolvia ela.
Desci primeiro, ajeitando a lapela do terno enquanto observava a movimentação da equipe que tirava as malas dela do compartimento. Três malas. Tamanho médio. O suficiente para entender que ela não estava ali por vontade.
Ela desceu por último. Óculos escuros cobrindo metade do rosto, os cabelos loiros presos em um coque improvisado e aquele ar de quem está prestes a engolir o próprio orgulho. Uma pena. Eu gostava mais dela quando estava quebrada por dentro e tentando parecer forte.
— Isso é ridículo. — ela resmungou ao meu lado, olhando em volta. O heliponto era rodeado por vidro, com vista para toda a cidade. Um trono no céu. — Você realmente acha que isso vai funcionar?
— Já está funcionando. — Respondi com a calma de quem tem o mundo aos pés. — Você está aqui, não está?
Ela se calou. Boa menina.
A cobertura era exatamente como eu havia projetado: fria, ampla, imponente. Mármore italiano, paredes de vidro, tecnologia integrada. E agora, uma esposa de mentira dentro dela. Helena caminhou devagar até a sala principal, onde a equipe já aguardava para explicar as regras.
— Esse é o contrato interno. — entreguei um papel a ela. — Nele consta o que você deve ou não fazer enquanto estiver morando comigo. Regras de convivência, horários, e claro... o que espero de você como esposa.
Ela pegou o papel como se fosse radioativo.
— Você é doente. — sussurrou.
Aproximei-me dela. Muito perto. O suficiente para sentir seu perfume floral invadir meus sentidos como uma lembrança que eu nunca tive. Minha voz saiu baixa, perigosa:
— Sou rico, poderoso e impiedoso, Helena. Doença seria te tratar como princesa, quando você é o último elo de uma linhagem podre.
Ela engoliu em seco. Um passo pra trás. Medo.
— Seu quarto é ao lado do meu. Porta sempre aberta. Você pode fazer o que quiser... menos sair daqui sem minha permissão.
— Isso é sequestro.
Sorri.
— Isso é casamento.
Dei as costas, caminhando até o bar e servindo uma dose de uísque. Com um movimento, indiquei a escada:
— Suba, tome um banho. Às oito da noite temos um jantar de apresentação. A sociedade precisa acreditar que somos felizes. E você... vai sorrir como se estivesse vivendo um conto de fadas.
Ela hesitou, mas se virou. Subiu as escadas. Lenta. Orgulhosa. Quebrada.
Observei até o último passo.
Helena não sabia, mas esse era só o começo. Ela achava que eu queria vingança.
Mas eu estava prestes a descobrir que havia algo nela que eu não podia controlar.
E isso... me assustava mais do que qualquer inimigo.
O vestido que mandei deixar sobre a cama era preto. Justo, com um decote ousado e uma f***a lateral que prometia escândalo. Não foi escolhido ao acaso. Eu queria que todos vissem o troféu que eu arranquei das mãos do homem que destruiu meu pai.
E, acima disso, queria vê-la desconfortável.
Nada melhor que uma mulher tentando parecer firme enquanto tudo dentro dela desmorona.
Quando ela desceu as escadas naquela noite, o mundo pareceu desacelerar por um segundo.
O salto alto ecoava sobre o mármore como um desafio. E mesmo contrariada, ela estava linda. Mais do que imaginei. Cabelos soltos, lábios vermelhos, olhar... mortal.
— Você tem bom gosto. — disse ela, parando diante de mim.
Inclinei levemente a cabeça, analisando cada detalhe como um investidor observa um diamante.
— Tenho. Por isso escolhi você.
Ela desviou os olhos por um instante. Bingo.
A arrogância é uma armadura fácil de quebrar quando você sabe exatamente onde bater.
O jantar era em um restaurante de luxo, onde meia cidade vendia a alma para conseguir uma mesa. Eu comprei o restaurante inteiro. Para aquela noite, tudo tinha que ser perfeito. A imprensa estaria presente. Sociedades inteiras observariam. E eu queria que cada mulher ali desejasse estar no lugar de Helena.
E que cada homem soubesse que ela era minha.
No carro, o silêncio reinava. Ela estava com o rosto virado para a janela, o maxilar travado. Eu podia quase ouvir os pensamentos passando por sua cabeça.
— Você não vai tentar conversar? — ela perguntou de repente, quebrando o gelo.
— Eu não preciso conversar para dominar um ambiente. — respondi sem olhar para ela. — Prefiro observar. E você, Helena... me diverte.
Ela riu, seca.
— E você me dá náuseas.
— Que ótimo. Um casal típico, então.
Chegamos. Flashes. Jornalistas. Olhares curiosos. Minha mão deslizou para sua cintura como um comando silencioso. Ela congelou, depois cedeu. Sorriu. Aquilo me surpreendeu. E me irritou.
— Você está se saindo bem demais. — sussurrei ao pé do ouvido dela enquanto caminhávamos entre os fotógrafos. — Começo a achar que nasceu para isso.
— Não subestime uma mulher encurralada, senhor Vilar. — ela respondeu com um sorriso doce que não alcançava os olhos.
No jantar, Helena se portou como uma rainha. E isso, de alguma forma, me incomodava.
Ela não parecia fraca. Não parecia derrotada. Ela parecia... perigosamente à vontade.
Quando voltamos para casa, já passava da meia-noite. Tirei o paletó, afrouxei a gravata e a observei de longe enquanto ela tirava os brincos em frente ao espelho da sala.
— Está aprendendo a jogar, boneca. — comentei.
Ela virou de frente para mim, os olhos azuis faiscando.
— Eu não sou um brinquedo, Nicolas. E não sou sua boneca.
Aproximei-me. Devagar. Até que só o ar separava nossos corpos.
— Não, você é uma farsa com um preço. E adivinha? Eu paguei.
Ela engoliu seco. A respiração dela estava descompassada, mas os olhos… os olhos ainda tinham fogo.
Minha mão roçou sua cintura. Delicada. Lenta. Até que ela segurou meu pulso, firme.
— Não se atreva.
Ergui uma sobrancelha.
— Eu já sou seu marido, esqueceu?
— No papel. Só no papel.
Sorri de lado, sentindo o sangue ferver sob a pele. Ela me provocava como ninguém. E eu... não sabia se queria destruí-la ou tê-la implorando por mais.
— Dorme com a porta trancada, Helena. Antes que eu decida fazer valer cada cláusula daquele contrato.
Ela se afastou, os olhos fixos nos meus.
— Você pode me forçar a usar seu sobrenome, Nicolas. Mas nunca vai possuir minha alma.
— Eu não quero sua alma, Helena.
Quero o seu coração sangrando por mim.
E quando eu conseguir isso… não vai ter volta.
Ela subiu as escadas. Não olhou para trás.
Mas eu sabia que ela sentia.
Sabia que, de algum jeito, eu já tinha invadido o mundo dela.
E ela…
estava começando a invadir o meu.