Aqui estou eu para me apresentar: sou o DG e sou o subdono do morro, que comando ao lado do meu amigo RF — ele é dono da p***a toda. Hoje em dia sou um cara fechado, que não aceita levar desaforo para a casa; se não andar como eu quero, simplesmente mato. Aqui somos a lei. Aqui ajudamos moradores, já que o governo é filho da p**a e esquece deles. Muitos, para trabalhar, não falam que são do morro, porque na primeira oportunidade sofrem o racismo de todos lá embaixo. Aqui corremos atrás de manter a UPA funcionando, para ajudar a todos, com os remédios que compramos dos médicos que vendem por fora. E, para a sociedade, somos bandidos ruins que merecem morrer. Tenho 28 anos.
Mas antes de continuar, vou voltar um pouco no tempo — da época que eu tinha 16 anos até fazer 18. O que muitos não sabem é que eu sou filho de pastor e missionária, e eles são uma bênção de Deus. Isso mesmo: meus pais são Elias e Rute. Eles nunca me viraram as costas, e todos os domingos eu vou almoçar na casa deles com o RF e com a Arlequina.
Lembranças — ON
Vamos lá: aos meus 16 anos eu fazia parte do grupo de jovens, tá ligado? Também tocava bateria. Nunca me batizei, não porque eu fosse um filho rebelde, mas porque, para tomar essa decisão, você tem que estar seguro — não se batizar para agradar ninguém; você tem que sentir no coração. Já vi bastante gente se batizar e depois sair da igreja.
Sempre fui criado na igreja. Meus pais me contam que, antes do meu pai se converter, ele era do mundão, tá ligado? Já minha mãe sempre foi da igreja, nunca sentiu desejo de sair. Meu pai era coisa louca, mas se apaixonou pela minha mãe; como ela não largou a seguir com Deus, e depois de quase perder a minha mãe, ele converteu-se e nunca mais saiu da igreja.
Sério: eu amo a história de amor dos meus pais, o apoio que eles dão um ao outro. Cresci vendo meu pai tratar a minha mãe como rainha. Não só ele — o meu tio também trata a minha tia e a minha prima como princesas; eles ajudam meus pais a tocar o restaurante.
Uma coisa que poucos sabem: eu me apaixonei por uma moça que também frequentava a igreja dos meus pais. Ela ia com os pais dela — a Clara. Só que o pai dela não gostava quando ela conversava com os meninos da igreja; ele sempre deixou claro que ela já tinha um casamento arranjado desde que nasceu, com o filho do seu melhor amigo. Mesmo assim, nos apaixonamos e fizemos a loucura de nos encontrar escondidos. Nunca rolou nada entre nós a não ser beijos e carinhos. Lembro-me da nossa despedida todos os dias.
— Não vai, amor. Fica. Vamos lutar para poder ficar juntos; ele não pode obrigar você a ir embora e se casar com um homem que você nunca viu na vida — falei enquanto limpava as suas lágrimas.
— Eu não posso, Diego. Você não ia entender. Eu preciso fazer o que ele manda, pois não sou só eu quem pagaria as consequências se eu decidisse ir embora por sua causa. Sério, você não conhece meu pai: ele não é esse santo que se mostra para todo mundo — ela falou chorando.
— Já percebi, Clara, que seu pai não é santo. Já reparei que a sua mãe às vezes vem para a igreja e também já vi, sem querer, umas marcas roxas ali; seu pai bate em vocês, é isso? Ele está-te obrigando a se casar, meu amor. O nosso amor pode ser mais forte que isso — falei, deixando as lágrimas cair.
— Se o nosso amor for tão forte assim, um dia a gente pode se reencontrar, meu amor, e poderemos ficar juntos de vez, sem precisar ser escondido. Eu vou-me tornar médica; vou honrar o meu futuro marido em tudo que eu puder. Só que amor de verdade eu só vou poder sentir por você, meu amor. Não vou parar de pensar em você. Talvez tudo isso seja Deus provando a gente, fazendo cada um viver, uma história, um propósito, para depois a gente viver algo ainda melhor — ela falou-me. — Não importa como seja a situação. Lógico que jamais vou pedir para você me esperar; segue a sua vida. Se for para ser, vai ser. Nunca se esqueça: você sempre será o homem que eu vou amar para sempre.
— Eu também vou-te amar para sempre. Não vou prometer nada, porque o amanhã só pertence a Deus. Mas saiba que eu tenho fé: um dia vamos nos encontrar novamente; e desse dia em diante seremos só nós dois e Deus. Vamos lutar para ficar juntos — eu disse.
Então ela encostou a testa na minha, e acabamos nos beijando — um beijo de “até breve”. Podia demorar o quanto fosse, e assim passamos a tarde juntinhos, até que chegou a hora de ela ir embora porque o pai estava chegando, e ele mandou a mãe da Clara não a deixar sair.
Após um mês em que ela completou 15 anos, ela foi embora; seus pais saíram da igreja e nunca mais os vi. Procurei Clara nas redes sociais e não a achei — ela parou de postar sobre a família. Eu continuei na igreja, ensaiando com os jovens, e foi nesse tempo que conheci o Rafael. Ele era de outra série diferente da minha; sem querer, a gente esbarrou-se, e desde então a nossa amizade não parou.
Já levei ele em casa umas vezes; meus pais gostam muito dele. Um dia meu pai falou para ele que tinha uma missão aqui na terra, porém teria de passar pelo vale — ali seria o momento da escolha. Por mais incrível que seja, o Rafa aceitou tudo que meu pai falou. Sempre que podia, vinha pedir oração aos meus pais, que sempre oraram por ele. Eu sentia-me orgulhoso dos meus pais; eles não faziam perguntas sobre o Rafa, mas diziam que já sabiam de tudo. Será que sabiam que ele era herdeiro do morro? Sim: ele contou-me tudo sobre a vida dele, sobre a prima e também sobre a filha da madrasta, que ele tinha como mãe. Foi aí que comecei a ter curiosidade sobre o mundo de lá de fora. O Rafa nunca me incentivou a seguir essa vida; ele só me aconselhava. Falou que, no momento em que eu completasse 18 anos, eu poderia sair da igreja — só aguardava o momento certo para falar com meus pais.
Sobre a família do meu pai: não conheci os meus avós; era só ele e meus pais. Já em relação à família da minha mãe, os meus avós já são falecidos, e a minha mãe acabou criando o meu tio Rogério — ele tem-a como mãe. Foi ela quem ensinou ele a ser esse homem f**a que é hoje. Minha mãe e a tia Rosa se dão super bem, assim como eu me dou super bem com a minha prima Cristal: somos melhores amigos. Contei a ela o que pretendo fazer quando for maior; ela me abraçou e disse que está comigo, que sempre vai-me visitar e que também vai curtir uns bailes ‘funk’ de favela. Vê se posso com isso — ela é bem maluquinha, mas tem um coração muito bom. E, com isso, muitos se aproveitam dela. Sei lá, não confio naquela amiga dela nem no namorado dela; espero que seja coisa da minha cabeça, porque se for o que imagino, as coisas não vão ficar boas para o lado deles. Até o meu tio já percebeu e teme pelo que pode acontecer quando a Cristal descobrir quem eles são de verdade. Eu já deixei claro que aconteça o que acontecer eu sempre vou cuidar dela com a minha própria vida, se for preciso, porque o que mais dói é a dor da traição e da rejeição.
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