capítulo 04

1365 Words
Erika narrando capítulo 04 Eu não sabia se tremia de medo ou de alívio. As palavras dele ainda ecoavam na minha cabeça. “Se tu tiver mentindo, eu te mato.” Não parecia uma ameaça vazia. Era uma promessa. Mas o que me assustava mais… era que eu acreditava quando ele disse que podia me ajudar. Respirei fundo. O café queimava um pouco minha língua, mas me forçava a manter a calma. Ele me observava de um jeito que nenhum homem tinha me olhado antes. Não era desejo. Não era pena. Era análise. Como se estivesse me lendo por dentro, procurando falhas, mentiras, rachaduras. - Eu não tenho mais nada. Meu pai bloqueou minha conta ,meu cartão tudo que eu tinha vinha dele , mais eu juro que se puder me ajudar eu aprendo rápido as coisas , eu faço qualquer coisa ... - Cê tem sim .ele disse, encostando no sofá, apoiando os braços nos joelhos, o olhar firme nos meus. - Cê tem a própria vida. E aqui, isso já vale muito. Engoli o nó na garganta. Pela primeira vez , senti que alguém via valor em mim sem querer nada em troca. Ou… talvez quisesse, mas era outra coisa. Outro tipo de acordo. - Se quiser ficar aqui, tem que entender uma coisa . ele continuou. - Eu não sou santo. Faço o que for preciso pra manter o que é meu. E esse morro é meu. Quem pisa aqui, tem que somar, não atrapalhar.Assenti. - Eu entendo. Não quero te atrapalhar eu agradeço por tudo , eu me viro . levantei ,mais ele foi mais rápido ,me puxou pela blusa me fazendo sentar novamente. - Não entendeu, não. Ainda não. Mas vai entender. Ele se levantou, andou até a janela, olhou lá pra fora e falou sem virar pra mim -Tem uma mulher na parte de baixo da favela. Costura roupa, faz uns corre de renda, sabe lidar com encomenda. Ela é do movimento, mas trabalha certo. Pode te ensinar. Aprende a fazer, embalar, cuidar. Depois eu vejo se serve pra coisa melhor. - Você quer que eu… trabalhe pra você? perguntei, com cuidado. A ideia me assustava, mas ao mesmo tempo… me dava direção. Propósito. -Eu quero que você prove que merece ficar. Aqui ninguém é hóspede. Todo mundo faz a sua parte. Pensei por alguns segundos. Eu podia recusar. Podia tentar correr de novo. Mas pra onde? E por quê? Ele não tinha me pedido nada além do básico. - Tá certo. Eu aceito. O que for preciso, eu faço. Ele virou e me olhou de novo. Sério. Aquele tipo de seriedade que impõe silêncio. - Sem gracinha, sem mentira. Se alguém te perguntar de onde veio, diz que tá sob minha proteção. Ninguém vai encostar em você. Mas se me fizer de o****o, Erika… não vai ter segunda chance. - Eu não vou mentir eu odeio mentira . falei sem desviar o olhar . - Pode confiar em mim, eu só quero uma chance de seguir o meu caminho . Ele assentiu devagar. Um quase sorriso surgiu no canto da boca. Quase. Mas sumiu rápido. - Então amanhã cedo, a tia te leva lá. Hoje você descansa. O café tá na mesa , Aquele quarto que tu dormiu e meu , pode ficar no quarto aí lado . Mas não esquece tá na minha casa. E aqui, quem manda sou eu. Ele virou e saiu pela porta que dava pra escada externa. Fiquei ali parada com o café na mão, o coração batendo forte. Tudo ainda parecia irreal. Mas agora tinha um plano. Um começo. Dei um gole no café frio. Meus dedos ainda tremiam. Mas dentro de mim… alguma coisa começava a se firmar. Era medo, sim. Mas também era esperança. Talvez, só talvez aqui fosse o único lugar onde eu finalmente poderia recomeçar. E ele… fosse a primeira pessoa que olhou pra mim e não viu só uma boneca de luxo quebrada. Mas sim uma mulher tentando voltar a ser inteira. Fiquei ali mais uns minutos, sozinha, digerindo tudo. As palavras dele, a firmeza, a proposta. Eu m*l sabia onde estava, quem era ele de verdade, mas uma coisa era certa ele era respeitado. Tinha poder, e agora, por alguma razão, me oferecia abrigo. Com regras, sim. Com riscos, muitos. Mas também com um estranho senso de proteção que eu nunca tinha sentido antes , nem na minha própria casa. Estava prestes a levantar quando ouvi a porta da cozinha ranger. Uma senhora entrou. Tinha os cabelos presos num coque baixo, um avental colorido e um sorriso simpático , que aquecia o ambiente. - Oi, minha filha. Posso entrar?Assenti, meio sem saber como reagir. -Sou a Celeste. Todo mundo aqui me chama de Dona Celeste, mas pode me chamar só de tia, se quiser. Trabalho pro D tem anos já. Ela foi se aproximando devagar, respeitando meu espaço, com uma delicadeza que me pegou de surpresa. -Vim te chamar pra tomar um café decente, com pão na chapa. Esse aí já deve tá frio. -Obrigada… respondi, com a voz baixa. Ainda segurava a caneca entre os dedos. -Eu... desculpa se tô incomodando. Ela deu uma risada curta, como quem já tinha ouvido isso antes. - Incomodando? Que nada, menina. Se o D te botou aqui dentro, é porque ele viu alguma coisa. E se ele viu, a gente respeita. Vem, vamos comer alguma coisa. Tu tá pálida que só. Parece que vai sumir. Me levantei devagar. A cabeça ainda girava um pouco, mas as pernas obedeceram. Caminhei atrás dela até a cozinha. Era tudo organizado cheia de vida ,plantinhas espalhadas pelo ambiente . O cheiro do café recém-passado misturado com o pão na chapa me bateu com força. Era cheiro de lar. De cuidado. Ela apontou uma cadeira e sentou na outra, passando uma xícara limpa e colocando um prato com dois pães quentinhos na minha frente. -Come, fia. Depois a gente conversa. Mas antes, alimenta esse corpo porque saco vazio não para em pé .Dei um sorriso pequeno. O primeiro em dias, talvez. Peguei o pão e mordi, e por um segundo, o mundo pareceu menos c***l. - Obrigada, de verdade. Por tudo. Eu não sei nem como agradecer... -Agradece ficando firme. O mundo lá fora é r**m, eu sei. Mas aqui, tem gente que ainda se importa. O D, ele é duro, mas tem um coração maior que ele deixa mostrar. Só não vai atrás de enganar, que aí ele vira bicho. E ninguém segura. Assenti, mastigando em silêncio. Aquelas palavras não vinham com ameaça, vinham com verdade. Era o tipo de conselho de quem já tinha visto muita gente errar por aqui. -Ele disse que amanhã vou aprender com uma mulher que costura… que faz uns trabalhos. - Ah, a Iara. Gente boa. Fala pouco, mas ensina bem. Se tu tiver disposição, ela te mostra o caminho. E se tu tiver cabeça, aprende rápido. E quem sabe, um dia, sobe mais um degrau. Aqui é assim, Erika. A gente planta pra depois colher. -Eu quero muito tentar. minha voz saiu mais firme. - Não quero ser peso, nem dar problema. Só preciso recomeçar, sabe? Ela me olhou nos olhos, e por um momento, o sorriso dela pareceu mais cheio. - Toda mulher tem o direito de recomeçar. Ainda mais depois de ser quebrada por dentro, desculpa mais não teve como não ouvir a conversa . Aqui, tu vai aprender a ser forte de um jeito que colégio caro nenhum ensina. Mas também vai ter quem te ajude a juntar os pedaços. Só não fecha teu coração. Nem pra dor… nem pra cura. Me emocionei. Baixei a cabeça, tentando esconder os olhos marejados. -Pode chorar, menina. Chorar limpa a alma. Mas depois, enxuga e segue. Porque aqui, a gente não tem tempo pra cair e ficar. Se cair… levanta. Nem que seja com ajuda. Abracei a xícara com as duas mãos e respirei fundo. senti que tenho chance. Um lugar no mundo onde talvez eu pudesse me reconstruir. E Dona Celeste, com sua fala mansa e olhos experientes, era o primeiro alicerce dessa nova história. Comentem meus amores não esqueçam de adicionar na biblioteca...
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