Violências

1602 Words
15 de agosto de 2008 Estava vendo Henry e Meg brincando com o Spike, nosso poodle. Eles corriam pela casa com um brinquedo de pano nas mãos, enquanto Spike corria atrás tentando pegar seu bichinho. Me pus olhar a chuva que caia do lado de fora, e comecei a chorar, senti uma enorme tristeza inexplicável, eu só queria sumir, queria morrer e queria que mamãe morresse também e as vezes desejava a morte do papai também. Meus pais estavam dormindo, o tempo estava bom para dormir mesmo por conta da chuva. Sai de casa, sem lembrar que estava chovendo e corri pelas ruas. Algumas pessoas falaram comigo, mas não respondi ninguém. Continuei correndo até chegar em uma casa que era dois quarteirões depois da minha. Toquei a campainha e logo ele abriu a porta. - Mia? O abracei, enquanto chorava sem parar. Noah me retribuiu o abraço. - O que houve? - Me perguntou parecendo preocupado. - Posso ficar um pouco aqui? - Claro. Entrei em sua casa e logo cumprimentei os pais do garoto, que estavam na sala assistindo a algum programa na televisão. - Tá tudo bem, querida? - Me perguntou Sra. Harter soando amigável. Acenei a cabeça positivamente com os olhos lacrimejados, e logo Noah me levou para o quarto dele. Nos sentamos em sua cama e logo o abracei. - Você está tremendo. O que houve? Noah era a pessoa que eu mais confiava, mais do que a Ashley, mas eu achava que se eu contasse pra ele, Noah me diria ´´sério que você está assim por causa dessa bobagem? Que besteira, Mia! Isso é super normal´´, pois na minha cabeça isso de fato era normal, embora eu não gostasse e não entendesse a gravidade do que acontecia. - Eu acho que quero morrer. - Falei. - Quê? Você não pode dizer isso e nem pensar nessas besteiras. Tá maluca? Por que tá dizendo isso? - Tô cansada. - Respondi. - Cansada dessa droga de vida, não aguento mais isso, só queria paz, só queria ser feliz. - E você não pensa em mim? Eu sou seu amigo e gosto de você, não quero que você morra. O abracei fortemente, e fui abraçada por ele da mesma forma. Assim que nos distanciamos um pouco, eu lhe dei um selinho. Notei a surpresa dele. - Por que você fez isso? - Perguntou ao colocar a mão na boca. - Desculpa, é que eu gosto muito de você. Era o jeito que eu conhecia para demonstrar o quanto eu gostava dele, o jeito que meus pais haviam me ensinado, na verdade, eles me beijavam de língua, mas eu achava muito nojento. - Também gosto muito de você. - Disse Noah. - Mas... Mas eu nunca tinha beijado ninguém na boca. - Não? - O questionei surpresa. - Não! Você já? - Hã... Não. - Menti. Fiquei algum tempo na casa do Noah, estar com ele fazia eu ficar bem mais calma, até esquecia todos os meus problemas. Os pais de Noah me levaram pra casa, mas eu não queria ter que voltar, queria poder ficar na casa deles para sempre. Meg e Henry estavam vendo desenho quando eu cheguei. Papai e mamãe ainda estavam dormindo, nem haviam notado que eu sai. - Onde você foi? - Perguntou Henry. - Fui falar com o Noah. - Não gostamos de ficar sozinhos. Ficamos com medo. - Disse Meg. - Mas os nossos pais estão em casa. - Mas estão dormindo. - Disse minha irmã. - Ou seja, dá no mesmo. Em seguida, eles acordaram e começaram a preparar o jantar. Mamãe era uma péssima cozinheira, só sabia fazer arroz, omelete e bacon, nossa sorte que papai cozinhava bem, só assim para não morrermos de fome. A gente jantou em silêncio, meus pais não gostavam que a gente conversasse na hora das refeições.  Eu tinha mais medo da minha mãe do que do meu pai, porque mesmo ele abusando de mim e dos meus irmãos, ele tinha momentos que era bom pra gente, mas a minha mãe não, e ela nos batia muito, a ponto de nos deixar marcas. Os motivos? Não existiam, eram porque deixamos algo fora do lugar, ou porque ela teve que nos chamar duas vezes para entrarmos em casa após um dia de brincadeiras na rua, ou então, pelo simples fato de que ela queria nos bater. Isso acontecia sempre que meu pai não estava, pois senão ele não deixava, ele odiava que ela nos batesse, e quando ele descobria, os dois brigavam feio. Lembro de uma vez que meu pai chegou a bater na minha mãe, embora ele não fosse um homem violento, mas ele queria que ela sentisse na pele o que a gente sentia. Mamãe ficou meses sem encostar um dedo em nós. (...) 9 de setembro de 2008 Ashley passou o dia na minha casa, brincamos muito juntas, meus irmãos também brincaram conosco, nos divertimos tanto. Eu adorava estar com meus amigos, pois na frente deles, minha mãe parecia gente, ou fingia ser. - Posso te contar um segredo? - Perguntei à Ashley enquanto meus irmãos brincavam com Spike. - Claro. Adoro segredos. - Acho que eu estou apaixonada. Ok, eu só tinha 8 anos e nem sabia ainda o significado dessa palavra, mas quando se é criança só o fato de você ter um melhor amigo ou achar um menino bonito, já é sinônimo de paixão. - Sério? - Perguntou um pouco surpresa. - Não me diga que é o Noah. - Aham. - Falei ao afirmar com a cabeça. Ela sorriu com minha afirmação e eu lhe pedi segredo. Nisso meus irmãos voltaram querendo que a gente continue brincando com eles. E Ashley foi embora um pouco antes de escurecer. Papai havia viajado, fazia dois dias que ele estava fora, eu não sabia se gostava ou não quando ele viajava, pois não éramos abusados, mas também não tinha quem cuidasse da gente. E esse dia foi c***l. Mamãe bebeu além da conta, ela não exagerava sempre na bebida, mas quando acontecia, era horrível.  Ela estava fora de si, ria por nada, não falava coisa com coisa, ficamos muito assustados, ela nos deixava assim. Queria sair dali, mas não podia deixar meus irmãos sozinhos, eram tão pequenos. Ela estava com muita raiva, um ódio absurdo de algo que eu não sabia o que era. Eis que ela me puxou pelos cabelos e me queimou na barriga com seu cigarro. Gritei de dor, enquanto ela dava risada. Em seguida, ela pegou uma tesoura e cortou um pouco do meu cabelo. Meus irmãos e eu choramos muito.  Vi uma garrafa caída perto da gente, a peguei e dei com muita força na cabeça da mamãe, e ela caiu no chão desmaiada. Não demorou nem um minuto para que o chão tivesse virado uma poça de sangue. - Você matou ela. - Disse Henry. - Vamos embora daqui. - Falei aos prantos. Meg pegou Spike no colo e a gente correu pelas ruas do nosso bairro. Novamente eu vou até a casa do Noah, o lugar que eu mais gostava e mais me sentia protegida. - Meu Deus! - Disse Sra Harter. - O que houve com vocês? Andem, entrem. A gente entrou na casa, e logo eu avistei o Sr. Harter sentado no sofá, mas não vi Noah. Logo, ele desceu as escadas, seu semblante ao me ver era de preocupado. - O que houve com vocês, crianças? - Me perguntou Sr. Harter. - Acho que eu matei a minha mãe. - Falei ao abraçar a mãe do Noah. Fiquei abraçada nela, que me devolveu o abraço, um abraço cauteloso, tentava encontrar conforto, e nela, eu conseguia, pois a sentia como uma mãe, e queria que ela fosse a minha mãe. - Nos expliquem isso. - Ela pediu ao desfazer o abraço. Contei tudo o que havia acontecido naquela noite. Os três ficaram apavorados, alegaram que nunca imaginariam que minha mãe fosse capaz dessas monstruosidades. Em nenhum momento comentei dos abusos, não tinha coragem, embora eu quisesse falar. Eu estava com medo, com muito medo, não sabia o que aconteceria comigo. Os Harter´s deixaram a gente dormir em sua casa naquela noite. O Sr. Harter foi até a minha casa e nos informou posteriormente que ao chegar lá, encontrou mamãe sentada no sofá e sangrando muito, chamou uma ambulância pra ela, que foi levada ao hospital, mas também havia avisado a polícia.  - Que bom que ela não morreu. - Me disse Noah. - Eu queria que ela morresse. - Falei. - Mas não queria matá-la. Noah ficou me olhando em silêncio, senti um ar de pena em seu olhar. - As crianças não deviam passar por essas coisas. - Ele me disse. - Ninguém devia passar por isso. - Completei. - Quando eu crescer, vou cuidar de você pra nunca mais te machucarem. - Disse o garoto. Sorrio, lhe dei um beijo no rosto e o abracei. Mamãe teve alta no dia seguinte e do hospital foi levada direta para uma clínica psiquiátrica, pois foi dada como louca. Papai demorou alguns dias ainda para voltar de viagem e até isso acontecer, ficamos na casa dos Harter´s, que nos cuidaram com todo amor e carinho, queria morar com eles. Quando meu pai voltou da viagem, ele ficou sabendo do que havia acontecido e ficou apavorado, tive medo que ele desse um jeito de tirar a mamãe da clínica, mas ele não fez, disse que não queria ao lado dele, uma mulher que faz isso com seus filhos.
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