Capítulo 2 – Ele Mandou, Eu Obei
Faziam dois dias desde que ele entrou na minha casa.
Duas noites sem dormir direito. Dois dias com o coração acelerado e a mente confusa.
Eu não contei nada pra ninguém. Nem pra minha mãe, nem pra minha melhor amiga. Como eu ia explicar que o homem mais temido da favela apareceu no meu quarto, me chamou de princesa e disse que agora eu era dele?
Era loucura. Mas era real.
No terceiro dia, eu tentei fingir que nada aconteceu. Acordei cedo, vesti meu uniforme da escola, amarrei o cabelo e fui a pé até o ponto de ônibus, como sempre. Mas alguma coisa em mim tinha mudado.
Cada passo parecia vigiado. Cada olhar, suspeito. Como se todos já soubessem. Como se eu tivesse uma marca invisível no pescoço, dizendo:
“Propriedade do Dono do Morro.”
Na porta da escola, as coisas ficaram ainda mais estranhas. Um carro preto, de vidro escuro, estava parado bem na frente. Ninguém descia, ninguém subia. Só estava ali, como uma sombra esperando a hora certa de se mexer.
Eu ignorei e entrei.
Mas na hora do intervalo, recebi a mensagem.
> Número desconhecido:
“Não se mistura com aquele moleque da camisa azul. Ele tá te olhando demais.”
Travei. Olhei ao redor, tentando descobrir quem podia estar me vigiando. Então vi:
Gabriel.
Encostado na grade da escola, de braços cruzados, óculos escuros e o mesmo cordão de ouro pesado no pescoço. Ele não sorria. Não me chamava. Só me observava. Como se estivesse marcando território.
Meu coração disparou.
Ele não devia estar ali. A escola era zona neutra, onde até o tráfico evitava entrar. Mas ele estava. Como se regras não se aplicassem a ele.
E, pra falar a verdade, não se aplicavam mesmo.
Desviei o olhar e fingi que não vi. Voltei pra sala tentando me concentrar, mas era impossível. A mensagem, o olhar dele, tudo fazia minha cabeça girar.
À tarde, quando cheguei em casa, encontrei um pacote na porta do meu quarto.
Dentro tinha:
– Um celular novo.
– Um chip.
– E um bilhete escrito à mão:
> “Você só vai usar esse número agora. E só vai falar comigo.
E não precisa se preocupar com seu padrasto hoje.
Ele não vai mais te incomodar.”
Engoli seco. A mensagem era clara…
Mas o que mais me assustou foi perceber que, no fundo…
Eu não estava com medo.
Eu estava aliviada.
Naquela noite, meu padrasto não voltou.
Minha mãe disse que ele tinha viajado às pressas, do nada.
Mas eu sabia.
Gabriel tinha feito alguma coisa.
Eu deitei na cama com o celular novo na mão, o coração acelerado e uma mistura de sentimentos que eu não conseguia explicar.
Era errado.
Mas era bom.
Pela primeira vez, alguém estava me defendendo. Me cuidando. Mesmo que fosse do jeito mais insano possível.
E então o celular vibrou.
> Gabriel:
“Boa noite, princesa.”
Eu respirei fundo antes de responder.
> Eu:
“O que você fez com ele?”
A resposta veio segundos depois.
> Gabriel:
“Só cuidei do que era meu.”
> Eu:
“Eu não sou sua.”
> Gabriel:
“Ainda.”
Fechei os olhos. Meus dedos tremiam. Mas não de medo.
De desejo.
Naquela noite, dormi com o celular apertado no peito e o nome dele queimando na minha mente.
Gabriel Matias.
Dono do morro.
E, aos poucos…
Dono de mim.