Capítulo 9 – Quando o Amor Vira Alvo

906 Words
A noite passou como um pesadelo. Gabriel saiu, e eu fiquei na casa, andando de um lado pro outro, com o coração preso na garganta. As paredes pareciam estreitas demais. O silêncio parecia gritar. E eu só queria uma coisa: que ele voltasse vivo. Às 2h43 da manhã, o som da moto cortou o morro. Corri pra porta. Quando abri, ele estava lá. Camiseta manchada, rosto suado, mas inteiro. — Gabriel! — corri e abracei com força. Ele me apertou de volta, como se só ali pudesse respirar. — Tá tudo bem agora. — ele disse. — Já passou. Mas eu sabia que não tinha passado. Não pra ele. Ele não falava tudo… mas seu corpo contava cada detalhe. A tensão nos ombros. O jeito que olhava por cima do ombro. A arma ainda presa na cintura. — O que aconteceu? — perguntei. Ele hesitou. Depois respondeu: — Tão tentando tomar o morro. Vieram de fora, armados. Mas não conseguiram passar. — E você… matou alguém? Silêncio. — Se for preciso, eu mato pra proteger o que é meu. — ele disse, e olhou direto nos meus olhos. Eu era o que ele queria proteger. --- No dia seguinte, ele m*l saiu da cama. Acordava assustado. Olhava pro celular a cada dez minutos. A guerra tava prestes a estourar, e ele sabia. Só não queria que eu soubesse. — Você vai sair de novo hoje? — perguntei. — Não. — respondeu curto. — Tá mentindo? — Tô tentando te poupar. — Eu não quero que me poupe. Eu quero saber onde tô pisando. Ele me encarou. — Você tá pisando no meu mundo. E ele é sujo, c***l, e mata sem dó. — Mas se você me der sua confiança… eu juro que te mantenho viva nele. --- À tarde, bateram na porta. Era Nando, o braço direito de Gabriel. Baixo, tatuado, sempre com cara de quem já viu coisa demais. — Chefe… temos um problema. Gabriel se levantou. — Amanda, fica aqui. — Não. Eu vou. — Amanda… — Eu não sou de vidro. Ele respirou fundo, vencido, e me deixou ir. --- Descemos até uma viela escondida. Lá, três homens estavam amarrados. Dois deles sangravam. O terceiro tremia. — Esses são os informantes. Estavam mandando localização nossa pros rivais. — disse Nando. Gabriel olhou pros três como quem olha lixo. — E vocês acharam que iam sair vivos daqui? O terceiro implorou: — Eu tenho filho, mano. Não foi por m*l… — Foi por grana, né? — Gabriel falou, frio. — Mas a minha mulher também tem um preço. E se alguém encostar nela… eu mato rindo. Um tiro. Seco. Rápido. O traidor caiu no chão, e eu perdi o ar. Vi sangue. Vi medo. E vi o homem que dizia me amar… sendo juiz, carrasco e executor. --- Naquela noite, eu não falei. Não chorei. Só deitei na cama com ele. — Você me odeia agora? — ele perguntou, baixo. — Eu não odeio você. Eu odeio o que o mundo fez com você. Ele virou pro lado, puxou meu corpo pra perto. — Você ainda é minha? Demorei um segundo. Mas respondi: — Sou. Mas não me pede pra entender tudo isso agora. — Não quero que entenda. Só quero que fique. E eu fiquei. Mesmo com o coração apertado. Mesmo com a alma rachando. Porque amar alguém como ele… era como abraçar um furacão e chamar de lar. --- Nos dias seguintes, a tensão aumentou. Toques de recolher. Olhares desconfiados. Barulho de motos altas subindo o morro. Gabriel montou guarda 24 horas. E eu… comecei a me perguntar se ainda tinha volta. Uma noite, enquanto ele limpava uma pistola, falei: — E se eu quiser estudar de novo? Terminar a escola? Ele parou. Me olhou por um segundo. — Você quer isso? — Quero. Eu preciso de algo que seja só meu. Ele ficou em silêncio. Depois disse: — Eu vou te dar isso. Mas com segurança. — Como? — Eu coloco um homem lá. Na escola. Ninguém te toca. — Eu não quero segurança. Eu quero liberdade. — E eu quero você viva. — ele rebateu, firme. — Não me obriga a escolher entre seu sonho e sua vida. E eu entendi. No mundo dele, sonhar era perigoso demais. --- Na madrugada, acordei com gritos. Gabriel não estava na cama. Corri pra fora. Lá embaixo, ele discutia com outro homem. — Você tá trazendo risco pra ela! — Gabriel gritava. — Se algo acontecer com Amanda, eu juro que ninguém escapa! O outro tentou argumentar, mas Gabriel estava em ponto de explosão. — Ela é minha! — ele berrou. — E se alguém ousar encostar nela, eu faço esse morro descer em sangue! Quando voltou pra casa, suado e tenso, ele sentou na beira da cama. — Me desculpa. — disse. — Eu só quero te manter viva. — Eu sei. — respondi, sentando ao lado dele. — Mas eu não quero viver trancada em medo. Ele olhou pra mim. Pela primeira vez… com lágrimas nos olhos. — Eu tô tentando, Amanda. Eu nunca amei alguém assim. — Então aprende comigo. E nos beijamos. Um beijo amargo. Cheio de medo. Cheio de urgência. Como se o amanhã fosse longe demais pra alcançar. --- Na manhã seguinte, ele saiu. Dessa vez, sem dizer pra onde ia. E pela primeira vez, eu senti um frio diferente. Como se… ele não fosse voltar.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD