Harry ainda observava Yara de longe quando o celular vibrou no bolso.
Ele deu um pequeno sobressalto como se tivesse sido pego fazendo algo que não devia.
Ao ver o nome Brooks na tela, respirou fundo antes de atender.
— Diga. — falou em tom controlado, sem tirar os olhos de Yara.
Do outro lado, o amigo riu.
— Diga? Boa tarde pra você também, príncipe traumatizado.
Harry revirou os olhos.
— O que você quer?
— Quero saber se você já fez a loucura que eu sei que você está pensando em fazer.—
Brooks fez uma pausa dramática.— Você foi atrás da garçonete, não foi?
Harry ficou em silêncio por dois segundos.
Longos demais para Brooks não perceber.
— MEU DEUS, você foi! — Brooks gargalhou tão alto que Harry afastou o celular da orelha. — Eu tô falando sério, cara, você virou um adolescente?
Harry apertou a ponte do nariz, irritado.
— Eu não fui “atrás” de ninguém. Eu só vim… — respirou fundo — refletir.
Brooks gargalhou outra vez.
— Refletir na porta do bar onde ela trabalha? Que coincidência espetacular.
Harry fechou a mandíbula, impaciente.
— Brooks, eu estou levando isso a sério. Meu pai não vai recuar. Eu preciso de uma solução, rápida e convincente.
Do outro lado, a risada diminuiu.
— Tá. Agora falando sério… você realmente pretende contratar uma mulher aleatória que você viu uma vez?
Harry desviou o olhar para Yara, que mordia o hot dog com toda a fome do mundo e fechava os olhos como se fosse o melhor momento do dia.
— Ela não é “aleatória”.
Brooks riu de novo.
— Você nem sabe o nome dela, Harry.
O comentário atingiu mais forte do que ele admitiria.
— Vou descobrir. — murmurou, decidido.
— Cara… — Brooks suspirou. — Olha, eu te apoio em quase todas as suas loucuras, mas essa é de longe a mais i****a, arriscada e potencialmente genial que você já teve.
Harry não conseguiu evitar um pequeno sorriso.
— Bom saber que você confia em mim.
— Não confio. — Brooks rebateu. — Mas quero estar presente quando isso der errado. Vai ser hilário.
Harry bufou.
— Vai se fuder, Brooks.
— Ei! Espera! Não—
Harry desligou antes que ele pudesse continuar.
No banco adiante, Yara terminava o lanche e limpava as mãos com um guardanapo, suspirando como alguém que precisava desesperadamente de cinco minutos de paz.
Harry colocou o celular no bolso.
E, pela primeira vez, decidiu dar um passo real em direção à loucura que vinha alimentando desde a noite anterior.
Ele respirou fundo.
E caminhou em direção a ela.
Yara estava distraída, mexendo no guardanapo dobrado entre os dedos, quando percebeu uma sombra se aproximando.
Ela levantou o olhar e seus olhos castanhos se arregalaram levemente.
Harry.
Ele parou a poucos passos dela, impecável no terno escuro, contrastando violentamente com o cenário simples do food truck.
Por um segundo, eles apenas se olharam.
Então Yara, surpresa mas longe de intimidada, deixou escapar um sorriso divertido aquele tipo de sorriso que nasce quando algo inesperado, mas não desagradável, acontece.
— Oi… — ela disse com a voz suave, o sotaque carregado dando um toque melodioso à palavra. — Você é do bar de ontem, né?
Harry sentiu a boca secar.
Ela lembrava dele.
— Sim. — respondeu mais formal do que pretendia. — Eu… te vi entrando no seu intervalo e… — parou, percebendo que soava estranho — …decidi cumprimentar.
O sorriso dela aumentou, gentil, leve.
— Claro. Pode sentar— Yara indicou o espaço no banco ao lado, sem cerimônia. — Eu tava só descansando um pouco.
Harry hesitou por meio segundo ele, Harry Bakserville, CEO, herdeiro, frio, calculado hesitou.
Mas sentou.
Ela voltou a olhar para o restinho do hot dog no guardanapo e soltou um risinho.
— Me pegou num momento não muito glamuroso, né? Desculpa. Tava morrendo de fome.
— Não vejo glamour faltando. — ele disse, sem pensar.
Yara ergueu uma sobrancelha, surpresa, e riu.
— Muito educado você…
Harry respirou fundo.
Era agora ou nunca.
— Eu queria te agradecer pelo atendimento ontem. — ele começou, tentando soar natural. — Você é atenciosa e muito educada.
Ela deu de ombros, encolhendo os ombros no casaco.
— É meu trabalho, né? Mas… obrigada. Você parecia meio… — ela o observou com olhos curiosos, profundos — pensativo. Espero que tenha ficado tudo bem.
Harry a encarou, e pela primeira vez em muito tempo, sentiu-se realmente visto.
— Melhor do que antes. — disse simplesmente.
Yara assentiu, satisfeita com a resposta, sem pressionar por detalhes.
O vento bateu, bagunçando alguns cachos dela.
Ela prendeu um deles atrás da orelha, um movimento tão simples e tão natural que deixou Harry em silêncio por um instante.
— Eu… — ele começou, a voz mais baixa — estava esperando te ver novamente.
Yara piscou, surpresa.
Depois riu não de deboche, mas de encantamento sincero.
— É mesmo? Por quê?
Harry abriu a boca para responder.
Mas a verdade ou pelo menos a parte sensata dela fugiu completamente.
O que restou foi impulso.
Aquele mesmo impulso que tinha trazido ele até ali.
— Porque… eu queria saber seu nome. — Ele disse, sem desviar o olhar.
Yara sorriu, um sorriso cheio de luz, cheio de Brasil, cheio de calor.
— Yara. — ela respondeu. — Meu nome é Yara.
Harry repetiu mentalmente, como quem grava algo importante.
Yara.
— Yara… — ele murmurou, gostando de como soava. — Sou Harry.
— Eu lembro, seu amigo disse inúmeras vezes — ela disse com humor. — Você tava com uma cara de quem tava precisando de férias ontem.
Ele riu um riso curto e verdadeiro, que nem ele esperava.
Yara o observou por alguns segundos, inclinando a cabeça.
— Então… Harry… o que você tá fazendo aqui?
Ele respirou fundo.
Era agora.
Ou tudo desmoronaria antes mesmo de começar.