Capítulo 1
Hoje tinha tudo para ser perfeito. O dia em que eu caminharia até o altar para me casar com o homem que eu julguei ser o amor da minha vida. Seis anos de companheirismo, promessas sussurradas no escuro, planos para o futuro… tudo culminando naquele momento.
E eu estava radiante.
Nervosa, sim, mas radiante.
Até ouvir aqueles gemidos.
No começo achei que fosse algum convidado perdido, talvez alguém ao telefone. Mas eram altos… intensos… carregados de um prazer que não combinava com um dia como aquele.
Um arrepio gelado percorreu minha espinha.
Caminhei até a porta ao lado, hesitando por apenas um segundo antes de girar a maçaneta.
E então o mundo parou.
Meu noivo.
No meu dia.
Dentro de outra mulher.
E não qualquer outra mulher — mas Lorena, sua prima. Minha amiga. Alguém que eu tinha defendido inúmeras vezes quando diziam que ela era “pretensiosa demais”.
As mãos dele no corpo dela, os gemidos dela em seus ouvidos… aquilo se cravou em mim como uma lâmina.
Senti meu estômago virar.
Minhas pernas fraquejarem.
Meu coração rachar.
Tudo o que eu acreditava, tudo o que eu planejei… se desfazendo diante de mim.
Não consegui gritar, nem xingar, nem chorar ali. Apenas virei e corri, como se meu instinto mais primitivo tivesse assumido o controle. E eu só queria uma coisa: fugir daquele pesadelo.
O único lugar seguro na minha mente era a velha casa na colina — o refúgio da infância, onde Sabrina e eu passávamos dias despreocupadas. Onde nada r**m parecia capaz de nos alcançar.
No caminho, liguei para ela.
— Sabrina… — minha voz saiu quebrada — não vai ter casamento. O Fred… ele estava comendo a Lorena. No quarto ao lado do meu.
— Milly… meu Deus… eu—
— A chave ainda está no mesmo lugar? — interrompi, sem querer ouvir piedade.
— Sim, está, mas amiga, espera, eu preciso te dizer que—
— Obrigada, Sab. — desliguei antes que ela terminasse.
Eu não queria ouvir explicações. Não queria ouvir a piedade alheia. Eu só queria desaparecer.
Cheguei à casa pouco depois. A chave estava exatamente onde deveria estar, como se me aguardasse. Quando entrei, o cheiro de madeira antiga e lembranças me abraçou. O primeiro impulso foi me jogar no sofá e deixar as lágrimas caírem sem censura.
E eu chorei.
Chorei por mim.
Pelo que perdi.
Pelo que nunca existiu.
Subi para o quarto onde eu sempre ficava quando era mais nova. Aquele quarto parecia congelado no tempo, me lembrando de uma versão minha que acreditava cegamente no amor.
Deitei-me e, exausta, adormeci.
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Não sei quanto tempo passou, mas acordei com um cheiro quente e acolhedor de café. Por um segundo, um sorriso brotou — Sabrina. Ela deve ter vindo atrás de mim, como sempre fazia.
Desci rapidamente… e parei.
O ar saiu dos meus pulmões.
Não era Sabrina.
Era um homem.
Forte, alto, com um peitoral definido que denunciava horas e horas na academia.
Ele estava de costas, mexendo em panelas sem camisa, como se a cozinha fosse dele. A luz amarelada batia em seus ombros largos, destacando cada músculo, cada linha do corpo dele.
Quando ele se virou, meus joelhos quase cederam.
Lucas.
O irmão da Sabrina.
Meu corpo inteiro despertou como se tivesse sido tocado por eletricidade.
— Camilly! — ele disse, com surpresa real nos olhos. — Eu não esperava te encontrar aqui.
— Lucas… — murmurei, incapaz de esconder meu impacto.
Ele se aproximou devagar, como se tivesse medo de me assustar.
O olhar dele…
Caloroso.
Acolhedor.
E ao mesmo tempo, tão intenso que parecia me atravessar.
— A Sabrina me contou o que aconteceu — ele disse, a voz baixa, grave, quase um sussurro quente. — Sinto muito, Camilly. De verdade. Eu não consigo imaginar sua dor.
Senti as lágrimas voltarem, como se a força que eu juntara tivesse se dissolvido.
— Eu… eu não sei o que fazer — confessei, a voz embargada. — Eu confiava nele…
Lucas não pensou duas vezes.
Ele me puxou.
Me envolveu.
E seu corpo quente prensou o meu de uma forma que me desmontou completamente.
Aquele abraço…
Era diferente de tudo que eu já tinha sentido.
Forte. Protetor. Quente.
E eu me quebrei ali, escondida no peito dele, deixando meu corpo afundar no dele como se ele fosse a única coisa sólida no meu mundo desmoronado.
— Ei… — ele murmurou, seus dedos roçando meu rosto, enxugando minhas lágrimas — ele não merece isso. Não merece você.
Seus dedos eram firmes, gentis… um toque que meu corpo reconheceu de um jeito que eu não entendi.
— Obrigada — falei baixinho, quase sem voz. — Sua presença… significa muito.
Ele segurou minhas mãos.
As duas.
Com força.
Como se me ancorasse ali.
— Você não faz ideia de quanto é forte, Camilly. E merece alguém que te trate com o amor que você oferece. Alguém que escolha você todos os dias.
Os olhos dele brilhavam com uma sinceridade que me atingiu como um impacto físico.
E, por um segundo… só um segundo… meu olhar desceu para seus lábios.
Ele percebeu.
Eu senti.
Havia uma tensão invisível entre nós, quente, crescente, impossível de ignorar.
Mas então ele desviou o olhar. E naquele desvio, vi algo que me preocupou.
Dor.
Um peso interno.
Uma sombra que fazia seus olhos, tão lindos e intensos, parecerem distantes.
— Lucas… — murmurei, sem pensar — se você estiver passando por algo… eu quero estar aqui pra você também.
Ele deu um sorriso triste, quase resignado.
— Obrigado, Camilly. Mas… tem coisas que eu preciso enfrentar sozinho. E… não é fácil explicar.
A preocupação invadiu meu peito, misturada com algo que eu não deveria estar sentindo… algo que queimava devagar, como brasas.
— Só saiba que… eu tô aqui — sussurrei. — Não importa o que seja.
Ele assentiu.
E naquele momento, vi algo mudar nos olhos dele. Algo que ele tentava esconder.
Nos dias que se seguiram, ficamos naquela casa isolada.
Ele cozinhava.
Me acompanhava.
Me fazia rir quando eu achava que era impossível.
E, aos poucos, fui percebendo que não era só a minha dor que estava ali.
A dele também.
Silenciosa.
Profunda.
Guardada.
E quanto mais eu olhava para Lucas…
… mais sentia meu corpo reagir.
… mais minha pele parecia despertar quando ele se aproximava.
… mais eu queria entender aquele homem que escondia tempestades por trás de olhos tão gentis.
E algo dentro de mim dizia:
Aquilo ali… aquela conexão…
Não era só amizade.
Era algo nascido da dor.
Da proximidade.
Do calor dos braços dele.
Do jeito que ele me olhava quando achava que eu não percebia.
Algo que eu ainda não estava pronta para admitir.
Mas que já estava queimando dentro de mim.