O casarão que herdou dos avós era a última construção no final de um sinuosa rua asfaltada, mas que estava completamente rachada e com as listras amarelas quase completamente apagadas devido à velhice. Depois que os pais de Tobby morreram em um acidente de carro, três anos atrás, ele não teve escolha à não ser ir morar alí, já que o apartamento onde moravam antes, no Colorado, era alugado, e ele definitivamente não conseguiria pagar cerca de mil dólares por mês, já que ele sequer era empregado nessa época.
As melhores lembranças do casarão dos seus avós ainda estavam bastante vivas na sua mente. O lugar era onde ele passava metade das suas férias de verão todos os anos, mas seus pais pararam de levá-lo depois de uma desavença com seus avós, e foi justamente por isso que os dois retiraram os pais de Tobby do testamento, deixando tanto a casa quanto uma quantia em dinheiro que haviam juntado durante um tempo para ele.
— Não importa. — Dizia sua mãe sempre que o assunto vinha a tona, embora não acontecesse com muita frequência. — Aquele lugar está caindo aos pedaços.
E realmente estava caindo aos pedaços, pois a última vez que alguém havia pisado lá foi para se hospedarem durante o velório do seu avô, quando ele tinha doze anos. A sua avó havia morrido poucos meses antes, e depois dessa data, o lugar foi fechado e mais ninguém teve acesso à casa (exceto pela sua mãe, dois dias depois da morte do seu avô. Ela não tinha direito à casa, mas ninguém à impediria de vender os móveis seculares e caros, assim como os quadros valiosos que a avó de Tobby gostava de colecionar).
Quando resolveu se mudar para a enorme construção, ele ficou surpreso por ainda vê-la de pé, pois Tobias esperou seriamente encontrar apenas ruínas no lugar onde ficava a casa. E apesar de ainda estar praticamente inteira, as portas de madeira estavam meio apodrecidas, haviam alguns buracos no telhado, janelas de vidro quebradas, teias de aranha e pó por toda parte... Fora que não havia sequer um móvel lá dentro. O rapaz usou todo o dinheiro que tinha guardado para mandar concertar as coisas mais necessárias, como as portas, o telhado e as janelas, então todo o resto ele foi comprando aos poucos, logo depois de conseguir o emprego na cafeteria.
Tobias não tinha carro (ele dirigia no carro dos pais, que ficou completamente destroçado depois do acidente), mas não ligava para isso também. A cafeteria ficava à uns vinte minutos de distância da sua casa, e ele gostava de fazer o trajeto de bicicleta.
O jovem parou de frente para o portão que havia na parte da frente do enorme muro que cercava a sua propriedade, ele era de tijolos, sem o reboco por cima, o que na verdade ele gostava bastante. Tobby desceu da bicicleta e procurou as chaves nos bolsos, encontrando-a rapidamente no bolso de trás do seu jeans surrado. Ele destrancou o portão e empurrou sua bicicleta para dentro sem pressa alguma, cantarolando baixinho uma música aleatória.
Tobias sempre adorou o fato de que seus avós tinham praticamente uma pequena floresta particular. A propriedade murada tinha cerca de cem metros quadrados; a casa ficava lá nos fundos, quase no limite do terreno, enquanto toda a parte da frente era preenchida com árvores frutíferas, flores e plantas ornamentais. O bosque era cortado bem no meio por uma larga estrada de tijolos hexagonais, que era larga o suficiente para um carro passar por ela sem problemas. Quando havia chegado alí, o bosque não passava de uma confusão de ervas daninhas, espinhos e trepadeiras que estavam sufocando todas as árvores, mas durante praticamente todo os dias o rapaz tirava um tempinho para cuidar do jardim, fazendo-o voltar a ser bonito gradativamente. Ele não conseguia ter todos os cuidados que seus avós tinham, mas pelo menos não haviam mais ervas daninhas e nem galhos que precisavam ser podados.
O casarão dos seus avós era uma enorme construção de três andares, completamente imponente contra o pequeno bosque que o cercava. John, um dos seus poucos amigos, dizia que aquele lugar era o verdadeiro significado de casa m*l assombrada, completamente pintada de preto, e que só faltava gárgulas no telhado para complementar o visual assustador. Tobias sempre ria e revirava os olhos quando ele falava isso, porque apesar da construção ser bem antiga e até vista como "fora de época", ela lhe trazia certo conforto, porque foi alí que ele passou os melhores momentos da sua infância.
Haviam folhas secas espalhadas por todos os lados, e isso fez Tobby fazer uma nota mental para varrer o quintal no fim de semana, embora fosse completamente inútil e as folhas voltassem à cair pouco tempo depois. Ele cruzou a pequena estrada em pouco tempo, antes de deixar sua bicicleta encostada em uma das colunas do hall da casa e subir os degraus que levavam até a porta. Haviam duas poltronas no hall da casa, que ele havia comprado de segunda mão por um preço bastante abaixo do mercado, mas que se arrependeu logo em seguida porque elas eram um pouco assustadoras, e assim como John costumava dizer, elas pareciam aquelas poltronas onde pessoas eram assassinadas ou velhinhos acabavam tendo um infarto enquanto estavam sentados nelas.
Tobby revirou os olhos para os pensamentos intrusivos e abriu a porta, que estava apenas encostada. Aquela porta foi a primeira coisa que ele trocou quando se mudou para lá, então as fechaduras sequer rangiam quando ela era aberta ou fechada, assim como as das janelas e a da porta da cozinha.
A primeira sala do casarão era um cômodo imenso, que Tobby estava tentando mobiliar aos poucos, comprando coisas vez ou outra para colocar alí. Os sofás bonitos e a TV que havia presa na parede eram definitivamente as coisas mais caras que ele tinha no cômodo, e que haviam sido parceladas em doze vezes no seu cartão de crédito, isso depois do rapaz passar um dia inteiro visitando diferentes lojas para saber onde poderia comprar os móveis mais baratos. Havia também um carpete felpudo cinza no chão, ele também havia sido comprado de segunda mão em um bazar, então foi bastante barato também.
Tobby descobriu que o sótão estava repleto de móveis antigos e centenas de outras coisas (além de duzentos quilos de pó e teias de aranha, escorpiões e até cobras se duvidar). A maioria das coisas já não prestava mais e ficaram ali durante décadas, mas haviam algumas poucas coisas que ainda poderiam ser usadas, como mesinha de vidro que ele encontrou lá em cima, a trouxe para o primeiro andar e a colocou entre os dois sofás. Ela estava bastante arranhada, mas bastou lava-la direitinho e colocar uma toalha de mesa (também de segunda mão) por cima para ela ficar novinha em folha. O rapaz costumava usa-la para colocar o seu computador enquanto estava esparramado no sofá.
O jovem começou a desabotoar aquela camisa de palhaço enquanto caminhava em direção às escadas que levavam para o segundo andar. Ela era feita de uma madeira escura e envernizada, fazendo qualquer cupim que ousasse chegar perto dela ficasse só na vontade mesmo. O som dos passos de Tobby ecoaram pela casa silenciosa enquanto ele subia os degraus de forma tranquila, já totalmente livre da camisa assim que chegou no topo da escada.
O segundo andar tinha seis quartos, embora cinco deles estivessem trancados e completamente vazios (incluindo aquele em que seus avós dormiam). Todo o papel de parede do segundo andar havia sido trocado para deixar o andar um pouco mais jovial, então agora as paredes exibiam um belo tom de bege, não muito diferente do que havia na cafeteria.
Tobby caminhou até o seu quarto enquanto tirava o celular do bolso do Jeans surrado, checando as mensagens. Ele não conhecia muitas pessoas ali na cidade, exceto por alguns vizinhos e meia dúzia de amigos. A primeira mensagem era de Jackson, um amigo/ficante que Tobby conhecia à uns bons três anos. Os dois se davam bem, mas não tinham um tipo de relação que envolvia ficar de conversinha o tempo todo. Na verdade haviam tempos em que eles passavam de semanas sem trocar mensagens, não que isso afetasse de alguma forma a amizade entre eles.
Tobby resolveu que iria responder depois, então checou as próximas mensagens. como sempre, John, seu melhor amigo, havia mandado meia dúzia delas. Ele vivia no Colorado, mas estava ali praticamente todo fim de semana, já que eram apenas algumas horas de viagem. O rapaz respondeu rapidamente o seu amigo e enfiou o celular de volta no bolso, entrando no seu quarto e jogando a camisa quadriculada em cima da cama logo em seguida.
O cômodo era definitivamente o mais aconchegante de toda a gigantesca casa. A cama de Tobby era uma kingsize alta e larga, que ele havia comprado na Black Friday de três anos atrás e também dividido em duzentas vezes no seu cartão de crédito. Ela estava coberta por um edredom azul marinho e tinha três travesseiros fofinhos em cima dela. Havia um carpete felpudo no chão e um belo guarda-roupas logo ao lado da cama. Tanto o carpete quanto o guarda-roupas não haviam sido comprados, pois foram umas das poucas coisas do antigo apartamento que Tobby não vendeu. Ele havia pedido John para colocar algumas coisas importantes na sua caminhonete e levar até alí (não houve tempo de levar todos os móveis porquê o dono do apartamento que seus pais moravam praticamente o expulsou, pois seus pais já estavam devendo praticamente meio ano de aluguel, então a única escolha de Tobby foi carregar tudo que podia e vender todo o resto para quem quisesse comprar).
O quarto também tinha uma pequena escrivaninha e prateleiras repletas de livros logo acima da cama, Além de ter um próprio banheiro. Mas o que fez o rapaz querer ficar com aquele quarto e não com qualquer outro do casarão foi porque aquele em específico tinha uma deslumbrante sacada circular. O quarto não possuía simples janelas, mas sim uma parede quase inteira de vidro, que possuía uma portinha que levava para a sacada circular do outro lado, que ficava exatamente em cima do hall do primeiro andar. Dormir sob a luz da lua e das estrelas era simplesmente magnífico, além de que durante o dia, a luz solar seria aproveitada ao máximo possível (a parede possuía cortinas azuis, então caso a claridade fosse excessiva, bastava fecha-las). Tobby dava graças a Deus por aquela vidraça não estar quebrada, assim como algumas das janelas dos outros quartos estavam, pois era absurdamente caro para trocar aquilo tudo.
O rapaz abriu a pequena porta de vidro e caminhou para a sacada circular (cujo às bordas eram protegidas por murinhos de concreto). Dali de cima Tobias poderia observar os prédios da cidade e o sol se por atrás deles, iluminando as copas das árvores do seu pequeno bosque particular com cores quentes. A visão era absurdamente linda, e ele nunca iria se cansar daquilo. Ele ficou ali por mais alguns minutos, deixando a sua pele absorver os deliciosos raios de sol, com os olhos levemente fechados, pois a luz era bastante intensa, antes de resolver voltar para o quarto e tomar um belo banho.
Tobby retirou os velhos all stars e a calça surrada, ficando apenas de cueca. O rapaz adorava morar sozinho porque assim ele poderia passar o dinheiro inteirinho sem excesso de roupas, e como a propriedade era murada, sua privacidade estava absurdamente protegida. As vezes ele até ia andar pelo bosque só de cueca, procurando maçãs e pêras maduras. John gastava de dizer que só havia um motivo para os espíritos do lugar não terem se manifestado ainda: Eles deveriam estar horrorizados com aquele rapaz magrelo rondando as redondezas só de cueca. Tobby sempre ria das piadas sem graça do seu amigo, que parecia aqueles coadjuvantes medrosos de filmes de terror.
Tobias pegou o seu celular e colocou uma playlist aleatória no Spotify, apenas porque ele não gostava do silêncio sobrenatural que a casa tinha durante a maior parte do tempo. Enquanto "poker face" da lady gaga começava a tocar, o rapaz pegou uma toalha no guarda-roupas e começou a andar até a porta do banheiro, pretendendo passar um bom tempo debaixo da água quentinha do chuveiro, para assim tirar o cheiro de café que estava praticamente impregnado na sua pele e o leve cansaço que assolava os seus músculos por ter passado o dia inteiro em pé.