Capítulo II

776 Words
Capítulo II (Loren Casterra) Desde que Marie morreu, eu parei de rezar. Não conseguia mais fazer parte de toda aquela hipocrisia. As irmãs pregavam que devíamos preencher nossos corações com o amor e nos abster do pecado, que devíamos perdoar para sermos perdoados, no entanto não pensaram duas vezes antes de entregarem Marie aos elfos. "nós a perdoamos, mas ela precisa ser purificada pelas chamas da justiça, para que sua alma alcance o descanso eterno" – Foi o que a irmã Ursulina falou enquanto eu esperneava, tomada pela loucura. Não existe perdão no meu coração, nem para as irmãs, nem para a abadessa. Elas são as pecadoras de almas sujas. Quando a ira divina descer sobre a terra, espero que recebam suas punições. Meus joelhos estão dormentes e minha alma vazia, nunca desejei tanto que a abadessa viajasse como desejo agora. Eu m*l consigo respirar, sufocada pela ansiedade que me aperta. "se o senhor existe e ainda me houve, eu lhe imploro, me dê uma chance de fugir" – eu me peguei rezando após estar horas ajoelhada na madrugada da vigília. Despertei ainda ajoelhada no salão de oração, com o barulho dos sinos em meia a madrugada. Algumas irmãs, estavam em prantos. - O que houve? – Perguntei ficando de pé, em um pulo desajeitado por causa das câimbras, com o coração apertado de pavor, mesmo sem saber o motivo do alvoroço. - Contenha-se irmã Ursulina, não podemos lamentar a decisão divina. Isso é blasfêmia! – A irmã Carlota falou com o semblante duro, em um tom frio e autoritário. - Quem morreu? – Perguntei quase gritando, olhando para as irmãs que tentavam reprimir os choros. - Ninguém morreu! – a irmã Carlota me engoliu com o olhar – Não existe morte para aqueles que andam em santidade! – Ela olhou para as outras irmãs que a fitavam com os semblantes perturbados, transpassados pela dor – A nossa cara e excelentíssima irmã Piedade, era uma rosa perfeita no jardim do sofrimento e da tormenta desta terra impura. Ela finalmente foi agraciada pela colheita do jardineiro fiel, que a levou para a sua glória – a irmã Carlota deu um sorriso satisfeito – Ela se foi sorrindo! Eu disse que as odiava e que não as perdoaria, então por que estava chorando? - Loren! – Lídia, uma noviça me chamou, avisando que a abadessa me aguardava na sala dela. Os corredores estavam frios e pouco iluminados, meus ossos doíam e as pontas dos meus dedos e nariz estavam dormentes. A irmã Piedade era a mais velha do monastério, havia dedicado toda a vida em sua vocação. Era pavoroso pensar que se eu não fizesse nada, teria o mesmo fim que ela. - Não acredito que está chorando! – A abadessa me engoliu com os olhos incrédula. Sua feição fria se refletia através das tímidas chamas da vela sobre a mesa. Ela parecia cansada e bem desperta, como se não houvesse dormido nos últimos dias. - Amanhã iremos para Lapur com o corpo. O sacerdote Luiz era irmão de Piedade e quer se despedir antes do enterro, como ele não pode entrar aqui, teremos que ir até lá – Ela explicou descontente, enquanto meu coração saltava no peito, se enchendo de ansiedade ao vislumbrar uma grande oportunidade, que se desenhava diante de mim – Soldados elfos estão chegando a qualquer momento para nos escoltar – ela me avaliou com atenção – Muito cuidado para não chamar atenção, os elfos são muito sistemáticos e farejam bruxos por toda a parte. Bastou a abadessa falar dos soldados elfos, para toda a minha alegria se abalar, dando lugar a um medo tenebroso, que ameaçou dissolver as carnes de minhas pernas, que lutavam para se manterem firmes por baixo das saias. - Isso garota estúpida, faça essa cara de culpada e será queimada viva antes do velório! – A abadessa apertou minhas bochechas com uma das mãos, tomada de raiva. - Recomponha-se! – falou com desprezo me empurrando para longe – está mais pálida que o cadáver que vamos carregar! Suspirei fundo, ela estava certa, se continuasse com toda aquela covardia, viveria confinada naquele mausoléu eternamente. - Só fiquei surpresa com tudo o que aconteceu! – Engoli o medo e me recompus. - Não saia de perto das garotas. Estarei de olho em você! - Sim senhora! – Concordei como se considerasse a atitude dela normal, porém eu sabia que alguma coisa havia acontecido. A abadessa nunca concordaria em me tirar do monastério, mesmo se todas as irmãs fossem veladas ao mesmo tempo. Algo a estava afligindo e perceber isso me deixou perturbada. Eu nunca a tinha visto tão relutante e buliçosa.  
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