Capítulo 20. Quase pegos

821 Words
O diretor pediu que todos fossem ao pátio logo após o café da manhã. Os alunos foram se agrupando, tensos, trocando olhares discretos. O céu estava coberto por um cinza suave, típico dos fins de semana no internato, e o clima parecia ainda mais pesado por causa do nervosismo coletivo. Eleonora ficou mais ao fundo, ao lado de duas colegas que haviam sido simpáticas com ela desde a chegada. Adrian estava com o próprio grupo, alguns metros à frente, braços cruzados, tentando parecer indiferente… mas ele sabia que o diretor não chamava assembleias à toa. Seus olhos acabaram, inevitavelmente, encontrando os dela por um segundo rápidos, tensos, desviando logo depois. O diretor, um homem baixo, corpulento e de expressão séria, subiu no pequeno tablado improvisado e pigarreou, fazendo com que o burburinho cessasse instantaneamente. — Bom dia, alunos. — Sua voz ecoou firme. — Recebemos ontem à noite um boato de que houve uma… confraternização não autorizada dentro das dependências da escola. Vários alunos engoliram seco. Outros tentaram disfarçar sorrisos nervosos. Eleonora manteve o semblante neutro, mas seus dedos apertavam a barra do casaco. Adrian respirou fundo, olhando para o chão, tentando controlar a expressão para não entregar nada. — Como vocês sabem, festas clandestinas violam completamente as regras do internato, — o diretor continuou. — E colocam todos nós em risco. O silêncio era absoluto. — Estamos investigando, — afirmou ele, colocando as mãos para trás. — Porém, até o momento, não temos provas suficientes para identificar quem participou ou mesmo se a festa realmente ocorreu. Muitos exalaram o ar preso no peito, discretamente. Eleonora relaxou um pouco os ombros. Adrian sentiu seus amigos se mexendo ao lado, aliviados. — Ainda assim, — o diretor completou, levantando um dedo, — quero deixar claro que, se descobrirmos qualquer coisa, haverá consequências sérias. Estão avisados. Ele deu um último olhar severo para a multidão e desceu do tablado. Quando os alunos começaram a se dispersar, o alívio se misturou a sussurros nervosos, risos abafados e comentários como “Ele não tem nada mesmo” ou “Quase que a gente se ferra”. Eleonora passou pelo pátio sem olhar para Adrian, mantendo a postura elegante e tranquila. Mas por dentro, ainda sentia o eco da festa o perfume, as risadas, a provocação, o quase-toque. Adrian, por outro lado, observou-a rapidamente enquanto ela se afastava, o maxilar travado, tentando ignorar a irritação inexplicável que a simples presença dela provocava. Ambos estavam se evitando desde a madrugada… e pelo visto aquele domingo continuaria assim. Mas, no fundo, os dois sabiam: aquilo não iria durar muito. Mais tarde, já perto do final da tarde de domingo, o internato estava silencioso. A maior parte dos alunos descansava, estudava ou apenas matava o tempo pelos corredores. Eleonora caminhava pelo hall principal em direção à biblioteca quando, ao virar a esquina, quase esbarrou em Adrian que saía de uma sala de estudos com dois de seus amigos. Ela respirou fundo, endireitando a postura como sempre fazia quando precisava vestir a máscara de indiferença. — Que coincidência… — murmurou ela, com um sorriso que não chegava aos olhos. — Quase fomos pegos, mas fui salva pelo super herói do internato. Os amigos de Adrian deram discretas risadinhas, esperando a reação dele. Adrian parou, a expressão fechada, encarando Eleonora por um segundo longo demais. — Super herói?— ele rebateu, arqueando a sobrancelha. —Continua engraçadinha né Eleonora, mas no fundo eu sei que só faz isso pra chamar atenção. A forma como disse foi seca, dura mais dura do que qualquer farpa anterior. Os amigos dele pararam de rir na hora. Eleonora piscou, surpresa com a agressividade. — Claro. — ela disse, com um meio sorriso incrédulo. — Porque todo mundo vive para aparecer para você, não é, Adrian? Ele deu um passo à frente, sem perceber que estava fazendo isso. — Eu só disse o óbvio. Você entra num lugar e precisa que todos olhem. Até numa festa proibida. Eleonora sentiu algo quente subir pela garganta, uma mistura de raiva e ferida. Ela ergueu o queixo, elegante mesmo irritada. — Se todos olham quando eu entro, o problema não é meu. Talvez você esteja… incomodado demais com isso. Houve um silêncio curto, intenso. Os olhos de Adrian piscaram rápido, como se a frase tivesse acertado exatamente onde não deveria. Ele respondeu mais ríspido ainda, num tom baixo: — Você se acha demais. É isso que incomoda. Foi rude. c***l. Sem disfarce. Eleonora arregalou minimamente os olhos, mas não deu a ele o prazer de vê-la afetada. Ela apenas respirou fundo, forçando um sorriso frio. — E você leva tudo a sério demais pra sua idade. Deve ser cansativo. Ela se afastou, o som dos saltos ecoando no corredor. Não olhou para trás. Adrian ficou parado onde estava, o peito subindo e descendo rápido, os amigos trocando olhares desconfortáveis ao redor. Ele sabia que tinha passado do limite.
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