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1084 Words
Juliano Algo me intriga em relação a esse casal, ainda mais depois de tudo o que a moça conversou com a Talita. Mas, não é problema meu. Já tenho muitos problemas para pensar nesse momento. Só quero curtir com a minha mulher, pois sinto que estamos voltando a ser como éramos antigamente, a esperança nunca vai morrer. Jantamos conversando sobre tudo e depois resolvemos ir para a cama, mas dessa vez não vai ser para dormir. Quando deitamos percebo que ela está muito cansada e resolvo não a incomodar, só de estar abraçado com ela, já me sinto bem. Adormecemos e acordamos preparando tudo para ir embora, ela está morrendo de saudades dos nossos pequenos e eu também. Não demoramos muito para chegar em São Paulo, logo encontramos nossos pequenos, que nos enchem de perguntas. - Papai, você vai me levar um dia lá no passeio que você foi com a mamãe? – Bruno pergunta agarrado no meu pescoço, não posso esconder o sorriso. - Filho, eu acho que você não ia gostar muito, porque não tem brincadeiras. Mas, o papai vai te levar em um lugar muuuuuito mais legal. O que você acha? Aquele parque de água, que o seu coleguinha Henrique foi. – Falo e ele solta o meu pescoço para olhar para mim, com olhar de euforia. - Sim, papai. Eu vou me comportar, eu prometo. Vamos lá, mas eu não quero tomar sol, aí você fica comigo onde não tem sol, papai. – Estranho suas palavras e vejo que a Talita também se intriga com a ideia do pequeno. - Filho, porque você não quer tomar sol? Sempre gostou. – Talita diz vindo na nossa direção. - Porque, filho? – Apoio a Talita no seu questionamento e vejo que os olhinhos do Bruno se enchem de lágrimas. - Porque eu já tomei muito sol, papai. Aí eu fico muito diferente... – Ele fala envergonhado e sinto o meu sangue subir. - Filho, de onde você tirou isso? Alguém te falou alguma coisa? – Talita o pega do meu colo e senta ao meu lado, para conversarmos os três juntos. - O Vitor da escola disse que eu sou queimado, disse que eu sou marrom e diferente dos outros. Ficam falando que me acharam na rua, no sol. Por isso eu sou assim... – Vejo que a Talita controla a sua raiva e também sinto meu sangue subir. - Bruninho, você tem a cor mais linda do mundo inteiro. Isso de sol, é tudo mentira. As pessoas queriam ser lindas e amadas que nem você, por conta disso inventam essas coisas para você se sentir m*l. – Talita fala e eu assinto. - É verdade, meu filho. Você é lindo demais, sua cor é linda, seus olhos são lindos, tudo em você é lindo. Não dê mais ouvidos para essas crianças m*l-intencionadas, isso não passa de inveja de você. Hoje você é muito novo para entender isso, mas no futuro, você vai entender tudo. – Falo sentindo uma dor que eu jamais pensaria que sentiria. - Tá bom papai, eu sou lindo igual você e a mamãe. – Ele fala dando um sorriso. - Sim, meu amor. Na verdade, você muito mais. – Talita fala beijando sua barriga e o fazendo dar risadas gostosas. Sei que esse assunto não acabou por aqui. Essas crianças podem não ter agido com maldade, mas essa história de “te acharam” não veio de uma criança. Devem ter ouvido dos seus pais e estão reproduzindo falas absurdas. Confesso que o maior episódio de rac1smo que presenciamos foi quando nosso pequeno era bem pequeno, com uma mulher no mercado. Mas, Talita a colocou no lugar dela, até bateu na mulher. Depois disso, foi possível perceber alguns olhares “diferentes”, mas nunca ousaram falar nada. Achei que essa conversa sobre a adoção, ocorreria no futuro, porém vejo que eu e a Talita teremos que nos preparar para esse momento o mais rápido possível, para evitar sofrimento do pequeno. Almoçamos juntos, a pequena Catarina se desenvolve cada dia melhor. Ela e o irmão são muito apegados, tudo o que fazem, tentam fazer juntos. Isso me enche de orgulho. Depois do almoço, eles vão tirar o cochilo de todas as tardes e resolvo conversar com a Talita sobre o que acabou de acontecer. - Amor, acho que precisamos conversar sobre o que o Bruninho nos relatou hoje... - Sim, eu queria falar disso com você. Isso não partiu inteiramente de uma criança e eu quero marcar uma reunião com o corpo docente da escola dele. Não vou permitir que as pessoas tenham atitudes desse tipo com o nosso filho. – Ela fala já ficando nervosa e percebo como isso a afeta. - Você tem razão e eu te apoio, mas acho que precisamos conversar com o Bruno, precisamos agir com sinceridade enquanto ele ainda é uma criança, porque no futuro ele não irá nos perdoar por omitir esses fatos. – Falo já esperando uma negativa da sua parte, mas me surpreendo com a sua resposta. - Você tem razão. Vai doer demais essa conversa, mas ele já entende as coisas e se questiona por “ser diferente” nas características físicas. O quanto antes inserirmos esse assunto, melhor será para o seu psicológico. Mas, vou agendar uma reunião com a diretora da escola. Eu pensei que era algo da minha cabeça, porém eu notei um olhar “intrigado” da mãe desse Vitor, em uma reunião da escola que você não conseguiu ir por causa do trabalho. – Ela fala e eu fico pensativo. - Porque você não me falou nada, Talita? – Tento controlar minha raiva, pois sinto que ela estava omitindo informações da vida do meu filho e isso me revolta. - Porque não era nada concreto, poderia ter sido somente uma impressão minha, mas depois do que ele falou, tudo fez sentido. Fora que, você estava muito distante, nós não estávamos muito bem, não tinha como eu chegar com uma informação que poderia ser equivocada, tudo conspirou contra. Eu respiro fundo, controlando meus instintos. - Tudo bem, mas eu quero saber. A partir de hoje, tudo o que você sentir, ou achar que sentiu, em relação ao nosso filho com qualquer outra pessoa, preciso que você me conte. – Ela concorda. - Amanhã de manhã irei ligar para a escola, agendando uma reunião para o mesmo dia. Você estará disponível? - Sim, qualquer horário. Quero participar. – Falo enquanto desfaço as nossas malas.
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