- Não acredito que você está bebendo de novo! – Helena exclama entrando na cozinha.
- Quer uma? – Heloisa diz se levantando.
- Claro que eu quero! - Helena ri e se senta na cadeira do outro lado da mesa.
- E o Felipe? – Heloisa pergunta entregando uma cerveja para a irmã.
- Já foi pra casa! Ele vai no aniversário do amigo dele.
- E você não vai junto? - pergunta Heloisa se sentando novamente.
- Quero passar um tempinho com vocês! – Helena responde e bebe um gole da cerveja - A menos que não queiram a minha companhia!
- b***a! - Heloisa ri - Claro que a gente quer que você fique!
- Minha irmã te tratou bem enquanto estive fora? – Helena pergunta pra mim.
- Sim, muito bem. - respondo.
- Do que vocês estavam falando antes de eu chegar? - pergunta Helena.
Fico corada e não consigo disfarçar o nervosismo.
- Perguntas pro livro.- Heloisa responde com toda a calma do mundo.
- Mas ela não ia começar na semana que vem? - Helena fica intrigada.
Continuo em silêncio e muito nervosa.
- Era uma curiosidade que pode ser que vá pro livro! - explica Heloisa - Para de ser curiosa, menina!
- Vocês estão muito estranhas, parece que estão escondendo as coisas de mim. - Helena fala e toma outro gole de sua cerveja.
- Momento constrangedor número três! - Heloisa exclama rindo e me fazendo rir também.
- Realmente vocês estão bastante íntimas, já têm até piadinhas internas! - Helena fala - Não vou nem perguntar quais foram os outros dois momentos constrangedores porque tenho medo de saber!
- Para de ser boba, Helena! - Heloisa levanta - Vamos sentar lá fora? Aqui tá calor!
Caminhamos para a varanda enquanto ela me encara e eu tento disfarçar minhas pernas bambas.
Nos sentamos no mesmo sofá de antes e dessa vez a Helena sentou no meio.
- Há quanto tempo você acompanha a gente? - Helena pergunta pra mim.
- Há uns cinco anos, desde o começo da faculdade eu acho. – respondo - Sonho com esse momento há muito tempo.
- E como está sendo pra você realizar isso? - Helena me pergunta, enquanto a Heloisa mexe no próprio cabelo e olha pra mim.
- É o melhor momento da minha vida! Sempre me imaginei aqui, com vocês, bebendo e conversando.
- Na cozinha, você me fez uma pergunta que penso que está na sua cabeça há muito tempo. Você também tem uma pergunta que tenha curiosidade e queira fazer pra Helena? - Heloisa fala.
- Nossa! Não vou nem perguntar o que aconteceu na cozinha, mas a minha curiosidade tá grande! - Helena fala rindo e olhando pra irmã.
- Helena, cala a boca e deixa ela fazer a pergunta! - Heloisa reclama.
- Bom, tem! Claro que tem! Em algumas entrevistas, você diz que não se considera feminista, mesmo defendendo as mesmas pautas que o feminismo. Por que você não se considera feminista?
- Você sempre pega pesado assim nas primeiras perguntas? - pergunta Heloisa rindo e se ajeitando no sofá - Estou começando a ficar com medo do que vai sair desse livro!
- E eu, cada vez mais curiosa pra saber o que aconteceu na cozinha! - exclama Helena.
- E eu, vendo que não terei respostas, porque na cozinha a Heloisa não respondeu o que eu perguntei e a Helena agora também não me respondeu! - digo, fazendo as duas rirem mais.
- A gente pode começar com perguntas mais leves, tipo: quem nasceu primeiro? Quem é a mais organizada? Quem era melhor na escola? - Heloisa diz rindo.
- Podemos, claro que podemos! – respondo - Vou tentar maneirar nas perguntas.
O tempo passa rápido e quando percebemos a noite caiu e o jantar ficou pronto.
Comemos enquanto elas discutem coisas de músicas, coreografias e a agenda. Permaneci calada.
Depois fomos pra cama, pois no dia seguinte sairíamos bem cedo.
Deito e me viro de um lado pro outro. Não consigo dormir pensando nos acontecimentos: estava ali ha dois dias e já havia dividido a cama com a Heloisa, passado por momentos constrangedores e falado sobre beijar mulheres com ela. O que os outros 28 dias me reservavam?
Pensar nisso fez com que eu me sentisse eufórica e agitada, talvez com uma pontada de medo. Não tinha garantia nenhuma sobre os rumos que essa história poderia tomar.
Desisto de dormir e me levanto pra dar uma volta pela varanda. Precisava organizar minha cabeça pra me fixar no trabalho que estava ali para realizar.
Quando saio do quarto com meu bloco de anotações e caneta, bato de frente com Heloisa e derrubo as coisas no chão. Me abaixo e pego as coisas enquanto me desculpo.
Quando me levanto observando seu corpo dos pés à cabeça, fico deslumbrada com a beleza daquela mulher vestida com um short curtíssimo e camiseta larga.
- Perdeu o sono? - ela me pergunta.
Não respondo porque não consigo parar de observar aquelas pernas.
- Melhor fechar a boca! - ela ri - você fica engraçada assim!
Tento me recompor ajeitando os óculos.
- Iria pra varanda organizar minhas anotações dos primeiros dias com vocês! - respondo sem olhar pra ela - E você, perdeu o sono?
- Estava indo na cozinha beber água. - ela diz enquanto tento fixar a atenção em qualquer coisa que não fosse ela - Mas fiquei tentada a te acompanhar até a varanda. À menos que minha presença te atrapalhe.
- Claro que você não atrapalha! - digo ajeitando os óculos novamente.
- Tudo bem com seus óculos? Por que não olha pra mim enquanto fala comigo? - ela diz rindo.
Gaguejo e não formo frase alguma.
Ela solta uma gargalhada e me pega pelo braço. Assim caminhamos até a varanda.
Quando chegamos, sentamos no mesmo sofá de antes e eu começo a anotar algumas coisas.
- Ai, ai! - ela exclama - Me ajuda, entrou uma coisa no meu olho!
- Deixa eu ver! - afasto a mão dela do rosto e me aproximo pra ver – É um cílios que se soltou. - assopro e removo do cantinho do olho dela com o dedo - Prontinho!
- Obrigada! - ela agradece sem se afastar e sem tirar os olhos dos meus.
- Seus olhos são lindos vistos assim de perto. - sussurro.
Nossas peles quase se tocam, meu coração acelera, nossas respirações se misturam e embaçam meus óculos.
- Os seus também são lindos. - ela diz também sussurrando enquanto tira meus óculos - Assim fica melhor.
- Assim eu não consigo te ver. – digo abrindo um sorriso.
- Com os óculos embaçados também não! - ela diz rindo.
A Helena aparece na porta.
- O que vocês estão fazendo? - pergunta ela com cara de sono.
- A Sarah está fazendo umas anotações eu estou atrapalhando! - Heloisa ri, se virando pra irmã.
- Precisa ser tão perto, dona Heloisa? - pergunta Helena de braços cruzados e batendo o pé direito no chão.
- Não enche, Helena! - Heloisa revira os olhos - Você não estava dormindo? Volta pra sua cama e me deixa.
- Não esquece que tem que acordar cedo! Se reclamar amanhã, vou te derrubar da sua cama e te arrastar no chão, mocinha! - ameaça Helena - Boa noite!
Ela volta pra dentro nos deixando sozinhas novamente.
Pego minhas coisas e me levanto.
- Onde você vai? - Heloisa me pergunta.
- Parar de atrapalhar sua noite de sono! – respondo - Vou voltar pra dentro e te deixar dormir.
- Mas eu não quero!
Tento andar, mas sem meus óculos fica difícil e acabo tropeçando.
Começo a rir, fazendo ela rir também.
- Acho que sem seus óculos você não pode ir pra dentro! - ela diz erguendo a mão com meus óculos.
- Parece que não! - rio também me sentando novamente.
Com delicadeza, ela coloca os óculos em mim.
- Prontinho moça! - ela diz.
Nos levantamos e caminhamos juntas até a porta de nossos quartos.
Quando abro a porta, ela pergunta:
- Não ganho nem um beijinho de boa noite?
Meu coração acelera novamente enquanto ando até o outro lado do corredor.
Nos aproximamos e nos encaramos por alguns segundos que pra mim pareciam horas.