Cortando na Raiz

813 Words
A manhã seguinte amanheceu com um peso diferente. O céu cinzento refletia exatamente o que Karen sentia por dentro: o prenúncio de uma tempestade. Ela chegou à empresa antes mesmo da maioria dos funcionários. Estava decidida a descobrir quem estava vazando informações. Alguém ali dentro, alguém próximo, estava minando suas ações por dentro. E ela não podia permitir que isso continuasse. — Heitor — chamou assim que ele apareceu na porta. — Preciso que reveja os acessos ao sistema interno nas últimas três semanas. Filtros por arquivos de contrato, câmeras, qualquer coisa que envolva minha sala ou os arquivos de David. — Você desconfia de alguém? Ela encarou o amigo. — Neste momento, desconfio de todos. --- Duas horas depois, Heitor voltou com o olhar sombrio e um dossiê nas mãos. — Karen... você não vai gostar disso. Ela tomou os papéis e começou a ler. A cada linha, seu estômago se revirava. — Não pode ser... Aline? — A assistente pessoal do David. Lembra que você insistiu para ela trabalhar diretamente com você por um tempo, enquanto ele ainda não estava fixo no Brasil? Karen assentiu devagar. — Ela teve acesso a reuniões internas, a contratos, e agora… a registros das câmeras. — Isso significa… — Que ela foi comprada. Ou está envolvida com alguém que quer nos destruir. Karen respirou fundo, lutando para controlar o turbilhão de emoções. — Chame-a. Agora. --- Aline entrou na sala com um sorriso ensaiado. — Karen, pediu para me ver? — Pedi sim. Sente-se. A mulher obedeceu, cruzando as pernas com calma. — Pode me explicar por que seu login foi usado para acessar arquivos restritos durante a madrugada de sábado? Aline piscou devagar. O sorriso vacilou. — Não sei do que está falando… — Não se dê o trabalho — Karen cortou, firme. — Eu tenho os registros. E se quiser evitar que isso vire um processo criminal, é melhor falar agora. O silêncio que se seguiu foi cortante. — Ele me ofereceu dinheiro… — Aline murmurou. — Disse que era só para copiar algumas pastas, informações sobre a fusão, contratos com fornecedores. Eu não sabia que ia tão longe… — Quem é “ele”? — Thomas Grey. Karen sentiu o sangue gelar. — E por que agora? — Porque ele quer tirar tudo de você. Disse que seu império seria dele. Que você tirou algo precioso dele no passado… Karen cerrou os punhos. Não era só profissional. Era pessoal. — Está dispensada. E, Aline? — Sim? — Advogados entrarão em contato. Reze para que o juiz tenha piedade de você. Porque eu não terei. --- David ficou em silêncio por longos minutos quando soube da traição de Aline. — Eu a conhecia desde os tempos da faculdade. Ela era… confiável. — Não mais — disse Karen. — E você precisa entender uma coisa, David. No nosso mundo, ninguém é confiável o tempo todo. Pessoas se vendem. E quando isso acontece, a queda de quem confiou nelas pode ser irreparável. — Eu quero reparar isso. Karen o olhou, exausta, mas firme. — Você pode. Mas precisa deixar de ser passivo. Precisa agir. David assentiu. — Então me escuta. Quero transferir 40% da minha empresa para a fusão. Mas quero mais que isso. Quero abrir uma nova frente de investimentos com você. Uma holding internacional. Seus contatos no Brasil. Meus contatos em Orlando. E juntos, a gente expulsa Thomas de vez do mercado. Karen arqueou uma sobrancelha. — Uma proposta comercial ousada. E pessoal? David se aproximou. — Quero estar com você. Sem medo. Sem joguinhos. Mas com regras claras. — Regras? — Você é a mulher mais forte que já conheci. E não quero ser o motivo da sua ruína, mas sim da sua ascensão. Ela respirou fundo, avaliando cada palavra. — Tudo bem. Vamos fazer isso. Mas, David, se me quebrar de novo… — Eu não vou. Juro. --- Naquela noite, Karen foi para casa e não conseguiu dormir. Ficou olhando para a cidade através das janelas envidraçadas. Lembrava dos pais, da avó, da garota que foi um dia. Tão sonhadora. Tão ingênua. Agora era uma mulher marcada por lutas. Mas também por conquistas. E pela primeira vez em muito tempo, ela sentia que não estava sozinha. Mesmo em meio à guerra, havia um resquício de paz. --- Na manhã seguinte, um e-mail circulava entre grandes empresários do Brasil e dos Estados Unidos: “Fusão entre Grupo Costa e D.F. Corporation se torna realidade: nasce a Diniz & Foster Global, uma holding de bilhões”. E mais abaixo, uma frase dita por Karen em entrevista: "Não me assusto com escândalos. Me assusto com o silêncio de quem deveria estar lutando ao meu lado." Thomas Grey leu aquilo com ódio. Mas ele ainda tinha uma carta na manga. E Karen estava prestes a descobrir que o jogo sujo estava apenas começando.
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