Na London Tower Bridge havia uma feira sempre que o inverno chegava e o rio congelava. Apesar do aglomerado de pessoas…
Duas crianças brincando no rio Tâmisa congelado, uma menina mais alta que o menino. Gargalhadas ecoavam enquanto rodavam nos seus patins de gelo e apostavam corrida.
A mãe deles uma comerciante do gelo grita:
— Não vão muito longe crianças.
A menina olha para o irmãozinho.
— A mãe disse que não…
O menino mostrou a língua.
— Você é tão mandona, Layla.
Mas o menino ignora o aviso e corre para o meio do rio gelado e onde ninguém ousa ir. A expressão da menina de cinco anos que é mais velha fica pálida. O gelo é mais fino ali.
— Henry! Vem! A mamãe mandou não irmos longe. Vem, maninho. — Ordena ofertando a mão e tentando manter a voz neutra.
Antes que ela continue a falar, o gelo em volta do menininho se racha. Layla patina até o irmão no gelo fino, o empurra para onde é seguro, mas fica no perigo e quando ela vai sair um buraco se abre e a engole.
A mãe na margem percebe e corre pelos gritos do garotinho, mas já é tarde demais.
Layla soca o gelo que se refez com rapidez, mas não consegue abrir e acaba morrendo afogada e congelada.
De longe, a menina que havia acabado de morrer, gritava por alguém, mas ninguém respondia.
...
Assim que Luna se levantou, notou Hadria parado perante ela com um carrinho de comida. Bem havia só um prato lá, tirando a bandeja de cima, não era comida, mas uma carta no prato com o selo da rainha Vitória e um abridor de cartas.
Ainda sonolenta, Luna pegou o abridor, passou pelo selo que era cera de vela vermelha, abriu e tirou um papel de dentro e leu o conteúdo da carta:
Saudações, condessa de Essex e a nova guardiã da serpente que dorme.
A coroa a cumprimenta.
Serei sucinta, pois o meu tempo é escasso como governante dessa grandiosa nação.
Não sei se está ciente, mas seu marido resolvia casos para mim em territórios supostamente inexistentes cuja polícia ou quaisquer outros não ousavam adentrar seja por cinismo, autonegação ou temor. Territórios desconhecidos pela ciência. Com fenômenos além do que nos é conhecido e aceito pela igreja anglicana.
Caso aceite continuar o legado do seu marido e ser minha guardiã do portão do sobrenatural de Essex que mantém a mística serpente que dorme presa, não irei contestar a sua posição de condessa, em troca, a manterei como a minha consultora nesses casos extraordinários que vão além do limiar da mente humana.
Caso não aceite, o que é compreensível dada a juventude e inexperiência, procurarei um candidato apto ao título de investigador sobrenatural e guardião do condado de Essex e do monstro que lá reside desde tempos remotos segundos nossos antepassados.
Todavia, não tema. Mesmo na sua provável recusa, lhe serei benevolente e não a deixarei em miséria. Estará numa boa situação financeira dados os segredos que mantém sobre as atividades hediondas de Crowley, que abusou do poder que lhe cedi, acreditando que era um bom homem.
Se aceitar ser a guardiã de Essex, consequentemente, acaba sendo também a minha ponte para o sobrenatural para resolver esses assuntos além da vida e da morte.
Em suma, agirá corretamente na linha tênue e filosófica dos mistérios entre o céu e a terra.
Se quiser o cargo e fardo, envie-me uma carta e lhe darei através dos meus representantes mais detalhes do caso em específico que agora assola Londres. Caso não, o seu silêncio por dois dias já será uma resposta.
Assinado: A coroa.
— Do que se trata a correspondência com selo real? — Quis saber Hadria.
Luna soltou um suspiro e massageou as têmporas com um bufar dos lábios.
— Um ultimato. — Explicou arisca rindo da carta e a estendo a ele como se dissesse “lê.”. — Basicamente a rainha me colocando contra a parede. Ela me aceita como a condessa se eu me tornar a guardiã do portal de Essex, seja lá o que isso signifique e a sua detetive sobrenatural, por assim dizer. Basicamente quer que eu seja sua consultora em mistérios ocultistas que assolam Londres e ao que parece já há um caso. — Relatou Luna, massageando as têmporas.
— Aceite. — Incentivou o demônio, abaixando a carta após ler. Luna lançou um olhar matador e mirou a perna inútil. — Afinal, você tem um demônio com você. — A recordou do que era. — Eu posso cuidar dessas coisas facilmente e você só precisa sentar e tomar o seu chocolate quente, ir a bailes manter a sua posição de poder até o fim do nosso contrato e fazer o bem enquanto isso como disse que desejava. Isso te aproximaria das sociedades secretas que machucam os mais fracos.
— Pegue um papel e uma pena para mim, Hadria. Vou responder à carta agora. — Respondeu Luna, persuadida.
A boneca se mantinha deitada ao lado de Luna na cama, esta lançou um olhar ao demônio, num pedido mudo para que não aceitasse e colocasse Luna no meio do fogo cruzado. O demônio ignorou o ser na boneca.
Quando Hadria regressou, Luna apoiou o papel na mesinha de refeições que ele deixou e anotou:
Vossa majestade,
Sou uma reles súdita, posicione-me como lhe aprouver no seu tabuleiro. O seu desejo é uma ordem. Sou sua guardiã que se move nas sombras e vossa majestade é a luz da nação. É uma honra servi-la mesmo nas trevas.
Assinado: Sua guardiã do portal entre o céu e a terra, condessa de Essex.
...
Quando dois representantes da rainha surgiram na sala de estar interiorana, havia chá e biscoitos na elegante mesa de pernas curvadas e de pomposa cor dourada. Uma lareira magnífica com gárgulas. Lá fora, pela vidraça, era possível ver o comum cinza, mas agora com flocos de neve voando que ao cair se aglomeravam no chão lá fora, criando um tapete branco na paisagem.
— Bem, eu não esperava alguém tão jovem. — soltou Winston ao ver a menina. O homem corpulento acabou recebendo o chá que o homem que parecia ser o mordomo servia.
— Nem uma cadeirante. — Acrescentou o ruivo magro que aceitou a xícara também e bebericava um chá forte Earl Grey.
Estavam sentados num elegante sofá de estofado vermelho com armação e braços dourados. O tapete persa no chão com desenhos de homens, serpentes e mulheres dançando seminuas.
Luna na cadeira de rodas e com chocolate quente e não chá ao alcance dela. Sabia que era ofensivo ser inglesa e odiar chá. Mas é porque o seu pai a fazia beber chá quente e ela queimou a boca várias vezes e a lembrança tornava qualquer chá amargo por mais doce que fosse.
— A idade ou a deficiência não definem a minha eficiência, senhores. — A voz de Luna ganhou uma ressonância intimidante e a sua amada boneca teve que ficar escondida no escritório. — A rainha mandou que me dessem uma missão, por favor, passem a mensagem dela.
— Bem, aparições fantasmagóricas de uma criança têm assolado o comércio feito no rio Tâmisa na época do inverno. Dizem que ela está à procura do irmão mais novo, mas já tentou afogar duas crianças porque se sente solitária. A rainha gostaria que investigassem isso. Crowley tinha uma propriedade na capital. Você pode se mudar para lá e dar início às investigações. — Sugeriu Winston pegando um biscoito.
Luna apenas avaliou Hadria, parado lá, como se esperasse uma ordem. Ele assentiu com a cabeça.
— Certo. Irei partir essa tarde e começar a investigação. — Aceitou Luna.