Pré-visualização gratuita Um Milagre e um Monstro
Narrado por Maísa Viana
Eu acreditava que nunca mais fosse sorrir.
Não depois de tudo o que vivi, não depois do inferno que me engoliu e cuspiu meus pedaços no asfalto.
Mas ali estava eu, sentada na poltrona branca da clínica, a mão pousada sobre a barriga silenciosa, com o coração batendo tão alto que parecia querer falar por mim.
— Parabéns, senhora Viana. O beta HCG confirmou. A senhora está grávida.
A médica sorriu com calma, mas suas palavras explodiram dentro de mim como fogos silenciosos. Ela havia acabado de mudar minha vida — e nem imaginava.
Não consegui responder. Apenas fechei os olhos enquanto uma lágrima solitária escorria. Era verdade. Tão verdade quanto o acidente que tirou meu marido e meu filho na explosão daquela lancha. Tão real quanto cada madrugada em que gritei sozinha, pedindo uma segunda chance para existir.
E agora ela tinha chegado.
A médica continuou explicando sobre exames, ultrassonografias, vitaminas… mas minha mente já não estava ali. Tudo o que eu ouvia era o som do meu próprio coração. Pela primeira vez em anos, ele parecia inteiro.
Saí da clínica com passos leves, abraçada ao segredo mais precioso da minha vida. A fertilização tinha sido uma esperança quase impossível, uma chance em mil. Contra todas as estatísticas, eu consegui.
Milagre.
Em casa, encostei na porta e deslizei até o chão, sorrindo entre lágrimas. Acariciei meu ventre como se pudesse protegê-lo com as próprias mãos.
— Vai dar certo dessa vez... mamãe tá aqui, meu amor.
Mas, enquanto eu me banhava nessa luz, uma escuridão já crescia em outro canto da cidade.
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— Pode repetir o que acabou de dizer? — a voz de Hero Green cortou o ar como uma lâmina.
O médico travou, pálido, as mãos trêmulas. Ao lado dele, Aline Ferretti, a noiva perfeita de Hero, empalideceu ainda mais.
— Houve uma falha... um erro no cruzamento genético. A amostra utilizada no procedimento não foi a da senhorita Ferretti. Foi a sua, senhor Green. Outra paciente foi inseminada por engano...
O grito de Aline ecoou como uma explosão.
— O quê?! Isso é um escândalo, Hero! Você vai resolver isso agora, ou...
Mas ele não se abalou. Não se virou. Não respondeu. Ficou imóvel, o rosto uma máscara de mármore, os olhos como lâminas afiadas.
— Quem? — perguntou, frio.
— D-desculpe...?
— O nome da mulher — insistiu, a voz baixa. — Agora.
— Isso é sigiloso... — o médico começou, mas não terminou.
Hero sacou a arma do paletó e atirou. Um único disparo, certeiro no peito. O estampido preencheu a sala como um trovão.
Aline gritou, ajoelhando-se coberta pelo sangue do médico.
— O nome — repetiu Hero, indiferente ao caos.
Um segurança entrou apavorado, segurando uma ficha tremida.
— Maísa... Maísa Viana.
Hero pegou o papel, leu com calma e só então se voltou para Aline.
— O casamento está cancelado.
— O quê...? — ela sussurrou, atônita.
Ele se aproximou, a frieza congelando o ar.
— Eu nunca precisei de você. Agora, nem quero mais.
Aline caiu em prantos, mas Hero já lhe virava as costas.
— O casamento acabou, Aline. Mas meu herdeiro, não.
E naquele instante, sem saber, minha vida começava a desmoronar outra vez.
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Na manhã seguinte, eu tomava café quando a campainha tocou. Achei que fosse vizinho, talvez uma entrega. Atendi sem pensar.
E o vi.
O homem mais imponente e perigoso que já cruzou minha porta. Alto, impecavelmente vestido, olhar frio como gelo. Os traços perfeitos contrastavam com a ameaça silenciosa que exalava. Atrás dele, dois homens de preto imóveis como estátuas.
— Maísa Viana? — perguntou, a voz grave.
— S-sim... quem é o senhor?
Ele ergueu um papel da clínica. Reconheci na hora. Meu corpo congelou.
— Precisamos conversar — disse, entrando.
— Ei! Você não pode simplesmente... — tentei impedi-lo, mas ele já atravessava minha sala como se fosse dono dela.
— Você está grávida — afirmou. — E a criança que carrega é minha.
Foi como se o mundo virasse do avesso.
— Como assim sua?! — minha voz saiu trêmula. — Fiz o procedimento legalmente! O doador era anônimo!
— Foi um erro da clínica. A amostra era minha.
— Isso não é problema meu! Eu só queria ser mãe de novo! Esse bebê é meu! — gritei, a garganta apertada.
— É meu filho — decretou. — E eu vim buscar o que é meu.
O ar fugiu dos meus pulmões. Instintivamente, me afastei, protegendo a barriga com os braços.
— Você não vai levar essa criança! Eu já perdi tudo. Esse bebê é a única razão pela qual ainda respiro. Não vai me tirar isso!
Ele se aproximou, lento, ameaçador.
— Então temos um impasse — murmurou. — Porque eu também não vou abrir mão dele.
— Pode tentar o que quiser. Eu vou lutar até o fim.
Ele sorriu torto, sem emoção.
— Não vai precisar lutar. Tenho outra solução.
— O que quer dizer?
— Em três dias, você será minha esposa.
As palavras me atingiram como choque.
— Isso é insano... eu nem sou virgem! — a confissão escapou no pânico.
Ele arqueou uma sobrancelha, indiferente.
— Não me importa. Você gera meu herdeiro. Vai carregar também meu sobrenome.
As lágrimas ameaçaram cair, mas me forcei a manter a postura.
— Você não pode me obrigar.
Ele chegou tão perto que senti o perfume amadeirado, tão frio quanto ele.
— Não se iluda, Maísa. Eu sou Hero Green.
E o que eu quero... eu tomo.