**Capítulo 6**
**Sampaio narrando**
Eu não aguento mais. Socos no ar, com raiva, enquanto pego o celular e mando uma mensagem pro Joca. O Kaue sumiu e isso tá me deixando ainda mais irritado. A culpa pela morte da minha filha tá me consumindo. Minha vida parece um caos, e eu não consigo encontrar sentido em nada. Se eu tivesse largado essa vida como a Alana pedia, talvez a Bárbara e nossa filha ainda estivessem vivas.
Chego na favela por volta das 10h da manhã. A viagem foi longa e exaustiva. Nem paro na boca, subo direto pra casa. Só queria deitar e descansar. Joca me avisou que precisava falar comigo, mas o cansaço me faz ignorar a mensagem dele.
Estaciono o carro, subo, e entro em casa. Ao abrir a porta do meu quarto, sinto um frio na espinha. Lá dentro, vejo uma garota seminua deitada na minha cama. Puxo a coberta com força, e ela acorda assustada, tentando entender a situação.
— Quem é você? — pergunto, sacando a arma e apontando pra ela.
Ela está apenas de calcinha e sutiã, com o cabelo solto, e me olha confusa e amedrontada.
— Ester — ela responde, a voz tremendo — e você?
— Sampaio, dono dessa favela. O que tá fazendo no meu quarto?
— O Joca me colocou em um quarto r**m, com uma cama desconfortável. Achei esse aqui e, como não tinha decoração, pensei que tava vazio.
— O Joca te trouxe aqui? — pergunto, confuso e irritado — Por quê?
— Ele disse que sou o pagamento de uma dívida — ela dá de ombros, ainda deitada, encarando-me com um olhar desafiador.
Coloco minha camiseta, me dou por vencido em minha tentativa de entender a situação, e saio de casa. Desço a favela com a arma na mão, determinado a confrontar o Joca. Encontro ele dormindo na cadeira, com a cabeça reclinada. Dou um golpe com a arma na mesa, acordando-o em um sobressalto.
— O que foi? — ele pergunta, ainda meio grogue.
— Quem é essa Ester e por que ela tava no meu quarto? — eu exijo saber.
— Seu quarto? — ele pergunta, fingindo surpresa.
— Ela disse que é pagamento de uma dívida. Que história é essa, Joca?
— Ela é irmã do JP — ele responde, casualmente.
— Irmã daquele sujeito? Eu não dei ordem pra lidar com ele — falo, irritado — O que tá acontecendo na minha favela?
— Ele entregou ela — Joca explica.
— E desde quando aceitamos mulheres como pagamento? — pergunto, minha frustração evidente.
— Na verdade, é a herança dela — ele diz, calmamente.
— Que herança? Eu quero essa garota fora da minha favela e quero que resolvam a situação com o JP o mais rápido possível.
— Você sabe que não podemos lidar com ele — Joca argumenta.
— Quem manda fazer isso sou eu! Se eu tô mandando lidar com ele e tirar a garota da favela, é porque sei o que tô fazendo — eu afirmo, irritado.
— Se ela sair da favela, provavelmente outro sujeito igual ao JP vai pegá-la e fazer pior — Joca diz, com uma lógica fria — Ela completa 18 anos em alguns meses. Pegamos a herança e ela vaza. Até lá, qualquer outro problema já lidou com o irmão dela e a gente não precisa se envolver.
Eu o encaro, atônito e desapontado com a situação.
**Capítulo 7**
**Sampaio narrando**
Acendo um cigarro e olho para Joca, tentando manter a calma.
— A garota não vai nos causar problemas — ele fala, tentando me convencer.
— O irmão dela já trouxe problemas suficientes, e eu disse que queria ele fora do caminho — eu respondo, frustrado.
— Se resolvermos a situação com o irmão dela, vamos arrumar confusão com o tio deles. É isso que você quer? Começar uma guerra com aquele sujeito? — Joca pergunta, a preocupação clara em sua voz.
— E ter a garota aqui não começaria uma guerra? Ainda mais sendo herdeira? — eu pergunto, sentindo a raiva crescer.
— Pegamos a grana e mandamos ela embora — Joca insiste.
Eu encaro Joca com vontade de confrontá-lo. Ele está ignorando minha decisão e desrespeitando minha autoridade.
Saio da favela e encontro a Alana descendo. Ela me vê, desvia o olhar e continua em frente.
— Alana, espera — eu chamo, mas ela não para.
— O que você quer, Sampaio? — ela pergunta, a frieza evidente em sua voz.
— Quero falar com você — digo.
— A gente não tem mais nada pra conversar. Me deixa em paz — ela responde, sem parar.
— Por favor, você precisa me ouvir — eu imploro.
— Não tenho nada pra falar com você — ela diz, se virando para voltar ao seu salão.
Jogo o cigarro fora e volto pra casa, irritado. Encontro a Ester descendo as escadas. Ela me encara com um olhar desafiador. Puxo a arma da cintura e vou até ela.
— Você vai sair do meu quarto agora — falo com autoridade, e ela me encara de volta.
— Calma aí — ela diz — não sabia que o quarto era seu.
— Seu irmão não é bem-vindo aqui e, se você é irmã daquele sujeito, você é minha inimiga — eu digo, com a voz firme.
— Quer me culpar pelos problemas do meu irmão? Já não basta ter que ficar trancada nessa favela? — ela ironiza.
— Cala a boca, porque aqui quem manda sou eu. Vai dançar conforme a minha música — eu seguro o braço dela e ponho a arma na cabeça dela — Sai do meu quarto, não quero te ver nem ouvir a sua voz.
Ela abre um sorriso que parece mais um desafio.
— Se você continuar assim, eu juro que vou me apaixonar. Gosto de homens que me fazem sentir o perigo — ela diz, com um tom de brincadeira, mas eu sinto a tensão crescer.
— Daqui a pouco, você vai sentir o gosto do perigo de verdade — eu aviso, a raiva tomando conta de mim.
Deixo ela caída na escada e subo pro meu quarto. Jogo todas as coisas dela no corredor, tranco a porta e vou pra sacada. Olho pra fora e vejo a Alana na frente do salão dela, linda como sempre, mas ela não quer nem falar comigo, nem me ver. Tudo que eu queria era que as coisas fossem diferentes e que a gente tivesse a nossa família de volta.