O dia já começou abafado, o céu encoberto por nuvens pesadas, como se até o clima previsse que algo r**m estava prestes a acontecer. Bela caminhava pelo pátio, observando a movimentação dos soldados de Alex. Homens armados, atentos, cada um ocupando um ponto estratégico. A rotina do morro tinha um ritmo próprio, entre tiros esporádicos à distância e sussurros de alerta que corriam rápido como vento.
Bela tentava se misturar, mas sabia que era diferente. As mulheres a olhavam com desconfiança, os homens com malícia. E, acima de tudo, havia ele: Alex, ou A.S., como todos o chamavam. Sempre no comando, sempre observando.
— Não devia andar sozinha. — A voz dele cortou o ar atrás dela, firme e carregada de autoridade.
Bela se virou, surpresa, e o encontrou parado a poucos passos, charuto entre os dedos. — Eu só estava olhando. Não fiz nada de errado.
— Olhar demais é errado. — Ele se aproximou lentamente, os olhos fixos nos dela. — Aqui, até o silêncio pode custar caro.
Ela respirou fundo, tentando não recuar. — Eu não tenho medo.
Alex riu baixo, a voz rouca. — Então deveria. O medo mantém as pessoas vivas.
Um estampido forte ecoou do outro lado do morro. Todos se abaixaram instintivamente. Os homens de Alex ergueram as armas, atentos. Bela congelou, mas sentiu uma mão firme em seu braço: era ele, puxando-a para trás de um muro.
— Abaixa, p***a! — Alex ordenou, os olhos faiscando de raiva. — Quer morrer, é isso?
O coração de Bela disparou, mas não pelo tiro — e sim pela proximidade dele, o corpo forte quase colado ao seu. O cheiro de pólvora misturado ao tabaco a envolvia, sufocante e excitante ao mesmo tempo.
— Eu… eu não sabia de onde vinha. — tentou se justificar, a voz trêmula.
— Não precisa saber. — Ele a encarou, sério. — Só precisa obedecer quando eu mandar.
Houve mais alguns tiros, depois silêncio. Um dos homens se aproximou correndo. — Chefe, era só teste de fogo do lado de lá. Nenhum ataque.
Alex assentiu, mas não largou o braço de Bela. — Da próxima vez, escuta o que eu digo. Aqui, um segundo de dúvida pode acabar com você.
Ela ergueu o queixo, desafiadora. — Eu não sou sua prisioneira.
Ele inclinou a cabeça, um sorriso frio surgindo nos lábios. — Não? — aproximou-se mais, os olhos fixos nela. — Então por que parece que você fica presa toda vez que eu chego perto?
Bela engoliu em seco, mas não respondeu. A tensão entre eles era quase palpável, como faíscas prontas para incendiar.
Mais tarde, no interior da casa, a conversa continuou. Alex se sentou no sofá, espalhando mapas e relatórios de movimentação dos rivais. Bela, curiosa, se aproximou.
— Isso tudo… são territórios? — ela perguntou.
Ele a olhou de lado. — Não devia se meter nisso.
— Mas eu quero entender. — insistiu.
Alex bateu o charuto no cinzeiro e a encarou. — Entender custa caro. Você aguenta pagar o preço?
— Eu já estou pagando, não é? — respondeu, firme.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, apenas analisando-a. Havia algo naquela mulher que desafiava sua lógica. Ela não recuava, não implorava, não tentava fugir. Ficava.
— Você me irrita. — disse por fim. — E, ao mesmo tempo, me intriga.
— A irritação é mútua. — Bela rebateu, cruzando os braços.
Um sorriso lento surgiu nos lábios dele. — Gosto de como você fala comigo. Mas cuidado, Bela. O morro não é lugar pra gente como você.
— E você? — ela perguntou, firme. — Você também não deveria estar aqui, se tivesse escolha.
A pergunta atingiu Alex de surpresa. Por um instante, a máscara fria pareceu rachar, revelando algo mais profundo em seus olhos. Ele desviou o olhar, como se não quisesse admitir nada.
— Eu não tenho escolha. — disse, curto, e se levantou.
Bela o acompanhou com os olhos, sentindo a estranha mistura de medo, atração e compaixão. Sabia que se aproximar demais dele poderia ser sua ruína. Mas algo dentro dela a empurrava para o abismo, sem volta.
A noite caiu pesada no morro. As luzes fracas iluminavam becos e vielas, e o som de motos ecoava à distância. Bela estava no quarto, deitada na cama, mas o sono parecia impossível. Cada vez que fechava os olhos, a imagem de Alex surgia, os olhos intensos, a voz rouca, a proximidade sufocante.
Um barulho na porta a fez se sobressaltar. Ele entrou sem bater, como sempre.
— Você não sabe respeitar privacidade? — ela disse, irritada.
— Aqui não existe privacidade. — ele respondeu, fechando a porta atrás de si. — E você já devia ter aprendido isso.
Bela se levantou, encarando-o. — O que você quer agora?
Ele deu alguns passos, aproximando-se devagar. — Quero entender por que diabos você não tem medo de mim.
Ela arqueou a sobrancelha. — Talvez porque eu já conheci monstros piores.
Alex parou diante dela, analisando cada detalhe do seu rosto. — Eu sou um monstro. — afirmou, sem hesitar.
— Então por que ainda está aqui, falando comigo? — ela retrucou. — Monstros não perdem tempo com presas que não valem nada.
Houve silêncio. O olhar dele queimava, e Bela sentiu o coração acelerar. A tensão entre os dois era quase insuportável.
De repente, um barulho de tiros ecoou do lado de fora. Alex se moveu rápido, indo até a janela. — Fica aqui. — ordenou.
— Eu não vou ficar parada enquanto você se arrisca. — Bela disse, se aproximando.
Ele se virou, os olhos faiscando. — Você não entende! — rosnou. — Lá fora não é brincadeira, Bela! Um erro, um passo errado, e você vira alvo!
— Então me ensina. — ela respondeu, firme. — Me mostra como sobreviver aqui.
Alex a encarou, surpreso pela ousadia. Por um momento, o desejo e a raiva se misturaram em seus olhos. Ele respirou fundo, tentando controlar o impulso de tocá-la.
— Você vai me matar, Bela. — disse por fim, em voz baixa. — Vai me matar de um jeito que nenhum tiro consegue.
Ela sentiu o corpo estremecer, mas não recuou. — Então talvez eu seja mais perigosa que seus inimigos.
Ele sorriu de canto, um sorriso tenso, cheio de sombra e fogo. — Talvez seja.
Os tiros cessaram lá fora, mas a tensão dentro do quarto permaneceu, ainda mais forte. Alex deu meia-volta, indo até a porta, mas antes de sair lançou-lhe um último olhar.
— Se quiser sobreviver aqui, vai ter que aprender duas coisas: obedecer… e me entender. — disse, e saiu, deixando-a sozinha com o coração acelerado.
Bela sabia que aquela proximidade proibida estava crescendo como uma chama. E quando queimasse de verdade, nenhum dos dois sairia ileso.