Capítulos 3 á 5

1289 Words
Alguns momentos não precisam de promessas. Só precisam de entrega. Era sábado. O céu estava limpo, com aquele tom azul que só os dias tranquilos carregam. Gabriel passou na livraria cedo. Dessa vez, não avisou. Apenas apareceu, encostado na porta, com um sorriso meio contido e as mãos no bolso. - Hoje você tem uma folga da livraria - disse ele, em tom de convite. - Quero te levar a um lugar. Clara o olhou surpresa, o coração acelerando de leve. - E se eu disser que tenho trabalho? - Digo que o mundo não vai acabar se você faltar uma tarde - respondeu ele, com aquele olhar que desarmava tudo nela. Ela pensou por alguns segundos... e aceitou. Gabriel a levou para um lugar que poucas pessoas conheciam - um mirante escondido, afastado da cidade, onde ele costumava fotografar o pôr do sol. O caminho foi cheio de conversas leves, risadas tímidas e silêncios que já não eram desconfortáveis. Quando chegaram, o cenário tirou o fôlego de Clara. Era lindo. A natureza se estendia à frente deles, e o sol começava a descer devagar, tingindo o céu de tons alaranjados. - Aqui... - ele disse, sentando-se em uma pedra - é onde eu venho quando o mundo pesa demais. Clara sentou-se ao lado dele, abraçando as pernas. - Está tudo tão calmo aqui - ela sussurrou. Por um tempo, ficaram em silêncio. O vento leve bagunçava os cabelos dela, e Gabriel a observava em detalhes, quase sem perceber. - Posso te contar uma coisa? - ele perguntou, sério. Ela o olhou, sentindo o ar ao redor mudar. - Claro. Ele respirou fundo. - Quando meu pai adoeceu... eu não consegui chegar a tempo de me despedir dele. Eu estava longe demais... ocupado demais. - A voz dele falhou um pouco. - Carrego essa culpa todos os dias. Clara sentiu o peito apertar. Sem pensar muito, ela estendeu a mão e segurou a dele. Foi um gesto simples. Mas cheio de significado. - Você estava tentando ser alguém que ele se orgulharia - disse ela, com sinceridade. - Às vezes... amar também é isso. Errar tentando acertar. Gabriel a olhou como se aquelas palavras tivessem tirado um peso de dentro dele. Foi ali, naquela tarde, naquele lugar escondido, que ele percebeu que Clara era diferente de tudo que já tinha conhecido. Não porque era perfeita. Mas porque enxergava as imperfeições dele... e ficava mesmo assim. Quando o sol se pôs por completo, eles ficaram ali, lado a lado, de mãos dadas. Sem pressa. Sem promessas. Apenas presentes um para o outro. Porque o amor verdadeiro não chega fazendo barulho. Ele se constrói em pequenos gestos. E revela verdades que nem nós mesmos sabíamos carregar. Capítulo 6 Existem instantes que ficam presos na memória para sempre. Como uma fotografia invisível no coração. Os dias seguintes ao passeio no mirante foram diferentes. Clara sentia isso em cada detalhe. Gabriel aparecia mais vezes. Não era invasivo. Era presente do jeito certo. Certa tarde, ele entrou na livraria segurando sua câmera antiga. - Hoje é o dia - disse ele, sorrindo. - Prometi que te fotografaria... e vou cumprir. Clara sentiu o coração disparar. - Aqui? - ela perguntou, rindo nervosa. - Não. Tenho um lugar melhor. Ela, curiosa e entregue ao que sentia, seguiu Gabriel até um jardim escondido, atrás de um prédio antigo. Era um lugar simples, mas cheio de flores, bancos e uma luz natural que deixava tudo mais bonito. - Por que quer tanto me fotografar? - ela perguntou, enquanto ele ajustava a câmera. Ele a olhou com sinceridade. - Porque quero guardar você assim... de verdade. Sem máscaras. No seu jeito mais natural. Ela sorriu, tímida, mas deixou que ele a conduzisse. Gabriel a fotografou enquanto ela mexia em flores, enquanto ela sorria distraída, enquanto ela o olhava sem saber o que dizer. Era um instante bonito demais para ser explicado. Quando ele abaixou a câmera, o silêncio entre eles era confortável e cheio de significados. Mas... foi justamente ali que o passado bateu à porta. O celular de Clara vibrou. Uma mensagem. Ela leu... e o rosto perdeu a cor. Gabriel percebeu na hora. - Está tudo bem? - ele perguntou, preocupado. Ela hesitou. Guardou o celular, respirou fundo. - É... alguém que eu preferia esquecer - respondeu, tentando manter a calma. Ele a olhou, sem pressionar. - Quer me contar? Ela hesitou novamente. - Não agora - sussurrou. - Não quero estragar o momento. Mas dentro dela, tudo já estava desmoronando. Aquela mensagem era de Rafael. O homem que um dia partiu seu coração... e que agora, depois de tanto tempo, parecia querer voltar. E ela sabia que isso podia bagunçar tudo o que estava construindo com Gabriel. Porque o passado dela não era leve. E cedo ou tarde, as verdades que o amor revela... também podem machucar. Capítulo 7 Algumas verdades precisam ser ditas para que o amor possa crescer livre. Clara sabia que não podia adiar. Gabriel a merecia inteira - com suas dores, cicatrizes e verdades. Naquela mesma tarde, depois das fotos, ele a levou até um café mais reservado. Um pequeno lugar acolhedor, de mesas de madeira, livros espalhados e janelas abertas para o pôr do sol. Sentaram-se lado a lado. O silêncio entre eles já não era confortável. Era denso. Ela segurou a xícara com as mãos trêmulas e o olhou nos olhos. - Gabriel... tem algo que você precisa saber sobre mim. Sobre meu passado. Ele apenas assentiu, atento. Não era o tipo de homem que interrompia. Clara respirou fundo e começou. - Há três anos, eu namorei um homem chamado Rafael. Ele era charmoso, inteligente... e me envolveu de um jeito que eu não percebi o quanto estava me perdendo de mim mesma. Ela abaixou o olhar, lembrando dos detalhes que doíam. - No início, ele era perfeito. Mas aos poucos se mostrou possessivo, controlador. Ele me afastou dos meus amigos, da minha família... até que eu só enxergava ele. Quando finalmente percebi que aquilo era abusivo, tentei terminar. Mas não foi fácil. Ele me perseguiu por um tempo... fez ameaças... me deixou marcas invisíveis. Gabriel sentiu o peito apertar. A dor dela era real. E ele entendia mais do que gostaria. - Hoje... ele mandou mensagem - continuou Clara. - Dizendo que está na cidade. E que quer me ver. Ela respirou fundo. - Eu precisava que você soubesse disso. Não quero mentiras entre a gente. Gabriel segurou as mãos dela com firmeza. - Obrigado por confiar em mim. - A voz dele era firme, mas doce. - Eu estou aqui. Não vou a lugar nenhum. Os olhos de Clara se encheram de lágrimas. Não era piedade o que ele tinha nos olhos. Era respeito. Era cuidado. E naquele instante, ela soube que ele era diferente. Parte 2 - Quem era Rafael? Rafael Montenegro - empresário conhecido, dono de uma agência de marketing em outra cidade. Bonito, influente, e com um ego maior que a própria ambição. Na frente dos outros, era o homem perfeito. Mas quem realmente o conhecia, sabia que ele manipulava, controlava e usava as pessoas como peças em um jogo. Ele não aceitava perder. Muito menos ser esquecido. Foi assim que o relacionamento com Clara desabou - quando ela começou a perceber que estava sendo sufocada. Ele não a deixava sair sem avisar, implicava com as roupas que ela usava, criticava os amigos dela. Quando ela finalmente criou coragem para terminar, ele tentou convencê-la de que ninguém mais a aceitaria. Quando ela resistiu... ele ameaçou destruir tudo o que ela amava. Ela fugiu. Mudou de cidade. Começou do zero. Mas agora... ele estava de volta. E ninguém sabia o que Rafael queria dessa vez.
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