O feitiço a que Cole havia sido exposto era difícil de executar, mas de fácil remoção. Com a ajuda de Laila, consegui que o menino ficasse livre do encanto em poucos minutos, o que fez com que o nosso regresso a Cyon acontecesse ainda nesse mesmo dia.
Cavalgávamos há cinco dias, sendo muito mais rápidos na viagem do que anteriormente, estando já perto do palácio, que nos levaria algumas horas a alcançar, quando Eliot e eu estremecemos em simultâneo ao sentir a barreira quebrar. Incitando os cavalos, começamos a murmurar o feitiço devido para a defesa do reino, embora não fossemos bem-sucedidos pois algo, ou alguém, bloqueava-nos.
- Quer dizer que ele conseguiu entrar? – Os gritos de Laila chegavam-me aos ouvidos quase num sussurro devido ao vento.
- É o único inimigo que temos – gritei em resposta. – Os gémeos já conseguiram quebrar a barreira mais do que uma vez, embora nunca tenhamos descoberto como o fizeram, e conseguiam-se materializar para o castelo. Esperemos que o Dylan não tenha aprendido esse truque.
Ao chegarmos a casa percebemos imediatamente que os estragos haviam sido enormes. Sem tempo para dar a volta e chegar aos estábulos, corri pela entrada principal, que dava acesso ao hall, dando de caras com uma cena de batalha.
- Mãe! – Corri em direcção a Aurora, que recebia energia curativa de Gisele, enquanto tentava não prestar atenção à destruição do lugar e ao verdadeiro caos que as pessoas que corriam de um lado para o outro aparentavam. – O que aconteceu?
- Fomos atacados de surpresa – começou a aia. – A parede que dá acesso à sala do trono foi destruída com um único impacto, pelo que os guardas não tiveram sequer tempo de chamar reforços.
- Foi o Dylan?
- Sim Majestade. – Vi Eliot correr para outra divisão, completamente branco, enquanto Laila se mantinha imóvel. - Quando Sua Alteza percebeu o que se passava mandou os seus pais levarem a princesa Melody e veio para aqui o mais depressa possível. As senhoras Jennifer e Holly também os acompanharam com os seus filhos, assim como as outras mães e respectivos descendentes.
- Emily…
- Não te esforces – adiantei, vendo a minha mãe recuperar os sentidos. – Deixa-me tratar disto Gisele. - A aia retirou as mãos do peito da antiga rainha e eu assumi a sua posição. – O que se passou quando encontraram o Dylan?
- Não tenho a certeza, mas parece-me que a senhora Eileen foi a primeira a vê-lo. Quando aqui cheguei ele estava a atacar a sua mãe, mas m*l a deixou inconsciente foi embora.
- E como está a Eileen?
- Está morta Emily. – As palavras proferidas por Laila deixaram-me sem chão. A minha prima finalmente moveu-se, ajoelhando-se ao meu lado de lágrimas nos olhos. – O Dylan matou-a…
- Não! – Aurora gritou com a informação. – É tudo minha culpa…
- Claro que não é, foi um ataque.
- Não estão a perceber, a culpa é toda minha.
- Claro que não é Alteza, fez o melhor que pôde – disse Gisele.
- Se não fosse eu o Dylan não seria uma ameaça! – O meu ar de surpresa em nada rivalizava com o de Laila. – Foi por o ter nomeado como teu prometido que ele está a agir desta maneira! A culpa é toda minha! – Mesmo não querendo, adormeci a minha mãe com um feitiço simples.
- Ela está em choque com a morte de Eileen, deve ser por isso que está a dizer tal coisa. Pede que a levem para o quarto Gisele, ela precisa de descansar. – A aia prontamente fez o que lhe pedi, deixando-me a sós com Laila. – Como estás?
- Em choque. Tivemos tanto cuidado para que isto não acontecesse…
- Não foi o suficiente, infelizmente. – Suspirei enquanto me erguia. - Tenho de ir ver o Eliot, deve estar devastado, e ainda tenho de refazer a barreira. O melhor é ires descansar um bocado.
- Achas mesmo que consigo? Prefiro ocupar a mente do que ficar sozinha neste momento. Vou entregar o Cole à Elaine e averiguar os danos.
- Muito bem, encontramo-nos mais tarde. – Laila acenou afirmativamente, afastando-se em direcção ao jardim.
Caminhei até uma das salas do rés-do-chão, parando ao ouvir o choro do meu marido. Com o coração apertado, e os olhos rasos, entrei no que parecia uma cena de terror: Eileen jazia inerte no chão com um fio de sangue a escorre-lhe no canto da boca, três das costureiras suas amigas estavam nos cadeirões dispersos pela sala, também elas mortas, e Eliot permanecia perto do corpo da mãe completamente exangue. Aproximei-me dele, sendo enxotada no exacto momento que o ia abraçar.
- Sai daqui – gritou. – A minha mãe está morta e a culpa é tua!
- Eliot estás abalado, deixa-me ficar contigo…
- Não ouviste o que te disse Emily? – O tom de desprezo era evidente na sua voz, o que me fez dar um passo atrás. – A culpa foi tua! Se não fosse o teu plano de ir até Erell nada disto teria acontecido.
- Não podes estar a falar a sério! Como podes dizer isso?
- Nós deixámos o palácio desprotegido! Nem a Aurora o fez para te poder ver quando eras pequena! De quem foi a ideia disso?
- Se a barreira se desfez a culpa não é minha Eliot! E não devíamos estar a discutir neste momento, existem coisas que requerem urgência. – Virei-me e comecei a caminhar para a porta. – Chora o que precisares e quando te acalmares conversamos. Sinto muito pela Eileen, não queria que tal tivesse acontecido. – Sai da sala com lágrimas nos olhos, que depressa limpei à medida que me ia afastando.
Uma vez sozinha, na biblioteca, comecei o feitiço que me permitiria restaurar a barreira e conseguir algum tempo para pensar. Assim que terminei dirigi os meus pensamentos para Laila, que prontamente respondeu ao meu apelo, encontrando-se comigo poucos minutos depois na sala do trono, que estava bastante destruída.
- Como está o Eliot?
- Péssimo – respondi, sem querer alongar o assunto. – Tirando a Eileen encontrei mais três mortos – adiantei.
- Pelo que consegui confirmar faleceram dezoito guardas, cinco aias e um jardineiro, mas não garanto que sejam os únicos.
- Se não fosse o meu maldito plano… - Suspirando, comecei a refazer as paredes da sala, precisando de me concentrar mais do que o habitual.
- O que estás a dizer Emily? Tirando encontrámos o Dylan correu tudo como planeado…
- Então como explicas todos estes mortos?
- Um dos cidadãos de Erell estava sobre o encantamento de quebra. – O meu coração falhou uma batida ao ouvir as palavras da minha prima. – Estava a ser controlado, mas nenhum dos guardas reparou. Pelos vistos o Dylan aperfeiçoou os controladores, fazendo-os ficarem mais realistas.
A sala do trono deixou de existir na minha visão naquele momento, vindo-me à memória a discussão que tivera com Eliot sobre a deslocação do povo de Erell para Cyon:
- Não os podemos deixar assim, é desumano.
- Que sugeres que façamos Eliot? Nada nos garante que amanhã estejamos vivos para ajudar.
- Mesmo que nos aconteça alguma coisa a Aurora vai assumir o controlo do reino até que a Melody tenha idade para se tornar rainha, e penso que ela também não quisesse todas estas pessoas a passarem dificuldades.
- Eu também não quero, mas não estou a ver o que possamos fazer para as ajudar…
- Levamo-las para Cyon.
- Sabes bem o risco que isso acarreta… - O meu marido assentiu, com um ar determinado. – Não acho boa ideia, pelo menos não neste momento.
- Os guardas podem começar a tratar disso antes de partirmos ao encontro do Dylan. Não demoraria muito, Erell não é grande.
- Eliot, sabes bem que não é assim tão fácil. Teríamos de os analisar um a um… E se estiverem encantados?
- Achas mesmo que o Dylan se ia preocupar com isso Emily? Se ele se preocupasse as pessoas não estariam a viver nestas condições. Provavelmente nunca pensou que viríamos aqui. – A tenda não era grande o suficiente para que nos puséssemos de pé, e só por essa razão o meu marido continuava sentado a meu lado, porém cada vez mais nervoso.
- Fazemos como queres então, mas se alguma coisa correr m*l lembra-te que não acho uma boa ideia.
Quando voltei, conscientemente, ao local onde me encontrava, deparei-me com Laila muito preocupada. Ela percebeu imediatamente o que se havia passado, ficando desapontada com aquela atitude de Eliot que nos tinha deixado desprotegidos.
- Agora não há nada que possamos fazer, só podemos tentar parar o Dylan.
- Ajuda-me a fortalecer novamente a barreira, depois tratamos de tomar medidas de segurança e daí teremos tempo para chorar os mortos. – Assentindo, Laila tomou-me o exemplo e sentou-se no chão. Tal como da última vez os nossos corpos elevaram-se enquanto proferíamos o extenso feitiço.
Tentei inteirar-me de todos os estragos ocorridos pela passagem de Dylan nas horas que se seguiram. Laila ajudava-me a traçar um plano de emergência enquanto recebíamos informações sobre o resto do reino, onde nada parecia ter acontecido, e tentávamos visitar todos os feridos. A minha prima já estava exausta quando o sol se começou a pôr, fazendo com que a mandasse ver como Cole estava para a manter ocupada e para que descansasse.
Fui até aos aposentos da minha mãe, pois estava preocupada com o seu estado. Assim que entrei percebi que algo estava errado, pois Gisele falava muito rápido com o médico, que parecia exausto.
- O que se passa?
- Ainda é muito cedo para dizer, majestade, mas parece-me que a sua mãe está em estado de choque.
- Não é para menos…
- Desculpe, não foi o que eu quis dizer. A senhora Aurora está convencida que é a culpada pelo ataque e pelas suas consequências. Neste momento está profundamente adormecida, mas antes estava a debater-se comigo de um modo nada normal.
- A morte da Eileen deve ter sido demais para ela – comentei. – Há algo que possamos fazer?
- Mante-la vigiada e de preferência sem grandes sobressaltos. – Assenti, pedindo a Gisele que o fizesse e que me avisasse caso houvessem alterações no estado da minha mãe. – Já vi grande parte dos feridos majestade, mas ainda faltam alguns mais ligeiros. Assim que acabar voltarei para acordar a senhora Aurora e fazer-lhe mais alguns exames.
- Obrigado. – Já ia a caminho da saída quando me lembrei de Ebony. – Robert, já deve ter examinado a Ebony…
- Ainda não tive oportunidade de o fazer. Ela estava demasiado exausta para que pudesse conversar com ela, e com o ataque ao palácio…
- Claro, a prioridade agora está em ajudar quem necessita. Se acha que a Ebony precisa de descansar assim deve ser.