CAPITULO 3

1218 Words
Prefácio Na atualidade. — Hum… Morena, morena. Queria que fosse a teimosa Maria, e não a tela do meu celular, que visse como brilham nos meus olhos centelhas de raiva misturadas com altas doses de desejo contido. Resultado lógico de passar mais de dois meses brincando de gato e rato com ela. A princípio, esse cabo de guerra me pareceu engraçado e até lógico, depois de como sai há quinze anos atrás. Ela está salva do fato já que a Jamaica é muito longe, caso contrário, eu ficaria feliz em lembrá-la do que nunca esqueci e do que ela insiste em negar. — Preparado? O meu parceiro me pergunta, afastando-me da memória da menina dos meus olhos. — A qualquer hora. Eu respondo, devolvendo-lhe o telefone que ele me emprestou para enviar uma última mensagem para Maria depois que ela bloqueou o meu número. — Hoje você vai dirigir. Eu o aviso e, sem dar tempo para ele aceitar, eu vou para o lado do passageiro do nosso carro de patrulha. Estou muito distraído para entrar no trânsito matinal do centro da cidade. Preciso de mais alguns minutos para pensar, limpar a minha mente e me reagrupar. Mais uma vez, aquela morena de cabelos lisos virou a minha vida de cabeça para baixo e não vou mais deixar que ela me evite. As minhas reivindicações ao retornar a Madri não foram essas. Nem imaginava que Maria ainda vivia na mesma cidade, no mesmo bairro e na mesma casa... A única casa em que me lembro de ter sido plenamente feliz. Por isso, quando o Luis, meu inspetor-chefe, me procurou para me oferecer uma vaga como inspetor da UFAM em Madri, aceitei. Além de ser uma das unidades de maior prestígio na Espanha no combate a todo tipo de abuso contra a mulher, eu precisava voltar a morar aqui. Depois de ver como aquele ser desprezível que tive a infelicidade de ter como pai foi colocado num buraco profundo, me senti libertado. Com ele morto, não havia mais nada para me prender àquela parte de mim que eu queria não ter. No seu túmulo, enquanto sorria para os coveiros que cobriram o seu caixão com uma grossa laje de pedra, dei um suspiro de alívio pela primeira vez em anos, e não apenas eu. O manto de nuvens, que cobria o céu da pequena cidade de Cádis onde morava a minha família, abriu-se deixando passar os raios do sol, que se refletiam nas paredes brancas do cemitério, enchendo de luz esta área sombria. Alcalá del Valle estava em festa. Senti que, com a morte do meu pai, se fez justiça a uma de suas moradoras, minha mãe. Aquele dem*ônio nunca mais machucaria ninguém. E no outro extremo do cemitério, em frente ao túmulo dela, prometi a ela que tentaria ser feliz, não só por mim, mas também por ela. Eu lutaria para desfrutar desse sentimento que aquele bastardo negou a nós dois. Quando fechei os olhos para fazer aquele juramento silencioso, Maria veio à minha mente, como sempre acontecia quando eu descuidadamente deixava quebrar o gelo que cobria o meu coração. Ela aquecia a minha alma. Naquele exato momento, tomei a decisão de me mudar para Madri e, com isso, também queria retomar o contato com ela. A minha intenção nunca foi reatar o nosso relacionamento amoroso. Eu não era burro, sabia que isso era impossível, mas gostei da ideia de tê-la de volta na minha vida. Embora para mim ela nunca tenha ido embora, sempre esteve presente, sempre me acompanhou, principalmente nas minhas noites mais escuras. Juro que era essa a minha única intenção quando tentei localizá-la através das redes sociais e de amigos comuns do bairro, com quem tinha conseguido falar quando cheguei a Madrid. E assim foi até que a vi naquela tarde de fins de abril no churrasco que se comemorava o aniversário do meu inspetor-chefe, no jardim da sua casa. Foi instantâneo. Ainda me lembro de quando olhei estranhamente para a garrafa de cerveja que segurava na mão, tentando ver se estava gelada o suficiente para fazer um arrepio percorrer a minha espinha, me prendendo no lugar. Sem vê-la, eu sabia que ela era minha morena. Os meus olhos vagaram por meus colegas de trabalho recentes até que avistei os seus cabelos neg*ros brilhando como o mais puro ônix. O seu olhar encontrou o meu e eu senti como se cada centímetro que nos separasse fosse uma punhalada mortal. Com um simples movimento dos seus cílios curvos, ela derrubou as paredes de contenção que continham os sentimentos que eu continuava a nutrir por ela. Aí entendi que não queria ser amigo dela, ou melhor, que não seria o suficiente para mim. Eu queria mais, muito mais. Eu queria tudo o que tinha com ela... eu a queria de volta. Levei menos de um segundo para ir ao seu encontro. Eu precisava dela... Quando a vi novamente, ficou claro para mim que Maria era a peça que faltava. Apenas com a sua presença o caos que reinava dentro de mim se acalmou e uma sensação de bem-estar me inundou por completo. Soltei a minha mão da garrafa que segurava sem me importar que caísse na grama. As palmas das minhas mãos coçavam e o único bálsamo que as acalmaria seria o toque da sua pele. No entanto, o seu rosto surpreso transformou-se em pânico quando me aproximei e, pouco antes de alcançá-la, ela se virou e saiu correndo. — Eu estive procurando por você. Sussurrei, colando meus lábios em sua cabeça quando consegui segurá-la em meus braços. Gostei daquele momento, que há tantos anos desejava fazer, mas nos meus sonhos, Maria não tremia como uma folha ou me olhava com olhos cheios de terror. Luis, o meu inspector-chefe, e Sara, sua mulher, interromperam-nos e Maria desapareceu dos meus braços e fugiu com Sara para a casa dela, para nunca mais aparecer. Consideravam Maria parte da família e, ainda estupefato, confessei para ele a história que nos unia e o mais complicado, a forma como terminou. Eu me senti envergonhado. Senti vergonha da minha covardia, do meu egoísmo, do meu abandono... A expressão de preocupação no rosto do meu chefe foi ficando mais acentuada conforme eu avançava na minha história e olhando nos seus olhos, percebi que esses quinze anos separados também foram um inferno para ela. María não me evitou por despeito, mas por dor. Luis se recusou a me contar tudo, ele ficou em silêncio por lealdade à minha morena, mas eu descobriria de qualquer maneira. Eu conseguiria encontrar cada ferida que tivesse meu nome escrito e iria curá-las. Eu ganharia o direito a uma segunda chance. Fiz de tudo para me aproximar dela, e só quando a vi com outro homem é que desisti. Aí, eu me retirei. Eu não faria isso com ela, não depois de como a tratei. Se ela estivesse feliz, eu não iria atrapalhar o relacionamento deles. Fiz isso, mantive a minha palavra, até que aquele mesmo homem que roubou os meus sonhos os devolveu para mim. Agora, eu tinha mão livre para lutar por ela. Não importa quantas vezes ela fugiu de mim. Eu não deixaria ela... Não até que, nos meus braços, ela me dissesse que o seu coração não batia no mesmo ritmo que o meu.
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