Jully tem agido de maneira estranha nas últimas semanas, e suas respostas evasivas em relação ao nosso beijo só aumentaram minha confusão. Eu já tinha perguntado a ela sobre isso, mas ela negou, insistindo que o beijo não significou nada.
– Jura que, para você, o grande Ares Bacelar, o maior galinha que essa cidade já viu, um simples beijo significou tanto? – Sorriu, mas notei sua tensão.
– Se você está dizendo... vamos tomar café da manhã e pedir as peças novas. – Não queria admitir, mas aquilo doeu. – Teremos mais uma corrida no próximo final de semana, correrei no sábado, será apenas bobagem, não vai valer pontos...
– Ares? – Ouço a voz do meu irmão.
– O que está fazendo aqui tão cedo? – Pergunto estreitando os olhos.
Mesmo que eu tenha deixado o livre acesso do meu irmão ao meu apartamento, ele não parece com muita frequência.
Eros intercala o olhar correndo de mim para Jully.
– Vocês dois por acaso são casados e não contaram para a gente? É sério, não tem nenhuma vez que eu venha aqui que eu não te veja Jully... – ela mostra a língua para ele, um hábito dela que eu adoro e que sempre me faz sorrir.
– Não posso fazer nada se ninguém te atura! – Jully sorri. – Como você está, faz tempo que não te vejo.
– Para fechar a sua boca, vou te contar, agora eu tenho uma amiga e ela gosta muito de mim, e odeia meus irmãos... – Olho para ele me perguntando quem seria. – Isso mesmo, alguém que odeia você e Hades.
– E te atura? Isso sim é que é novidade... Quem é a maluca? – Pergunto curioso
– Lyssa, a garota que nós prendemos por engano...
– Vocês prenderam uma mulher por engano? Que história é essa? – Jully sorri. – Vamos, digam logo, quero detalhes!
Eros começa a contar para ela detalhadamente a forma como fomos três completos idiotas, mas então ele chega na parte que nos deixa chocados. Hades Bacelar com ciúmes.
– Como assim Hades estava com ciúmes? – Pergunto sem acreditar. – Você deve ter entendido m*l, sabe muito bem que depois de Alice ele se fechou para o mundo, isso já faz tantos anos...
– Por que acha que vim falar com você? Eu só posso estar ficando louco, Hades se tornou uma pessoa completamente vazia, mas eu juro que vi, estava lá, explicito no seu olhar e na sua atitude, ele estava com ciúmes...
– Só acredito nisso vendo... – revirei os olhos.
– Não sei por que estão tão surpresos, e o que tem de tão errado nisso? – Jully perguntou nos olhando com estranheza. – Qual o problema dele se apaixonar?
– É complicado. – Respondi, sem querer entrar em muitos detalhes.
– Vocês Bacelar é que complicam as coisas, para nós, reles mortais, tudo é muito mais simples, se queremos algo ou alguém apenas batalhamos para isso, mas vocês têm todo um processo de aceitação, desconfiança, receio... fora a quantidade de mulheres que levam para a cama na semana... – ela revira os olhos. – Seria muito mais prático se seguissem seus instintos sabia?
Olho para ela intensamente.
– E por que é que você dificulta as coisas Jully? – Viro a cabeça levemente. – Por que não segue seus instintos?
– Ah... parem de t*****r com os olhos e vão para um quarto! Vocês são nojentos, eu estou quase vomitando meu café da manhã... vou embora, assim vocês se engolem à vontade.
Jully continua a me observar.
– Você deveria ouvir seus próprios conselhos às vezes, sabia Jules? Você é sempre tão inteligente. – Sorrio sarcástico. – Você não acha que precisamos conversar?
Ela se vira para mim, com uma expressão curiosa e cautelosa.
– O que há de errado, Ares? Pensei que já estivéssemos certos de que há uma linha que não devemos atravessar. – Ela diz, olhando-me nos olhos.
– Sobre o que você disse para Eros e eu... sobre seguir nossos instintos. Você realmente acredita nisso? – questiono, com sinceridade.
Jully parece ponderar por um momento antes de responder.
– Acredito que, às vezes, sim. Acho que as pessoas passam muito tempo tentando se encaixar em padrões, quando, na verdade, deveriam seguir o que sentem. Mas claro, isso não significa agir impulsivamente sem pensar nas consequências.
Assinto, é claro que ela pensa mais nas consequências do que eu. Ela tem uma maneira única de enxergar as coisas, e isso sempre me intriga.
– Você disse que eu deveria seguir meus instintos. Talvez você tenha razão, Jully – confesso, olhando-a intensamente. – E, neste momento, meus instintos me dizem que você é muito mais do que apenas a minha amiga.
O olhar de Jully fica mais suave e até um tanto triste.
– Ares, eu... – ela começa, mas hesita.
– Eu sei que as coisas estão complicadas entre nós, mas quero entender o que está acontecendo. Não quero que pense que o beijo foi insignificante para mim, porque não foi. – Falo com sinceridade, revelando um pouco do que sinto.
Jully olha para baixo por um momento, processando minhas palavras. Finalmente, ela ergue os olhos para me encarar.
– Ares, eu também não posso negar que o que aconteceu entre nós foi especial, mas... há muitos mais obstáculos no nosso caminho. – Ela suspira. – Eu não posso simplesmente ignorar as consequências disso. – Ela inspira profundamente. – E eu... eu estou saindo com Nicolas.
As palavras de Jully me atingem como uma facada. Ela está saindo com Nicolas, seu chefe, que eu avisei que não se aproximasse. Uma onda de emoções conflitantes percorre meu interior, misturando-se com a surpresa e uma pontada de ciúmes.
– Nicolas? – minha voz sai mais áspera do que eu pretendia. – Vocês estão juntos?
Jully me olha com uma expressão que parece uma mistura de tristeza e incerteza.
– Não, Ares, não juntos, mas, mas... nos conhecendo melhor. E eu não queria esconder de você.
Sinto um nó se formando em meu estômago e eu não sei como devo reagir.
– Eu entendo – digo, embora a confusão e o desapontamento sejam evidentes em minha voz. – É o que você quer?
Jully parece perceber minha reação e põe a mão no meu braço, com uma expressão de preocupação.
– Ares, eu não quero que isso mude nada entre nós...
Assinto, ainda tentando processar tudo.
– Não se preocupe comigo Jules, se você acha que ele é a pessoa certa para você, que seja. – Travei o maxilar. – Só não deixe que ele machuque seu coração, ou serei obrigado a machucá-lo fisicamente. – Tentei sorrir para ela, mas sei que o máximo que consegui foi uma careta.
– Acho que talvez seja...
– Você não precisa me explicar nada, Jully, você é minha amiga, quero o melhor para você, mesmo que eu saiba que o melhor para você sou eu e que ele nunca vai chegar aos meus pés. – Tento aliviar a tensão, mas falho miseravelmente, tudo o que eu quero é socar a cara daquele i****a por ter se aproximado dela.