Os meses que se seguiram foram marcados por tensão e silêncio dentro da mansão Vestrini. Alessio se lançava em jornadas intermináveis no escritório, tentando reorganizar os relatórios, limpar seu nome diante dos tribunais e manter a empresa respirando com o dinheiro emprestado. Claudette cuidava de manter as aparências, ainda que o círculo social já começasse a sussurrar sobre a queda da família.
Melani continuava a viver como se nada tivesse acontecido. Postava fotografias em cafés parisienses, exibia presentes de homens ricos e enviava cartões ocasionais apenas para lembrar aos pais que ainda existia, embora jamais se dignasse a oferecer ajuda. Cada vez que Alessio recebia notícias da filha mais velha, era como uma facada. Ele se perguntava em que ponto perdera a capacidade de guiá-la, em que momento ela se tornara uma estranha.
Melina, ao contrário, tornava-se ainda mais silenciosa e dedicada. Suas notas na faculdade eram impecáveis, e os professores elogiavam sua disciplina. Mas dentro dela havia um nó constante: a contagem regressiva. Cada prova, cada trabalho entregue, cada semestre concluído a aproximava do momento em que teria de abandonar seus sonhos para assumir um casamento arranjado.
Certa noite, ao chegar em casa após um seminário, encontrou o pai sentado na varanda, o olhar perdido. Aproximou-se, sentou-se ao lado dele e esperou. Alessio demorou alguns minutos para falar.
— Eu sei o que você pensa de mim, Melina. Pensa que sou fraco, que não consegui proteger vocês.
Ela o encarou, surpresa.
— Eu nunca pensei isso, papai. Eu sei que o senhor foi enganado. O erro não foi seu.
Ele suspirou, a expressão pesada.
— Mesmo assim, você paga o preço. É sempre você. Não Melani. Você.
Ela tomou-lhe a mão, apertando-a com doçura.
— O senhor fez o que tinha de fazer para salvar a empresa e os trabalhadores. Se eu tiver de pagar um preço, eu pago. Eu não quero ver o senhor atrás das grades, nem nossa família desonrada.
As lágrimas encheram os olhos de Alessio, mas ele não as deixou cair. Orgulho demais corria em suas veias para permitir que a filha o visse despedaçado.
Em Nova Iorque, Richard Schneider reunia-se com a esposa, Eleanor, e a filha, Cristine. No salão da casa da família, decorado com quadros imponentes e livros raros, ele falava sobre o acordo.
— Já está assinado. Quando Melina concluir a faculdade, ela será esposa de Blade.
Eleanor arqueou as sobrancelhas.
— E você realmente acha que isso vai mudar nosso filho?
— Tenho certeza — respondeu Richard, convicto. — Aquela moça tem algo diferente. Eu percebi desde o primeiro instante em que a conheci. Ela não é como as outras, não olha para o sobrenome, não busca riqueza. Há firmeza no olhar dela.
Cristine, sentada em uma poltrona, recordou-se do encontro. A imagem de Melina ainda lhe vinha à mente: uma jovem simples, mas com uma serenidade rara.
— Eu também achei — disse. — Ela não parece do tipo que se assusta com os excessos de Blade. Talvez seja a única capaz de enfrentá-lo.
Eleanor permaneceu em silêncio. Conhecia bem o filho: ele não aceitava imposições. Ainda assim, sabia que Richard raramente se enganava em julgamentos.
Enquanto isso, Blade seguia sua vida de festas. Em boates luxuosas de Manhattan, era visto com modelos, atrizes e socialites. Sua risada alta, seu olhar magnético e sua fortuna faziam dele presença constante nas colunas sociais. Chamavam-no de “o príncipe rebelde da América”, e ele alimentava a fama.
Mas nos corredores de sua casa, quando as luzes se apagavam e o eco das festas se dissipava, havia um vazio que ele não admitia nem a si mesmo. Entre taças de champanhe e braços femininos, Blade sentia que algo faltava. Não era amor — palavra que ele desprezava —, mas propósito.
Naquela mesma noite em que Alessio e Melina conversavam na varanda, Blade, em Nova Iorque, voltava para casa após uma festa. Atirou a jaqueta de couro sobre o sofá e serviu-se de uísque. Cristine o observava da escada, balançando a cabeça.
— Até quando, Blade? — perguntou, descendo lentamente. — Você não percebe que está se destruindo?
Ele riu, bebendo um gole generoso.
— Eu estou vivendo, Cristine. É isso que você nunca entendeu.
Ela cruzou os braços.
— Papai já tem planos para você.
Blade arqueou uma sobrancelha, intrigado.
— Planos? Que tipo de planos?
— Você vai descobrir logo. — O tom dela era enigmático. — Mas aviso: não são festas.
Ele riu novamente, mas algo na forma como ela falara o fez sentir um arrepio. Não gostava quando o pai tramava em silêncio.
De volta à Itália, Melina passava noites em claro, refletindo sobre seu destino. Em sua mesa de estudos, o diário permanecia aberto. Ela escrevia como forma de aliviar a dor.
"Querido diário, o mundo acha que eu sou apenas a filha obediente, mas por dentro eu grito. Eu não quero ser moeda de troca, mas também não posso ver meu pai arruinado. Se o casamento é o preço, que seja. Só peço a Deus que Blade não seja o homem que as revistas pintam, porque, se for, terei condenado minha vida inteira."
Fechou o caderno com cuidado, apagou a luz e deitou-se. Do lado de fora, a lua iluminava o jardim silencioso. Parecia sussurrar que o destino já estava escrito.
Alessio, em mais uma reunião com Richard, ouviu-o reforçar:
— Não esqueça, Alessio. É sua filha mais velha. É ela quem quero que case com meu filho.
Alessio assentiu, o coração apertado. Cinco minutos separavam suas filhas, mas o abismo entre elas era maior que qualquer relógio pudesse medir. Ele sabia: uma delas nunca aceitaria o fardo. A outra já nascera com ele nos ombros.
Naquele ponto, o contrato estava firmado, a promessa feita, e o destino em movimento. Nem Blade, nem Melina, nem mesmo Melani poderiam imaginar o que esse acordo significaria. Mas, nos olhos cansados de Alessio e na determinação fria de Richard, havia a certeza de que nada mais seria como antes.
O casamento ainda não havia sido marcado, mas a história já estava escrita.