Lua narrando
Assim que cheguei no café cumprimentei a chefe e vesti o avental pardo. Peguei um bloquinho de anotações do bolso, juntamente a uma caneta.
- Bom dia. Bem vindo ao Chocolate Quente Cafeteria, gostaria de fazer seu pedido?
Olhei para o homem a minha frente, ele me encarava, e eu apenas o olhava com um ar de: Eaí? Rola seu pedido, ou não?
Ele sorriu.
E eu estranhei.
- Gostaria de pedir panquecas e um achocolatado.
- Panquecas a moda da casa?
- Por favor.
Assenti. Anotei o pedido e segui para a cozinha onde deixei o pequeno folheto.
- Conhece aquele homem? - Perguntei para Julia.
Julia trabalhava na cozinha e era um boa colega de trabalho. Apontei para o homem.
- Ele vem aqui todos os dias. - disse a garota de olhos puxados.
- Estranho. Não me lembro de servi-lo.
Ela deu de ombros.
- Por que? - completou.
- Não sei. Ele me olhou de um jeito.
Ela me olhou e sorriu. Arqueei a sobrancelha e disse:
- Não começa.
Ela cobriu a boca e deu uma risadinha graciosa. Julia era muito bonita. A pele branca e os cabelos negros, os olhos puxadinhos pela sua descendência. Ela era discreta e meiga.
- Aqui. - disse, dando-me o prato e a xícara.
Coloquei ambos numa bandeja e andei até o homem, deixando o pedido a sua frente, indicando cada um e assim confirmando.
- Obrigado. - agradeceu.
Sorri.
- Pode apertar o botão se precisar de alguém. - pausei. - Volte sempre.
Ele sorriu e eu saí..
Após atender algumas mesas, fiquei de bobeira observando o ambiente e percebi que o homem ainda estava ali. Comecei a prestar atenção na sua aparência, nos cabelos de tom louro escuro, os olhos castanhos, e um sorriso bonito. Eu com certeza não o conhecia.
Mexi com a cabeça negativamente e voltei a atender um cliente que tinha acabado de chegar.
(...)
Horas depois, pude sair daquele lugar e ir tomar um banho. Já em casa, vesti uma roupa de frio e fui para a faculdade.
- Oi, May. - falei.
- Oi, amore. Como foi o serviço?
- Bem, e você? O que fez está tarde?
- Fui comprar uns livros.
Abri mais os olhos e um sorrisinho sem vergonha se instalou em meus lábios.
Ela me olhou sem interesse.
- Sim. - falou, respondendo a minha pergunta implícita.
Abracei-a forte, não deixando minha felicidade escondida.
- Cadê? Cadê? Cadê?
Ela negou sorrindo.
- O que? - falei com carinho de cachorro que caiu do caminhão de mudança.
- Só vai recebê-lo se...
- Se?
- Se sair comigo e com Louis.
- Topo. - falei sem pensar duas vezes. - Onde vamos?
- Fique ciente que receberá só depois.
- Tá.
Sair com meus amigos para ir comer em um restaurante ou um cinema não era um sacrifício. Perguntei novamente onde iríamos.
Ela hesitou um pouco. Aquilo não era bom...
- May?
- Então...
- Então?
Lá vem bomba.
- Ai eu não consigo. Louis!
Louis surgiu de trás de mim e sem fazer qualquer cerimônia disse:
- Vamos a uma balada. Você já disse que topa e eu gravei, tenho provas. - disse ele com o celular dançando em minha frente.
Vi que o aparelho estava no gravador de áudio, e logo que ele iniciou pude ouvir minha voz dizendo "Topo".
Maldição!
Fiz cara de choro.
- Você vai. - falou Maya.
- c****e! - xinguei. - Tá bom. - cedi, visivelmente irritada.
Depois de algumas comemorações dos meus amigos já era hora da aula começar, então me encaminhei para sala de aula e lá fiquei, plantada até a hora da saída.
Assim que a última aula acabou fui para casa, torturando-me ao pensar na balada, era dia de semana, no outro dia eu iria trabalhar cedo. E conhecendo Louis, sairíamos daquele lugar às 2:00 da manhã, na melhor das hipóteses.
Droga.
Estacionei o carro na garagem e travei-o.
Remexi a bolsa em busca das chaves enquanto caminhava até sentir um baque e ver meu corpo inclinado, quase chegando ao chão.
Voltei a realidade quando senti braços fortes me segurando. Escutei a bolsa cair e objetos rolarem. Olhei para o meu "salvador". Era ele.
Não sei o que senti naquele momento.
Talvez fosse perplexidade.
Olhei nos olhos do homem e ele arqueou a sobrancelha sorrindo. Aquele homem era o mesmo que não parava de me olhar no café.
Ele estaria me seguindo?
Percebi que meus braços apertavam seus ombros em busca de um apoio.
Respirei fundo.
Quantos minutos eu havia passado observando-o?
Voltei a minha postura natural e passei a franja para trás da orelha.
- Obrigada. - agradeci.
- De nada. Me chamo Josh. - falou me estendendo a mão.
- Sim, eu me lembro do senhor. Estava no café hoje. - pausei. - Lua.
Apertei sua mão.
- Me desculpe. Eu não estava prestando atenção no caminho. - falei.
- Tudo bem.
Agachei-me e ele também, começando a me ajudar a guardar as coisas na bolsa. Vi a chave no chão e recolhi-a.
- Você mora aqui? - perguntei.
- Filho do síndico. - avisou.
- Ah. Entendi.
Alguns segundos passaram-se.
- Então... Eu tenho que ir. - falei.
- Ok. Ahn... Até mais.
- Até.
Voltei a andar e logo cheguei a portaria.
- Boa noite, senhor Sebastião.
Cumprimentei o porteiro.
- Boa noite, querida.
Sorri e esperei o elevador.
Depois de um tempo a espera, o elevador chegou e rapidamente cheguei no meu andar, que estava escuro como sempre. Ninguém morava naquele andar, apenas eu. Destranquei o apartamento e larguei a bolsa num canto.
Tirei a blusa, a calça e o sapato. Andei até a cozinha e peguei uma colher para comer um pote de doce de amendoim e saí da cozinha.
Passei pela porta e acendi a luz da sala. Senti um movimento atrás de mim. E tive a impressão de ver um vulto. Virei pra trás, acertando um soco no tal vulto, que estava atrás de mim.
- Aí, sua... Sua...
- LOUIS???? - gritei.
- É!
- Oh, meu Deus.
Sentei ele no sofá, após ajudá-lo a se levantar e fui na cozinha em busca de um saco de ervilhas congeladas.
- O QUE ESTAVA FAZENDO AQUI? COMO ENTROU AQUI? - gritei.
- Lembra-se das chaves extras que me deu?
- SIM!
Oh, d***a.
Aproximei-me dele sentando ao seu lado.
- Desculpe. - coloquei a ervilha em seu rosto. - Acho que vai com um olho roxo pra casa.
- Pra casa não. Pra balada.
Apertei o saco de ervilha.
- Ai.
Sorri, satisfeita com a pequena vingança.
- É normal você andar sem roupa ?
Fiz cara de interrogação e olhei meu corpo, esquecendo-me totalmente das peças que havia tirado minutos mais cedo.
Dei um t**a em seu braço.
- Minha casa, minhas regras. Eu deveria ter privacidade.
- Vai se arrumar.
Bufei e fui pro banheiro.