CAPÍTULO 2
Marcos narrando
— Na sua idade, seu pai já tava casado e você tava nascendo — minha tia Patrícia joga logo de cara.
— Tia... tá me chamando de velho na cara dura? — olho pra ela, sem paciência.
— Você já tem 35, Marcos. Fica pegando essas menininha aí no morro... Isso não é vida pra um dono do morro.
Dou uma risada seca e apoio o corpo na cadeira.
— O que o meu p*u tem a ver com o meu comando, tia? Se liga. Uma coisa não tem nada a ver com a outra.
— Seu pai deve tá se remexendo no túmulo. Ele sempre disse que você ia ser um homem de família... igual ele foi.
— Por que sempre eu, hein? — pergunto — Tem o Thiago. Ele pode muito bem fazer isso.
— Você é o mais velho. Trinta e cinco anos nas costas. A vida útil de um dono do morro é, no máximo, quarenta e cinco.
Levanto da mesa, bufando.
— Então ainda tenho dez anos. Quando eu morrer, talvez descubram um monte de filho perdido meu por aí.
— Marcos! Não fala uma coisa dessas! — ela grita, mas eu já tô fora de casa, descendo o beco em direção à boca.
O morro tá daquele jeito. Gente subindo e descendo, moleque correndo, moto acelerando. Entro na boca e dou de cara com uma zona.
— Que p***a é essa?
— Flamengo, pô! — Thiago responde, apontando pra TV.
— Dentro da boca, c*****o?
— Eu ainda acho que tu é corinthiano, seu p*u no cu — Lk provoca.
— Sai fora — respondo, jogando ele pro lado.
— Angel — Mosca fala, já me irritando com esse apelido — tá sabendo do convite que tu recebeu?
— Ainda não falei pra ele — Th completa, e eu me jogo no sofá. Lk me entrega a pipoca.
— Tá ganhando com essa merda? — pergunto.
— Nem um centavo — Mosca responde.
— Filhos da p**a — xingo, me ajeitando. — Que convite?
— Pedro Alcântara — Th fala, baixando o tom.
— O mafioso mexicano? O que ele quer agora?
— Parceria — ele diz.
— Ele quer é espalhar a droga dele aqui dentro. Começa pela Rocinha, daqui a pouco tá em todos os morros.
— Tu devia ir no jantar, ouvir o que o cara tem pra dizer. A gente tá precisando de fornecedor novo — Th argumenta.
— Ele tem razão — Lk apoia.
— Já falei pra parar de me chamar de Angel!
— Ué, foi teu pai que te botou esse nome — ele ri.
— Marcos. Me chama de Marcos!
— Angel... — Th provoca — é teu vulgo.
— c*****o! — levanto de novo, esquentado.
— Vai ou não vai? — Mosca pergunta.
— Diz que eu vou — respondo, ainda bufando.
— Até que enfim. Essas droga que tu anda comprando aí parecem que saíram do cu da vaca — Lk fala, e eu encaro ele sem paciência.
— Eu disse que a gente não devia ter parado de produzir — ele continua.
— Produção dá muito gasto, tempo demais. Melhor comprar pronta. Economiza grana e logística — explico, indo pra mesa. — Agora desliga essa p***a de TV e vai todo mundo trabalhar!
— Tamo indo — Lk responde, puxando os outros.
— Thiago, fica — mando. Ele para e os outros somem morro afora.
— Que foi agora? — ele pergunta.
— Não sei se vou aceitar esse negócio com o mexicano.
— Por quê?
— Se misturar com máfia pode dar r**m com a facção.
— Relaxa — ele responde — se a droga for boa, depois tu oferece pra eles. Oportunidade dessas, barata... ninguém vai recusar.
— Não sei, mano... esse Pedro... e aquele genro dele.
— A filha dele é gostosa — ele solta, do nada.
— Filha? — pergunto.
— Vi uma foto dela com o marido, numa revista de fofoca.
— Cê vive com essas revistas de fofoca, mas pra cuidar do morro não serve. Nem pra arrumar uma mulher e meter um filho, pra tia parar de me encher.
— Relaxa — ele ri. — Posso confirmar tua presença no jantar?
— Pode... Mas não sei se vou fechar negócio.
— Com a facção eu me viro. Tu só vê se a droga é boa. Depois vem arma, e a gente fortalece.
Ele sai, e eu fico ali pensativo. Por curiosidade, puxo o celular, pesquiso a tal filha do Pedro Alcântara. A foto aparece: cheia de joia, maquiagem, pose de madame. Superficial demais... do tipo que deve ter nojo de poeira.
Tiro um print. Só por precaução.