05 - Alice

1175 Words
Alice Narrando Assim que eu pisei no salão, nem esperei direito. Já fui puxando a Simone pro canto, longe das outras meninas, porque o assunto era sério e eu não queria ninguém se metendo. — Tu vai no baile hoje? — perguntei, baixinho. — Vou, né. É o baile de aniversário do Teto. Ele sempre faz mó produção. Chama MC famoso, lota de gente bonita é evento. — Ela deu um sorrisinho como se fosse óbvio. — Então, ele me chamou. Disse que vai me pegar lá no barraco às dez. — soltei, tentando soar natural, mas meu coração tava acelerado só de repetir. Na mesma hora, os olhos dela arregalaram. — Tu tem certeza disso, Alice? — Tenho. Depois que a gente saiu do cachorro-quente, eu tava indo pra casa e ele encostou com a moto, perguntou se eu queria carona. Insistiu, Aceitei, né? Aí ele falou isso. Que ia passar lá às dez pra me levar. Ela olhou pros lados, meio desconfiada, depois voltou o olhar pra mim e abaixou mais o tom de voz. — Então ele quer que você se sente no colo dele. — Quê? Como assim? — perguntei, franzindo a testa. — É assim que esses frente faz, Alice. Quando eles não têm fiel, o que não é o caso dele, eles escolhe uma mina no baile. Bota pra sentar no colo e mostrar que tá com ela. Tipo marcar território, sabe? — Mas, ele tem fiel? — perguntei, já sentindo meus peito apertar, uma aflição batendo. — Então, é isso que eu acho estranho. Porque o Teto tem sim. Não é esposa, tipo casado, mas tem mulher. Tipo namorada, mas séria. Todo mundo lá em cima sabe, a mãe dele vive arrotando por aí, dizendo minha Nora. Nessa hora, senti o sangue gelar. O coração começou a bater mais forte, e não era de emoção. Era uma mistura de raiva, decepção e confusão. — Ele não falou nada disso pra mim. — murmurei. — Claro que não, né. Tu acha que homem desses vai contar? Eles escolhem, falam bonito, prometem um rolê, fazem a mina se sentir especial, mas no final, é só pra mostrar quem manda. — Simone disse, cruzando os braços, séria. Fiquei quieta. Tentei lembrar se em algum momento ele deu algum sinal, se falou de alguém, mas não. Pelo contrário, o jeito que ele me olhou, o sorriso torto, até a carona. Tudo parecia, pessoal. De verdade. — Tu acha que eu não devo ir? — perguntei, sem saber se queria mesmo ouvir a resposta. — Alice, presta atenção. Tu é bonita, esperta, tem futuro. Não se mete em coisa que tu não entende direito. Se ele tem mulher, e tu aparece com ele no baile, vai dar briga. E não é qualquer briga. Essas mina são barra pesada, e tem umas que vão pra cima mesmo. Principalmente se a fiel for daquelas que se acha dona dele. Suspirei fundo. Não sabia o que fazer. Uma parte de mim queria ir, ver qual é, sentir aquele gostinho de perigo. Mas outra parte, tava com medo de arrumar confusão e dar de cara com o Hell. Mas de briga não tenho medo. De boba só tenho a Cara. — E se ele tiver brigado com ela? E se não tiver mais junto? — perguntei, tentando encontrar uma desculpa. — Pode ser, mas tu quer ser a próxima a ser descartada quando ele resolver trocar de novo? — Simone rebateu, direta. Fiquei em silêncio. O salão cheio de conversa, barulho de secador, risada das meninas mas eu só ouvia a confusão dentro da minha cabeça. — Vou pensar. — falei por fim. Simone deu de ombros e voltou pra cadeira dela. Mas eu fiquei ali, parada, com o coração batendo forte e a dúvida crescendo cada vez mais. Talvez aquela carona não fosse só uma carona. Talvez o convite pro baile tivesse outro motivo. E talvez eu tivesse prestes a entrar num jogo que eu nem sabia as regras. E o pior de tudo: eu quero jogar. Passei o dia todo no salão, na correria. Cliente atrás de cliente, uma fila de mulher querendo unha nova pro tal do baile. Eu nem tava pensando mais nisso, sinceramente. Tava tentando focar no trabalho, na lixa, no gel, na ponta da unha, mas no fundo, aquela história do Teto não saía da minha cabeça. Já era fim de tarde quando o silêncio do salão foi quebrado por uns berros lá da rua. Três mulheres chegaram fazendo escândalo. Não dava nem pra chamar de mulher, eram três cabras, cada uma mais metida que a outra, se achando as donas do pedaço. Entraram com salto batendo forte no chão e o nariz empinado como se estivessem desfilando. Uma delas, com cara de nojenta e olhar de superioridade, foi direto falar com a Teresa: — Marquei manutenção. Teresa, tranquila como sempre, apontou pra mim: — Pode sentar ali na mesa da Alice, ela vai fazer para você. A mulher jogou a bolsa na cadeira como se estivesse num trono e sentou revirando os olhos. Puxei a luva e comecei o atendimento, fingindo calma. — Vai querer mudar o formato ou manter o mesmo? — perguntei, formal, do jeitinho que sempre faço. — Claro que não! — respondeu na hora, cheia de marra. — Gosto desse esqueleto bem pontudo. Faz a ponta bem fininha, bem afiada. Levantei o olhar, confusa com a agressividade. — Alguma ocasião especial? — tentei puxar assunto. Ela soltou um sorriso torto, venenoso. — É aniversário do meu marido amanhã. Ele vai dar um baile. E se alguma marmitinha se engraçar pro lado dele, vai sair com a cara retalhada. A forma que ela falou foi como se tivesse me dando um recado direto. A ameaça tava ali, embrulhada no veneno da voz dela. Na hora, olhei pra Simone, que já tava me encarando com os olhos arregalados. Entendi tudo. A mulher do Teto. O coração deu um pulo, mas a raiva veio logo atrás. Não era nem por ele, que eu mäl conhecia, mas pela arrogância dela, pela forma que entrou no salão achando que mandava em mim, falando como se eu fosse uma qualquer. A minha vontade? Era arrancar todas as unhas dela, deixar só o toquinho sangrando. Mas engoli seco. Respirei fundo. Ela me mostrou a inspiração no celular, uma unha cheia de pedraria, com brilho e ponta afiadíssima. Fiz exatamente igual. Caprichei em cada detalhe. Quando terminei, ela ficou toda boba. — Ficou linda! Você até merece uma gorjeta. Sorri com ironia. — Não precisa de gorjeta. Pode passar pra Teresa só o valor da manutenção. Ela saiu toda satisfeita, e eu fiquei com o sangue fervendo. Teto? É Um otärio. Dando em cima de mim, ficou de me buscar e nunca mencionou essa mulher. Mas agora eu sei com quem tô lidando. Só que eu não sou de correr. Vou nesse baile sim. Mas vou sozinha. Vou linda. E vou mostrar como é que se curte. Sem precisar sentar no colo de ninguém.
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