Capítulo Oito — No Olho do Furacão

1923 Words
"Às vezes, o que mais dói não é ser rejeitada por quem amamos, mas perceber que as marcas da indiferença se acumulam dentro de nós, tornando cada novo começo um desafio ainda maior." Victoria Ashford A noite na Empire Nights era um universo à parte, onde tudo parecia mais intenso, brilhante e perigoso do que eu jamais imaginei. Quando aceitei o emprego, sabia que enfrentaria desafios, mas nunca pensei que o maior deles seria lidar com Christopher Davis. Ele era tudo o que diziam: sedutor, seguro, irresistível — e, ao mesmo tempo, inacessível. Desde o início, sua presença me deixava inquieta, como se eu estivesse sempre à beira de um precipício. Naquela noite, tudo mudou. A forma como me abordou no balcão do bar. Desde a noite em que esbarrei nele e derrubei uma taça de vinho em seu terno elegante que custava um ano do salário que ganho aqui, me sinto atraída, puxada para a direção em que ele esteja. Durante os dias em que nos esbarramos na Empire, nos corredores, sentia meu corpo queima a cada aproximação, m cada olhar e trocas de palavras. E foram pouquíssimas palavras, mas o suficiente para incendiar meu juízo e destruir meu bom senso. O convite para acompanhá-lo até a suíte parecia um sonho, mas também um aviso. Eu sabia que não deveria aceitar, mas não consegui resistir. O desejo misturado ao medo me guiou, e acabei me entregando a uma experiência que jamais imaginei viver. Foi intenso, arrebatador, mas também assustador. Eu não sabia se estava pronta para lidar com as consequências. Quando acordei ao lado dele, senti esperança e insegurança. Por um instante, acreditei que poderia haver algo mais ali, que talvez eu não fosse apenas mais uma. Mas logo fui confrontada pela frieza de Christopher. O olhar distante, as palavras cortantes, o tom indiferente. Ele se virou para mim, sem sequer me olhar nos olhos. — Vista-se — ordenou, a voz seca, sem calor. Fiquei imóvel, tentando entender se aquilo era real. — Chris…? Ele não hesitou. — A noite acabou. Não crie ilusões sobre nós, Victória. Tudo não passou de uma troca de prazer. Você me deu o que eu quis e eu te dei o que precisava. Agora pode ir. Senti o rosto arder, os olhos marejados. Recolhi minhas roupas em silêncio, tentando não demonstrar o quanto aquelas palavras me feriram. Saí do quarto com os ombros curvados, como se tentasse me proteger da frieza que ele havia lançado sobre mim. Quando a porta se fechou atrás de mim, senti um vazio que não conhecia. Não era só vergonha — era a velha sensação de rejeição, aquela que minha mãe plantou em mim desde cedo, aquela indiferença do meu pai que sempre me fez sentir invisível. Eu não podia deixar que Christopher percebesse o quanto aquilo me afetou. Eu precisava ser forte. Eu precisava desse emprego. O dia seguinte foi um teste de resistência. Passei por Christopher nos corredores, buscando algum sinal de reconhecimento, mas ele me tratou como se nada tivesse acontecido. Pediu café, deu ordens, ignorou minha presença. Eu me obriguei a agir como profissional, mesmo que por dentro estivesse despedaçada. — Café — disse ele, sem olhar para mim. — Preto e sem açúcar. Assenti, os lábios comprimidos, e desapareci na cozinha. Para ele, eu era apenas uma funcionária, facilmente substituível. Por fora, mantive a postura, mas por dentro, tudo era turbulência. Sentir sua presença era medo de ser invisível, de não ser suficiente, de ser descartada como tantas vezes fui antes. Não era só o emprego que eu temia perder, era a chance de provar para mim mesma que podia ser vista, reconhecida, valorizada. Sobreviver ali era mais do que uma questão financeira; era uma batalha silenciosa contra as marcas de rejeição que carrego desde menina. Cada ordem fria, cada olhar indiferente, fazia minhas inseguranças gritarem, lembrando que, para alguns, eu nunca passaria de um rosto na multidão. Enquanto preparava o café, minha mente fugia para longe dali. O ambiente da Empire Nights era intenso, mas nada comparado à tempestade da minha família. Cresci tentando ser vista por uma mãe que só enxergava a perfeição em Bella, minha irmã mais velha — a filha dourada, sempre perfeita, que fazia questão de me lembrar disso. Eu era a sombra, aquela que precisava se esforçar para existir. Meu pai era indiferente, atravessava a casa como um estranho, só falava para cobrar resultados. O silêncio dele era tão pesado quanto as críticas da minha mãe. Meu irmão Luccas também era invisível, especialmente para minha mãe, que nunca aceitou sua verdade. Às vezes, sentia que éramos dois fantasmas na mesma casa, cada um lutando para sobreviver. Essas marcas de rejeição me acompanham até hoje. Por isso, cada gesto frio de Christopher, cada silêncio, reacende antigas feridas. Preciso desse emprego, mas, mais do que isso, preciso provar para mim mesma que sou capaz de resistir, de ser forte, de não me perder tentando agradar quem nunca vai me enxergar de verdade. No fundo, meu maior medo não é perder o trabalho, mas voltar a ser invisível, ser descartada como tantas vezes fui em casa. Por mais que eu tente me convencer do contrário, ainda busco, desesperadamente, algum sinal de reconhecimento — seja de Christopher, seja de qualquer pessoa que me faça acreditar que tenho valor. No fim do dia, organizei a recepção, arrumei flores, cumpri minhas tarefas. Quando ele me pediu para entregar o almoço em sua suíte, senti um misto de ansiedade e medo. Não sabia como agir, se fingia indiferença ou buscava reconciliação. Mas, acima de tudo, sabia que precisava manter o emprego. Não podia deixar que sentimentos atrapalhassem minha sobrevivência. Quando bati à porta da suíte. Ninguém respondeu, mas eu sabia que ele se encontrava ali. Não o vi sair da Empire e quando ele não estava no escritório, estava na suíte. E eu havia passado pelo escritório e não vi por lá. Bati na porta novamente. Sem resposta. Tentei abri e vou que estava aberta. Entrei, e ouvi o barulho do chuveiro aberto. Deixei a bandeja sobre a mesinha para duas pessoas que havia ali. — Senhor Davis! Trouxe o seu almoço como pediu. Não houve resposta. Algo em mim me impeliu de seguir em direção ao banheiro. Ouvi gemidos. Meu coração acelerou as batidas. Mas eu continuei seguindo, mesmo sabendo do poderia encontrar. Ao me aproximar da porta, que estava aberta, me deparei com Christopher e uma das garçonetes da Empire, sob o chuveiro. Ela de frente para a porta, mão apoiadas no box, enquanto ele a penetrava por trás, com os cabelos dela enrolados em seu punho, puxando-os levemente para trás. Christopher a estocava com força quase violenta, ela gemia alto, ele urrava com o prazer que provocavam um ao outro. Mesmo não tendo nenhum compromisso com ele, sabendo que nada significou o que tivemos para ele. Senti um grande vazio e um aperto em meu peito. Assistir aquela cena me fez reafirmar o quanto fui usada na noite anterior e que não passei de um objeto de prazer para esse homem. Quanto o ouvi gozar durante aquele sexo cru, carnal, visceral. Quase acreditei que o ouvi chamar o meu nome, enquanto urrava de prazer jogando a cabeça para trás. Quanto ele abriu os olhos e olhou em direção a porta me viu ali paralisada, em lágrimas. Seu olhar endureceu. Havia algo obscuro e c***l ali. — Se veio deixar meu almoço, pode deixar aí — disse frio, sem nenhum pudor em saber o que acabei de presenciar. A garçonete me olha envergonhada e abaixa a cabeça. Por um instante, quis dizer algo. Quis perguntar se tudo aquilo era mesmo necessário, se ele precisava ser tão frio. Mas as palavras morreram na garganta. Eu não podia correr riscos. Não podia perder o emprego. Não podia ser humilhada de novo. Saí da suíte com o coração apertado. No corredor, respirei fundo, tentando afastar as lágrimas. Lembrei das vezes em que minha mãe me olhou com desprezo, das vezes em que meu pai fingiu não me ver. A dor era familiar, mas não menos intensa. Eu queria ser vista, queria ser amada, queria ser importante para alguém. Mas, naquele momento, tudo o que eu podia fazer era sobreviver. Por dentro, travava uma batalha entre o desejo de ser vista e o medo de ser dispensada. Christopher Davis era uma tempestade, e eu estava no olho do furacão. Mas, mesmo assim, não podia — e não queria — desistir. No fim do expediente, Sentei no banco do vestiário, cabisbaixa, mexendo nervosamente nas mãos, tentando entender por que eu permitia que alguém tivesse tanto poder sobre minhas emoções. Jade entrou, percebeu meu estado e se aproximou, sentando ao meu lado. — Vic, você está bem? Nem te vi no salão depois do almoço… Parecia que estava fugindo de todo mundo — ela perguntou, a voz cheia de preocupação. Tentei disfarçar, forçando um sorriso. — Só estou cansada, Jade. Foi um dia puxado. Mas Jade me conhece. Ela não se deixou enganar. — Não mente pra mim. Te conheço. Aconteceu alguma coisa com o Sr. Davis? Você ficou estranha depois que saiu da suíte dele. Hesitei, respirei fundo, sentindo os olhos marejarem. — Eu… eu fui levar o almoço pra ele, como pediu. Só que… quando entrei, ele estava com outra. Como se eu não fosse nada. Como se a noite passada não tivesse significado nada pra ele. Jade me abraçou forte. — Ai, Vic… Sinto muito. Ouvi dizer que ele é assim, sabe? Não se apega a ninguém. Mas isso não tem nada a ver com você, não deixa ele te fazer sentir menos. — Eu sei, mas dói. Sei que é ingenuidade da minha parte. Nós m*l nos conhecemos. Eu não tenho o direito de exigir nada dele. Eu permiti e quis que acontecesse. Mas como eu disse, dói porque, por um instante, achei que podia ser diferente. Jade apertou minha mão, firme. — Você é alguém, sim! E é forte. Não deixa esse cara — nem ninguém — te fazer duvidar disso. Você não precisa provar nada pra ninguém, muito menos pra quem não sabe enxergar seu valor. Enxuguei as lágrimas, tentando me recompor. — Eu preciso desse emprego, Jade. Preciso sair de casa, respirar outro ar, me afastar da minha mãe e da Bella. Não posso me dar ao luxo de fraquejar agora. Não posso perder o foco por causa de homem nenhum. — E não vai. Eu estou aqui, tá? Sempre que precisar, pode contar comigo. Amanhã é outro dia. Levanta a cabeça, Vic. Você já sobreviveu a coisa pior. Sorri, ainda triste, mas sentindo o apoio da minha amiga me fortalecer. — Obrigada, Jade. De verdade. Amanhã… amanhã eu recomeço. Quando voltei para casa, olhei meu reflexo no espelho. Vi uma mulher cansada, mas determinada. Eu não podia deixar que Christopher — ou qualquer outra pessoa — definisse meu valor. Eu precisava desse emprego, mas precisava, acima de tudo, me respeitar. Naquela noite, antes de dormir, refleti algo que colocaria em prática: "Não posso controlar o que os outros sentem ou deixam de sentir por mim. Mas posso escolher não me perder tentando agradar quem não sabe reconhecer meu valor. Amanhã, vou levantar a cabeça e seguir em frente. Porque, no fim das contas, sobreviver também é um ato de coragem." E assim, adormeci, com a esperança de que, um dia, eu seria mais do que as marcas que a rejeição deixou em mim. Que, um dia, eu seria suficiente — para mim mesma.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD