Capítulo 2

3775 Words
O salão de bailes estava magnífico. As faixas decorativas azuis e prateadas pendiam delicadamente do teto repleto de lustres, os quais lançavam sua luz sobre todo o aposento. As mesas com toalhas brancas se dispunham em padrões regulares ao redor de um círculo vazio que mais tarde se tornaria a pista de dança. Os vitrais desprovidos de cortina permitiam a todos que víssemos as estrelas do céu noturno de Cannehor. Os competidores entraram rapidamente no salão e os guardas fecharam as portas. Eu sorri e alguns deles observaram o lugar, boquiabertos; outros baixaram os olhos para os pés. No entanto, quando os nobres presentes no baile se curvaram, todos eles seguiram com a reverência. Dei um passo à frente e ergui as mãos. — Boa noite, meus convidados. Por favor, levantem-se — pedi e fui obedecida. Mantive minha voz doce, porém firme. A imagem que passava era a de uma inocente princesa que conversava com ninguém menos que seus pretendentes. — Bem vindos ao castelo. Eu sou Jennifer Heronwood, sua futura rainha. Organizei este baile para que vocês se familiarizem o mais rápido possível com os costumes da corte, pois esta será sua casa pelos próximos dias, e espero que se sintam à v*****e. Para alguns a estadia durará mais do que para outros, mas apenas um de vocês permanecerá aqui após os três meses da competição. E é ao longo dela que terei a oportunidade de conhecê-los. — Percorri os olhos pela multidão e sustentei a atenção que depositavam em mim, analisando cada um daqueles homens e deixando que meu subconsciente os julgasse. — Bom, como tenho certeza de que vocês já sabem como a competição funciona, vamos direto ao que interessa: a diversão. Música, por favor! Voltei-me para a orquestra e imediatamente uma alegre sinfonia começou a ser tocada. A multidão se dissipou. Muitos convidados arranjaram seus pares e correram para a pista de dança, mas alguns retornaram às suas mesas para desfrutar da comida e da bebida. Eu contornei o espaço em que me encontrava e ia cumprimentar um lorde importante quando me esbarrei com alguém. Uma figura vestida de vermelho cortou o meu caminho e se chocou comigo, quase levando a nós duas para o chão. Por sorte, recobrei o equilíbrio e amparei a queda da mulher à minha frente. Ela era mais baixa e magra do que eu e não foi difícil segurá-la. — Ah, Jen! — sobressaltou-se ela, aparentemente me notando ali pela primeira vez. — Desculpe-me, eu não a vi... — Sim, eu percebi — comentei com uma risada. Balancei a cabeça e ajudei-a a arrumar o penteado de seu cabelo ruivo. — Mamãe, ainda não aprendeu a não correr em lugares lotados? Catherine me lançou um olhar emburrado quando conseguiu arrumar a coroa em sua cabeça. Alisou a saia do vestido longo e vermelho enquanto falava: — Você sabe bem que não estava correndo; não sou uma criança. Não me dou bem com os saltos, só isso. — E, ainda assim, a senhora insiste em usá-los... — murmurei, mantendo ainda um sorriso divertido. Cath apontou um dedo para meu rosto e assumiu uma pose imperiosa, que conseguia sustentar mesmo sendo vários centímetros mais baixa do que eu. Atribuí isso às duas décadas que passara no posto de rainha. — Por isso você pode culpar à Emily, aquela criaturinha má e perversa. Ela é como um marechal da moda, tão sábia e autoritária quanto um. Eu sufoquei uma gargalhada quando mamãe suspirou. Emily Smith era a dama de honra e amiga de minha mãe. Ela assumira o cargo quando Íris Listern, a antiga criada de Catherine, se mudou para o lado norte do reino por problemas pessoais. Cath e Emy se tornaram especialmente próximas quando engravidaram juntas; infelizmente, a criada não teve ao seu lado um marido presente, como foi o caso de minha mãe, pois o homem com quem estava prestes a se casar fugiu assim que soube que iria ser pai. No entanto, quando ela deu à luz uma linda menina, não teve de enfrentar a maternidade sozinha, pois Catherine e Jonathan estiveram sempre ao seu lado para apoiá-la. Com isso, a filha de Emily acabou se tornando próxima a mim também: a criada era a mãe de Lily — fato que explicava bem de onde minha amiga havia tirado um pouco daquela sua natureza firme e excessivamente disciplinada. Tal mãe, tal filha... — Bom, de qualquer modo, preciso encontrar seus irmãos — Cath continuou a falar, tirando-me de meus devaneios. Olhou em volta e mordeu o lábio inferior. — Por acaso você não os viu por aí...? — Acho que eu teria notado se dois furacões ruivos tivessem invadido um baile real — falei, com ironia. A aparência de meus irmãos gêmeos era incrivelmente chamativa e parecida com a de minha mãe: cabelos ruivos, pele pálida coberta com sardas, olhos verdes vibrantes, feições mais do que belas que lhes rendiam dezenas de garotas caindo aos seus pés... Era de dar inveja até mesmo em mim. — Está muito piadista hoje, mocinha — minha mãe me repreendeu, lançando-me um olhar com raiva fingida. — Perdão, mamãe. Na verdade, acredito que eles nem mesmo saíram do quarto hoje. Ela saiu resmungando algumas palavras sobre crianças destruidoras de propriedades e me deixou, seguindo seu rumo. Acompanhei-a com o olhar e a vi passar direto por meu pai, seu marido, sem parar para responder ao que ele disse. Suspirando, Jonathan balançou a cabeça e ergueu o olhar em minha direção, como se sentisse que eu o observava. Sorri nervosamente e fui até ele. — Minha princesa... Você está linda, como sempre — começou ele ao me dar um sorriso gentil. — Azul é mesmo a sua cor. Ele estava certo. O vestido azul escuro contrastava com minha pele clara. A saia longa e rodada era adornada com pedrinhas brilhantes da mesma cor de meus olhos, que sumiam ao chegar ao corpete tomara-que-caia. Eu parecia, mais do que nunca, uma princesa. Porém, sabia que seus elogios possuíam segundas intenções. Forcei outro sorriso em resposta e balancei a cabeça. — Se está tentando me bajular para que eu o perdoe, papai, pode parar. John pegou minha mão e me conduziu em meio à multidão. A saia do vestido farfalhou. — Que fique claro que eu não estava mentindo — ele respondeu, franzindo o cenho. Um brilho culpado iluminou seus olhos dourados, os mesmos que eu possuía. — Mas... Não funcionou? Dessa vez, a risada saiu naturalmente. Jonathan continuou a abrir caminho pelos convidados do baile, todos vestidos com roupas caras e formais — até mesmo os competidores, ainda que a maioria deles não fosse parte da nobreza. Um homem — um lorde, creio eu — tentou parar o rei e puxar uma conversa, mas meu pai abanou a mão em resposta e murmurou: — Não agora, senhor Doyle. Vá se divertir um pouco antes de voltar aos negócios, sim? Quando nosso interruptor foi enxotado, papai virou-se novamente para mim com expectativa no olhar. Sorri mais uma vez. — Quis dizer que eu já o desculpei, papai. Não precisa inventar elogios para me conquistar, mas gostaria de saber se também posso ter o seu perdão. — Baixei o olhar e tentei ao máximo esconder minha curiosidade. O assunto do dia anterior com certeza não fora esquecido por mim. — E também apreciaria se você, hã, pudesse me responder algo. Sem mentiras dessa vez, pai, eu mereço saber — acrescentei rapidamente ao ver seu olhar cauteloso. O rei suspirou e finalmente parou de andar. Havíamos cruzado o salão e nos encontrávamos no meio da pista de dança. Jonathan acenou para a orquestra e a sinfonia agitada e alegre cedeu lugar para uma música lenta e emocionante. Fui conduzida em uma valsa por meu pai enquanto cumpríamos a programação do baile. A a******a da pista de dança era nossa responsabilidade. — O que quer saber, Jen? — perguntou John, sem rodeios. Seu olhar repentinamente cansado me disse que ele provavelmente já tinha uma ideia de onde eu queria chegar. Meus pés se moviam lentamente, sincronizados aos seus e ao ritmo da graciosa melodia. Desviei o olhar e mordi o lábio. Quase todos os convidados nos assistiam dançar, e eu podia ver uma pequena fila sendo formada pelos competidores que esperavam sua vez para ter um momento com a princesa. Forcei-me a sorri e a parecer bem humorada naquela noite. Aparência, Jennifer, pensei. Aparência é tudo. Voltei meu foco para nosso assunto. — O que você quis dizer quando falou que as coisas em sua competição não foram fáceis? Vocês... Digo, você e mamãe... — eu comecei a gaguejar, tendo dificuldade para verbalizar meus pensamentos. Parei por um momento para respirar fundo e me forcei a continuar. — Vocês se amavam, certo? — Sim. Meu amor por sua mãe nunca foi algo do qual se duvidar, Jenny. Amar Catherine sempre foi fácil; há algo nela que me atraiu desde o momento em que a vi pela primeira vez. — John se perdeu em memórias por um instante. Seus olhos se desfocaram um pouco, e eu o observei enquanto sorria levemente ao pensar em minha mãe. Isso me fez sorrir também, pois o amor deles sempre me inspirou. Um segundo depois, a felicidade desapareceu de suas feições e o rei se voltou para mim. — Não, encontrar a pessoa certa não foi o que complicou minha competição. — Então o que foi? — indaguei, tomada pela curiosidade. Eu precisava saber, porque, se havia uma pequena chance de a minha competição ser um erro... Não concluí o pensamento. Eu precisava saber. Era isso. — Quando você abre os portões da própria casa para desconhecidos, Jen, é necessário assumir riscos para os quais talvez não esteja preparada — começou Jonathan, cautelosamente. Sua voz era baixa e um tanto vazia. — Na época, eu com certeza não poderia imaginar que aconteceria comigo metade das coisas que realmente aconteceram. Na verdade, ainda não sei se hoje estaria pronto para enfrentar tudo aquilo. A curiosidade me corroía, e o medo começava a surgir conforme eu examinava a expressão de John. — Do que o senhor está falando, papai? Seu olhar se tornou distante conforme Jonathan se perdia em suas lembranças. — O mundo é perigoso, filha. Nada é o que parece ser e, com certeza, nada é tão r**m que não possa ficar pior. Dei um sorriso zombeteiro e balancei a cabeça. — Nós temos um exército inteiro à nossa disposição e, além disso, eu tenho meus poderes. O que seria tão perigoso que não pudesse, de algum modo, ser combatido com nossas forças? Uma sombra passou pelo rosto de meu pai, e ele parou de dançar. Pensei que algo estivesse errado, mas não: a música havia finalmente cessado. Estivera tão compenetrada na conversa que não havia percebido. O rei abriu a boca para me responder, mas nunca teve a chance, pois, assim que se afastou minimamente de mim, outro homem estava pronto para me tomar em seus braços. — Com licença, sua majestade, gostaria de poder ter uma dança com sua filha. Demorei algum tempo para desviar o olhar da expressão perturbada de Jonathan conforme ele se afastava e se livrava dos próprios fantasmas. O que ele teria dito, caso tivesse tido a chance de me responder? Qual teria sido a revelação a escapar de seus lábios daquela vez? Finalmente, o rei piscou e forçou um sorriso para o homem que o havia interrompido. — A dança é sua, senhor. Se me dão licença. Jonathan acenou em despedida para nós e saiu, se perdendo em meio aos convidados. Eu suspirei, sabendo que estava longe de mim poder alcançá-lo novamente para terminar nossa conversa. Obriguei a mim mesma a me focar no cavalheiro à minha frente — que, percebi, era um dos competidores. Em um segundo, meu cérebro se esqueceu dos últimos minutos com o rei conforme eu era conduzida a mais uma dança. Não importava, naquele momento, o que Jonathan teria a dizer sobre seu passado. Aquela era minha vida, e aqueles garotos estavam ali por minha causa. Eu devia minha total atenção a eles. — Boa noite, sua alteza — o homem se curvou galantemente e voltou a envolver minha cintura com seus braços. Ele era forte e possuía um bronzeado que contrastava com seu cabelo loiro-cobre. — Boa noite, senhor...? — interrompi a frase, instigando-o a revelar seu nome. Recebi um sorriso perfeito que revelou covinhas em sua bochecha e fez seus olhos castanhos brilharem. — Adrian Dantte, senhorita. A seu dispor. Eu sorri também, me esforçando para mostrar a ele meu lado mais doce. — Muito prazer, senhor Dantte. Espero que consiga conversar e dançar ao mesmo tempo... Há muito que quero saber sobre o senhor — comecei, dando forma aos meus planejamentos de como conhecer um pouco mais sobre aqueles garotos. — Absolutamente, alteza. Adrian Dantte tinha vinte e dois anos e era apenas um pouco mais alto do que eu. Trabalhava de dia com o pai nos moinhos de café da capital, enquanto, à noite, ajudava a mãe a vender tecidos bordados por ela no mercado de Darkot Village. Durante o pouco que dançamos, pude perceber que a vida árdua de trabalhador não era o suficiente para cansar o brilho que Adrian parecia carregar dentro de si. A nossa melodia acabou rapidamente e veio o próximo competidor: Anthony Chasty. Com a minha idade, o senhor Chasty era sobrinho de um dos lordes de Cannehor. Sustentava os olhos âmbar e a pele morena característicos de sua família materna. Anthony era um ótimo dançarino e possuía um riso fácil, ainda que parecesse um pouco tímido. Outra música veio e trouxe consigo outro homem. Charles Decker, de dezoito anos, era loiro e possuía olhos verdes. E... Isso foi tudo o que descobri dele, porque, durante toda nossa dança, seus olhos permaneceram em nossos pés, como se ele tivesse medo de pisar em meus saltos. Tentei ser gentil, mas sua timidez e seu nervosismo me impediram de puxar qualquer conversa. Quando passou sua vez, eu me senti um tanto desanimada e prometi a mim mesma que, assim que pudesse, tentaria me aproximar daquele rapaz. Meus pensamentos sobre o senhor Decker foram interrompidos quando mais um competidor me tomou em seus braços. Com todos aqueles garotos, a dança foi puramente formal e condizente com nossos papeis — eu era a princesa, e eles, meus convidados. No entanto, assim que o próximo homem se aproximou de mim, pude perceber que ele não se daria ao trabalho de me tratar com a pompa que a noite pedia. Ele estava perto. Muito perto. Tão perto que podia sentir seu cheiro e sua respiração. Minhas mãos apoiadas em seu peito me permitiam contar as batidas de seu coração. Engoli em seco e tive de erguer o olhar, pois aquele sujeito conseguia me superar no quesito altura. — Boa noite — disse eu, tolamente. A criatividade para começar uma conversa havia fugido de mim naquele momento. Seu lindo sorriso lateral não contribuiu para diminuir o nervosismo que eu sentia ao estar tão perto de um homem — ainda mais em público. Como princesa, não me foram reservadas muitas chances de poder explorar o campo romântico da vida, portanto aquela era quase uma novidade para mim. — Boa noite, senhorita Heronwood — ele respondeu. — Espero que esteja se divertindo nesta noite. Respirei fundo discretamente e me forcei a me acalmar. É só uma pessoa, Jennifer. Uma pessoa linda e charmosa e que está muito próxima a você, mas é só uma pessoa. Dei meu melhor sorriso e me foquei em nossa conversa. Desviando os olhos de seu rosto bonito adornado por um cabelo loiro e macio, falei: — Não poderia pedir nada mais para essa noite, com certeza. Espero que o senhor esteja aproveitando. Afinal, é o meu convidado. — O baile está perfeito, alteza — murmurou, afastando-se enquanto segurava uma de minhas mãos. Ele me girou e então me puxou de volta para si. A orquestra se tornou mais animada ao ver o ritmo de nossos passos. — E, por favor, me chame de Ethan. Ethan sabia flertar. Ele dançou comigo por mais tempo que os outros, e a cada palavra sua eu sentia minhas bochechas queimarem em uma intensidade diferente. Era um cara ousado e, eu tinha que admitir... Talvez eu tenha gostado um pouco daquela desinibição. Contudo, por mais que tenha sido divertido conversar com ele, fiquei levemente agradecida quando nossa música acabou. Já estava incomodada em perceber o quão fácil eu me envergonhava. Os competidores que se seguiram não foram, nem de longe, tão impetuosos quanto Ethan. Dancei com tantos deles que fiquei perdida: Edward, Patrick, Arthur, David, Louis, Nicholas, Michael, Edmund, Henry, Carl... Assim que terminei de dançar com Carl, minha cabeça estava girando com tantas informações sobre tantas pessoas. Talvez não tenha sido uma ideia tão boa assim fazer um baile... Afastei meu desconforto e decidi dar uma pausa na dança. Meus pés doíam dentro dos sapatos de salto, mas eu fora treinada para ignorar aquele tipo de situação, então poderia ainda, provavelmente, passar mais um bom tempo na pista. A questão era que eu não queria. Contornei as mesas dos convidados, tomando cuidado para não me esbarrar com ninguém que pudesse querer iniciar uma conversa, e fui até o buffet. Ainda tentando me manter invisível, belisquei algumas batatas e tomei uma taça de vinho. Quando olhei em volta para checar se meu disfarce fora descoberto por alguém, um movimento à direita me chamou a atenção. Alguém se esgueirava pelas portas do salão, claramente tentando deixar a festa. Com o baile lotado, a figura alta e magra não fora percebida pelos convidados, mas algo em seus gestos me chamou a atenção... Rapidamente descobri o porquê: o homem possuía feições desconhecidas demais para ser um dos nobres convidados — ele era um competidor. E eu não havia sequer conversado com ele durante a noite toda. Por que, então, ele estaria indo embora? Decidi que queria saber. Eu o segui, caminhando rapidamente pelos cantos do salão. Assim que cheguei às portas, um dos guardas me olhou inquisitivamente, mas eu balancei a cabeça e sorri. Obedecendo às ordens, o soldado abriu passagem e me permitiu escapar da festa. O corredor do salão estava escuro e quieto. As portas pesadas do aposento atrás de mim abafavam qualquer som vindo do baile. A luz que chegava das janelas iluminava apenas parcialmente o caminho, e eu tive de esperar alguns segundos para que meus olhos se acostumassem a pouca claridade. Dei um passo hesitante à frente. — Olá? — falei. Silêncio. — Tem alguém aí? Ninguém respondeu. Eu me senti uma i****a. Comecei a dar meia volta, resmungando comigo mesma, quando o barulho de passos vindos da escuridão me parou. — Pensei que estivesse ocupada demais com suas danças para me notar, princesinha — disse alguém. A figura alta se revelou ao vir à frente e entrar no campo de claridade de uma das janelas do corredor. Mesmo à baixa luz, pude ver olhos incrivelmente azuis e feições bonitas — e um tanto familiares. O cabelo parecia ser claro, mas não podia dizer com certeza de qual cor. — O que está fazendo aqui fora? — perguntei, esquecendo-me do decoro. Um sorriso seco e silêncio me responderam. Minha curiosidade se inflamou. — Quem é você? — tentei novamente. Ele deu mais um passo em minha direção. Suas mãos estavam casualmente enfiadas nos bolsos da calça, sua postura era relaxada. Notei que ele não se curvou em minha presença, como todos faziam. — Por que quer saber, princesinha? O modo como usou meu título fez parecer que estivesse me insultando. Ignorei o desconforto que veio com aquela percepção e dei de ombros. — Só quero saber com quem estou falando. Houve mais um momento de silêncio em que o homem pareceu hesitar, e então ele disse, com a voz baixa: — Christian Blank. — Por que saiu da festa tão cedo, senhor Blank? — perguntei, de repente me lembrando de como ser educada e polida. — Não estava do seu agrado? Ele bufou e desviou o olhar para a janela. Suas íris azuis brilharam com irritação, e eu me senti confusa. — Sempre tão formal... — resmungou, com um muxoxo. Franzi a testa, pensando ter ouvido errado, mas suas palavras seguintes foram altas e claras e não deixaram espaço para dúvida. — Por que n******e ser você mesma por apenas um segundo? Recuei. — Ah... Eu... — gaguejei por um momento, pega completamente de surpresa com sua declaração. Do que ele estava falando? Clareei a garganta e tentei recuperar a compostura. — Bem, senhor, eu estou sendo eu mesma. Esta sou eu. — Não — Christian me interrompeu. Seus olhos se tornaram intensos quando deu mais um passo em minha direção. Sua voz diminuiu em muitos tons, como se estivesse prestes a me dizer algo sério. — Eu vi como age quando está à v*****e, com o rei ou a rainha. Pode se esconder atrás da máscara de princesa o quanto quiser, mas isso — essa competição — nunca vai funcionar se você não for você mesma. Eu balancei a cabeça, estupefata. Com quem aquele homem pensava que estava falando? O que ele sequer sabia sobre mim? — Perdoe-me, senhor Blank, mas eu não uso nenhuma máscara. Eu sou uma princesa. — Não. Isso é apenas uma parte de você, não o todo — ele retrucou, mantendo ainda o rosto sério e a voz baixa. Tive v*****e de estapeá-lo e de rir da ridicularidade da situação, mas apenas estreitei os olhos e cruzei os braços. — E você pode me fazer o favor de dizer quem exatamente eu sou? — disse eu de forma ríspida, sem poder me conter. Christian sorriu como se estivesse satisfeito com minha resposta, o que me deixou ainda mais chocada. Ele parecia gostar quando eu me esquecia do que a palavra "educação" significava. — Bom, isso é você quem vai ter que descobrir, princesinha. Ele me lançou um sorriso lateral e se virou, andando rumo à escuridão. Não tive tempo de reagir ou de tentar pará-lo, então o deixei ir. Por alguns segundos, encarei o lugar onde ele havia estado e franzi a testa. — Que diabos foi isso? — falei comigo mesma quando finalmente saí de meu estado atônito. Balancei a cabeça e dei meia volta. Conforme retornava para o baile, a surpresa daquela conversa me deixou e cedeu lugar a uma sensação de inquietação. O que será que aquele garoto estaria querendo dizer com tudo aquilo? E, mais importante: quem era aquele garoto?
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