— Por que me trouxe até aqui? O que você quer de mim? — Rose perguntou, a voz trêmula, mas firme o bastante para romper o silêncio da cobertura.
O vento cortava como lâminas, arrastando a noite sobre eles. A cidade brilhava abaixo, indiferente ao medo que erguia muralhas invisíveis ao redor. Damon estava a poucos passos de distância. E mesmo assim, parecia perto demais.
Cada avanço dele era medido, elegante, como um predador que não precisava correr para devorar sua presa. O apelido que carregava — O d***o — não era metáfora. Era título, era verdade. O rei do submundo, um homem cuja presença por si só já era sufocante.
— Olhe para o horizonte — pediu, em voz baixa, quase doce. O âmbar do uísque tremulava no copo em sua mão, refletindo como uma pequena chama no escuro.
Rose não obedeceu. O vestido leve colava em sua pele fria, a f***a exibindo uma vulnerabilidade que não queria mostrar. Um anel em seu dedo brilhava, pesado demais, como uma promessa feita em ferro e sangue.
— Diga logo o que você quer. — Ela insistiu, tentando desviar o olhar dele. — Você me deu este anel, disse que eu seria sua para sempre. Mas o que isso significa, Damon?
O sorriso dele cortou o espaço. Não havia som além do vento, e mesmo assim parecia que o riso sussurrava por todas as frestas da noite.
Quando a luz fraca alcançou seu rosto, ela viu os traços perfeitos, a barba cerrada, os cabelos úmidos penteados para trás como após um ritual sombrio. O terno n***o, impecável. E no bolso, um lenço vermelho. Como uma gota de sangue.
Rose recuou até sentir o parapeito nas costas. Um passo a mais seria queda. E, por um instante, a morte pareceu libertação. Mas ela não teve coragem. Se a decisão coubesse a alguém, seria a ele. Sempre a ele.
— Querida... — a voz dele deslizou como veneno quente. — Achei que a resposta estivesse implícita. Vou ser bom para você... se você for boa para mim.
Rose cerrou os punhos, sustentando o olhar.
— Você acha que eu vou ser como as outras? Sim, eu tenho medo de você. Mas isso não significa que vou me dobrar.
Ele sorriu ainda mais. Fascinado. O medo dela era doce, mas a resistência era o vício.
— Olhe para a cidade inteira. — O comando veio como aço.
Ela hesitou.
— O que quer que eu veja?
— Veja o que é meu. — O gesto dele foi amplo, cobrindo os arranha-céus, as ruas, as luzes. — Tudo o que enxerga pertence a mim. E, assim que se casar comigo, também será seu.
— Eu não quero nada. Só quero que me solte. — A voz dela quebrou. — Eu sumo. Nunca mais me verá.
A gargalhada dele rasgou o ar, ecoando como uma lâmina no concreto.
— Rose... você acha que eu deixaria meu pequeno pássaro sair voando? Agora que o tenho, nunca mais.
O frio se infiltrou nos ossos dela. Damon pousou o copo no parapeito, tirou o blazer e estendeu para ela.
— Eu não quero nada seu. — O desafio saiu baixo, mas sincero.
O olhar dele escureceu.
— Tudo o que eu falo é lei. Pegue.
O trovão em sua voz quebrou a resistência dela. Tremendo, Rose pegou o tecido. O perfume dele a envolveu como uma prisão invisível.
As lembranças a atravessaram: o m******e. A frieza com que Damon, e só ele, disparou contra sua família. Um a um. Inocentes. Gritos. Silêncio. Ele a poupou — não por misericórdia, mas porque havia visto algo pior: uma obsessão para cultivar.
Agora, diante dela, Damon parecia quase humano. Quase. Mas Rose sabia. O homem era apenas a máscara; por trás, estava o demônio que a destruíra.
— Amanhã nos casamos. — Sua voz foi sentença, grave e inescapável. — E você vai me obedecer. Tudo o que eu quero acontece. Se me desafiar, eu vou punir você. — O sorriso voltou, lento, venenoso. — E, de certo modo... acho que você vai gostar.
Rose não conteve o impulso. Revirou os olhos.
O ar congelou. Damon inclinou a cabeça, os olhos faiscando.
— Você revirou os olhos para mim?
Ela não respondeu. O blazer dele pesava em seus ombros frágeis como um grilhão.
— Não faça isso de novo. — A voz foi uma lâmina. — A última pessoa que ousou me desafiar... perdeu os olhos.
O coração dela disparou. Ainda assim, sua pergunta cortou o ar:
— Por que não me matou? Por que me obriga a casar? Eu não tenho nada de especial. É só um jogo?
O silêncio dele foi pior que qualquer resposta. Damon apenas tomou o último gole de uísque, pousou o copo com um estalo seco.
— Entre. — A ordem final caiu como pedra. — A noite está fria. Amanhã é um grande dia.
Ele se virou e desapareceu pela porta. A escuridão o engoliu.
Rose ficou sozinha. O vento batia, o parapeito ainda atrás de si. Bastava um salto. Liberdade.
Mas ela não teve coragem.
Não era tão forte.
E já sabia: sua vida ao lado de Damon seria um inferno vivo.