Beatriz O dia começou com um silêncio que não era paz. Era espera. A luz da manhã parecia atravessar o morro com cautela, como quem pede licença para entrar. Na clínica, eu arrumei bandejas e termômetros tentando fingir normalidade, mas os meus dedos denunciavam a ansiedade — batiam um ritmo que ninguém ensinou. Nara me observou por cima da máscara. — Hoje o ar tá pesado — disse, simples. — Tá — respondi, e engoli as outras palavras: “porque eu sinto ele no peito”. Às dez, o rádio velho da recepção chiou. Não era nosso. Era da mercearia ao lado. Voz de homem: “Blindado subindo pela Leste. Equipe civil na Rua 6.” O chão escorregou sob meus pés mesmo estando seco. Mandei mensagem curta: “Você?”. O visto azul não veio. Em vez disso, três toques na lataria do poste perto da janela — dois

