Diário de Teresa Plath
Dia 01/05
Já faz alguns dias que eu tenho oscilações de humor muito severas. Para ser sincera, não chamaria de oscilações. Há o predomínio da tristeza e do vazio. Ontem tive terapia, e senti tanto vazio que fiz uma barriga falsa de grávida. Tirei fotos. A olhei no espelho como se fosse real por um tempo. Por esse tempo fugaz, me senti preenchida por aquele bebê que não existe. Pensei: se eu realmente estivesse, será que o vazio seria preenchido?
Eu acho cômico o conto de que basta ter fé em Deus para que se sinta preenchido. Eu acredito tanto Nele, mas sei que o vazio não se trata de algo do campo espiritual. Somos algo além do espírito. As vezes eu gostaria de ser só um espírito. Pertencer a outro plano, não o terreno. Acho o plano terreno cansativo, sem graça e imprevisível demais para mim. Queria voltar para os lugares dolorosos porém seguros que eu já estive. Queria voltar para aquele que me feriu de tantas formas, mas que sabia muito bem desse meu pequeno/grande problema. Só que o título é: lampejos. Então queria falar dos lampejos...
Estava lavando meu cabelo e coloquei Queen para tocar bem alto, na esperança de que a tristeza descesse pelo ralo junto com os vários fios de cabelo que tem caído constantemente da minha cabeça. Quando Bohemian Rhapsody começou, especialmente na parte do 'Galileo Galileo Figaro', veio o lampejo. O lampejo de felicidade. Eu estalava os dedos no ritmo da música, enquanto a água escorria pelo meu rosto e eu sentia o cheiro do shampoo. Cantei alegremente junto com Freddie, pensando que, talvez, sendo o mundo tão misterioso, em outro plano, ele estivesse me assistindo e torcendo para que a tristeza passasse também. Foi um lampejo de alegria que me fez lembrar de outros lampejos de alegria que aconteceram nos últimos dias. Eu sinto dizer, caro leitor, que não demorou muito. Durou até eu secar o cabelo com a toalha. Não cronometrei o tempo desse lampejo, mas acho que afetos nunca deveriam ser medidos pelo tempo. O tempo é uma bobagem. Não existe.
Quando esse lampejo foi embora rapidamente, me deixou uma saudade gostosa. Eu voltei a sentir o vazio, a falta de sentido e a tristeza que tem me acompanhado há alguns dias. No entanto, eu decidi falar dos lampejos e, desse especificamente, porque a saudade é um outro nome para o desejo. Então ainda há desejo aqui. O desejo dos outros lampejos que virão. Que sejam mais demorados.