CONRADO MALDINI
Temos nessa vida oportunidades que nunca podem ser desperdiçadas. Nunca, em momento nenhum. Eu olho para o relógio da sala de espera, depois olho para o meu lado e vejo Carolina e Lorenzo, sentados, na espera. Lorenzo está com o rosto entre o pescoço dela e ela está quieta.
Precisavam descansar ou daqui a pouco desabariam aqui mesmo.
Já bastava Pedro e Camila, tudo no mesmo tempo.
Era estranho. Agitado.
- Podem ir para casa, eu cuido de tudo que precisar, de manhã vocês ficam aqui.
Era seis da madrugada, na verdade já estava de manhã, praticamente, mas os dois estão desde ontem aqui na clínica, não só eles.
Carolina sorriu.
- Vou recusar sua oferta, Camila já vai ser liberada pro quarto, quero poder acompanhá-la.
- E eu vou acompanhar meu primo - Lorenzo me olhou e olhou para o relógio. - E normal a demora?
- Acho que sim, demorou isso tudo - Suspirei e me levantei. - Vou buscar algo para beber, querem?
Ambos negaram e eu saí em silêncio, passando direto para a lanchonete da clínica. Passar a noite em claro não é legal.
Não foi legal ter que colocar metade da cidade atrás de uma pessoa.
Ficar horas na procura.
Não foi fácil ver todo aquele sangue nele.
Pedro Leonel era uma parte de mim.
Não é fácil ter uma parte da gente danificada, uma parte tão próxima. Pedro é um teimoso, mas eu fiquei com orgulho dele. Orgulho da escolha dele, embora eu quis dar uns tapas nele por ser teimoso. Era Pedro sendo Pedro, no seu jeito de ser. E eu não podia fazer absolutamente nada.
Peguei 200ml de café meio amargo e olhei por entre as mesas e fui vagando até parar.
Literalmente.
Fiquei parado no lugar e olhei atentamente.
Olá doutora, você vem sempre aqui?
Sorri.
Era uma oportunidade, e regra básica: o que se faz com oportunidades?
Alternativa A, aproveitar a oportunidade.
Alternativa B, deixar passar.
Ou alternativa C, vai pega e não solta mais a oportunidade.
Eu sempre aprendi que quando fica em dúvida temos que marcar a letra C, certo?
Eu passei a mão pelo rosto e pelo cabelo, ajeitando, ficando menos assustador. Dei um passo para frente.
Até ouvi uma musiquinha enquanto andava.
Amor, amo você.
Amor, amo você.
Amor, amo você.
Ela está usando óculos. Com os cabelos amarrados no alto de sua cabeça, de maneira formal e ela usava o jaleco, estava toda de branco. Gosto disso. Ela havia saído da sala de parto.
Me agrada isso, ainda mais sabendo que ela ajudou na próxima geração da minha família.
Me faz simpatizar com ela isso. Essa noite.
Eu paro de caminhar e ela acompanha a sombra e vai subindo seu olhar, ela já deve saber que sou eu. Como sei disso? Pelo modo como sua boca forma uma linha fina.
Ela também está surpresa.
Olho para os olhos dela, quando cruza com os meus e sinto a velha sensação.
Ah, isso o maravilhoso.
- Não vai me convidar para sentar? - Falo puxando a cadeira e me sentando, sorrindo.
- Com você é sem ou com convite.
- Está certíssima doutora! - Falo, irônico.
- Conrado?
- Meu nome.
- O que faz... Claro. Entendi, Camila já foi para o quarto, as crianças estão na maternidade. De observação.
- Eu sei - Falei calmo. - Pensei que gostaria de companhia, está tão... sozinha.
Ela olhou pra mim, tirou o óculos e ficou olhando pra mim, sem medo.
Sem drama nenhum.
Como se eu não fosse ninguém para ela.
Se ela pensa que sou um ninguém ela está redondamente enganada.
- Odeio enrolação Conrado, fala de uma vez o que tem para falar.
- Tem certeza que aquele dia sua resposta foi definitiva? - Mando sem teatro.
Eu até estava me conformando com o último encontro, só que não.
- Tinha cara de não ser? - Me levanto e vou embora? Não.
Não mesmo.
Gosto dela assim.
Brava.
Firme.
Ah, ela também é exigente. Muito.
- Não sei, nem lembro de nada, lembro da minha boca na sua, foi bom Linda, muito bom - Tirando o fato do meliante me afastar, mas tudo bem.
Eu olhe para seu rosto.
- Conrado você roubou um beijo.
- Se roubei é meu.
Dei uma gargalhada e ela sorriu, devagar e lentamente.
- Eu estou trabalhando agora.
- Estou vendo - Falo, olhando para os papéis na mesa. - Quis falar com você, juro que tentei me controlar.
Mentiroso.
Nem tentei tanto assim.
- Até imagino como.
- Linda você fere meus sentimentos desse jeito, quando se tornou tão dura?
Ela balançou a cabeça e eu me inclinei para frente.
- Você é pretensioso.
- Um jantar, eu e você, pra deixar isso tudo resolvido - Falo, rápido, a ponto de bala. - Eu e você.
- Jantar com você não está nos meus planos e nunca esteve.
- Mas, agora está.
- Não Conrado, meu não é não.
- Se falar que não eu vou me ajoelhar no chão aqui e pedir de joelho, você aceita? - Me levanto da mesa e fico de pé. - Você tem cinco segundos.
- Senta, estou no meu ambiente de trabalho - Ela olham para os lados e pega minha mão e puxa para baixo.
Eu fico parado, enquanto sinto a mão dela apertar a minha. Eu enlaço a minha mão na dela e sinto a mão quente e sinto a vontade de apertar por um grande tempo.
E eu nunca gostei de passar vontade.
- Conrado...
- Me dá a primeira chance, tudo pode ser diferente entre mim e você, não somos tão jovens assim, então você tem que tentar comigo Linda, eu sou capaz de fazer você feliz, você sabe disso, mas mesmo assim não quer aceitar, por que? Por que raios não quer aceitar que eu quero você, você é a única que pode pegar meu coração pra você, você sabe disso, sempre soube.
Falo, sincero.
- Conrado, senta, ser favor - Eu me sentei, mas continuei segurando sua mão.
- Eu sou o homem pra você, você tem alguém? E isso?
- Não! Conrado eu tenho um filho, um filho problemático e não estou...
- Não use esse discurso, posso fazer bem ao garoto, você viu o que Pedro e Lorenzo se tornaram?
- Um e louco, que leva um tiro e perde sangue até quase morrer?
- Não, um que cumpre promessa e está do lado para qualquer coisa, que faz sua palavra e vontades valer. Meus garotos são meu maior orgulho, não é nem o Império, são eles e minha família.
- Você usa bem as palavras.
- Para ter elas eu tenho fatos, minha querida.
- Você não conhece Nicolau.
Lembrei do sorriso do meliante.
- Conheço o suficiente, ele está em uma fase, embora essa fase dele foi antecipada dos 16 para os 10, sabia?
- Como assim?
- Já deu de cara com a polícia por causa dele? - Perguntei com cautela.
- O que... Como sabe disso? - Ela entrega o jogo.
- Se sua preocupação e ele, não tenha, eu fui pai de dois, posso ser pai de três.
Ela caiu na risada, um riso abafado, irônico.
Que eu fiquei sem entender.
- Você vai me matar de rir! - Eu fiquei olhando para ela, que parou de rir e ficou me olhando, me analisando atentamente.
- Não era pra rir, eu falei sério.
- Tudo bem Conrado, tudo bem! - Ela junta as coisas e eu a acompanho ela.
Calmamente.
- Tudo bem? - Encaro seus olhos.
- Sim, jantar na sexta a noite, meu número ainda é o mesmo - Eu olho surpreso pra ela, enquanto ela se levanta, pegando o copo de café. - Obrigado pelo café.
Eu fico chocado, enquanto eu vejo ela me dar as costas sem dó nenhuma de mim.
Ei, ela levou meu café.