Capítulo 1
Angelina Clark
Ferrada. Não existe palavra melhor para descrever minha situação.
Acabei de perder meu emprego. A empresa onde eu trabalhava como secretária faliu, e, como um efeito dominó, fui jogada no desemprego sem direito a acerto, sem nenhuma segurança. Talvez alguém pense: “Ah, logo você arranja outro emprego. Não precisa de tanto desespero.”
Eu até poderia pensar assim… se minha vida não fosse um verdadeiro inferno.
Meu pai—o único parente que me restava—simplesmente sumiu no mundo, deixando para trás uma dívida absurda com um agiota. Uma dívida que agora caiu no meu colo. E como se isso não bastasse, hoje, quando cheguei em casa, me deparei com um papel colado na porta da minha quitinete. Aviso de despejo. Quatro meses de aluguel atrasado. Tenho trinta dias para pagar ou estou na rua.
O peso disso tudo desaba sobre mim de uma vez. É como se o mundo tivesse decidido se desfazer bem debaixo dos meus pés. Meu peito aperta, minha garganta seca, mas as lágrimas… bem, elas já se tornaram um luxo que não posso mais me permitir.
Suspiro, frustrada, e entro em casa. A porta range atrás de mim quando a fecho. Tiro os sapatos e os deixo de qualquer jeito perto da entrada. Minha bolsa? Jogo no sofá pequeno e gasto que comprei de segunda mão, e que, ironicamente, pode ser a minha cama em breve, se eu for despejada.
Sem pensar muito, sigo para o quarto. O espaço é minúsculo, as paredes descascadas, e o ventilador velho faz um barulho irritante, mas nada disso me importa agora. Tiro a roupa sem cerimônia, deixando as peças caírem pelo chão até ficar apenas de calcinha. Meu corpo pesa como chumbo quando me jogo na cama.
Eu queria dormir, queria apagar esse dia da memória, mas o turbilhão de pensamentos me mantém acordada.
Ao menos ainda tenho meu emprego na boate. Isso, por enquanto, vai me impedir de passar fome. Mas essa não é a minha maior preocupação. Se eu não pagar a dívida logo, sei exatamente qual será a alternativa que o agiota vai me oferecer—e não é uma que estou disposta a aceitar.
Ele já deixou bem claro: ou eu pago, ou viro mercadoria no prostíbulo dele.
Fecho os olhos e respiro fundo. Minha vida está ruindo, despencando como um prédio prestes a desmoronar. Mas, por enquanto, isso ainda não tira meu sono. Não ainda.
22:00. Meu turno na boate está começando.
E antes que alguém tire conclusões erradas, eu sou bartender, nada além disso. Mas, honestamente? O salário não é grande coisa, e ter que lidar com bêbados chatos e insistentes pode ser um verdadeiro inferno.
O som alto da música faz o balcão vibrar enquanto limpo a bagunça que um cliente desastrado deixou para trás. Estou concentrada, esfregando o pano sobre a superfície úmida, quando um homem simplesmente se joga no banco à minha frente.
E que homem.
Ele é bonito de um jeito que não combina com esse lugar. Loiro, olhos claros que parecem atravessar qualquer um que cruzem seu caminho. Alto, forte, e, além de tudo, bem vestido. Não que essa boate seja um buraco, mas definitivamente não é o tipo de ambiente onde se espera encontrar um cara como ele.
— Um whisky duplo, por favor. — Sua voz é firme, sem hesitação.
Aceno com a cabeça, sem dizer nada, e caminho até a prateleira, pegando a garrafa e despejando a bebida sobre o gelo no copo. Em seguida, volto e coloco a dose diante dele.
— Aqui está. — Anoto o valor na comanda para ele pagar na saída.
— Obrigado. — Ele agradece e, sem cerimônia, vira o whisky em um único gole.
Franzo o cenho, surpresa. O cara não está aqui para brincar.
— Mais uma, garotinha.
Reviro os olhos discretamente, mas sirvo outra dose sem questionar. Quando coloco o copo na frente dele, solto um pequeno sorriso de lado.
— Aqui está, senhor. E, a propósito, não sou garotinha.
Ele me encara por um segundo, mas não responde. Apenas pega o copo e leva à boca. Algo na forma como ele se comporta me intriga. Diferente da maioria dos homens que passam por aqui, ele não parece interessado em nada além da própria bebida. Depois desses dois whiskys, ele não pediu mais nada. Não dançou, não se aproximou da pista, e rejeitou todas as mulheres que tentaram flertar com ele.
O que me leva a duas conclusões: ou ele é gay, ou está no fundo do poço.
Duas da manhã. Finalmente, meu expediente na boate chegou ao fim.
Exausta, saí distraída, com os olhos grudados no celular, tentando chamar um motorista de aplicativo. O frio da madrugada fazia minha pele arrepiar, e a rua estava mais silenciosa do que eu gostaria. Foi quando, de repente, trombei em alguém.
— Merda! — resmunguei, abaixando-me para pegar o celular que caiu no chão.
— Tá tudo bem? — A voz masculina soou preocupada.
Levantei a cabeça e, para minha surpresa, era o cara do bar.
— Sim, eu estava focada demais no celular, então foi m*l. — Respondi, ajeitando o aparelho na mão.
Ele sorriu de lado, com um olhar avaliador.
— Você tem como ir embora?
— Motorista de aplicativo. — Balancei o celular e ri de leve.
Ele, no entanto, não parecia convencido.
— Se quiser uma carona, posso te levar. Acho perigoso pegar um Uber essa hora.
Arqueei uma sobrancelha, debochada.
— O mesmo perigo de aceitar carona de um desconhecido.
Ele então puxou algo do bolso e me mostrou um distintivo prateado.
— Sou delegado. Não tem perigo algum.
Cruzei os braços, fingindo desconfiança.
— Quem me garante que isso não é falso?
Ele soltou uma risada baixa, mas manteve o tom sério.
— Se eu estou te alertando sobre os perigos de pegar um Uber sozinha essa hora, por que eu te faria m*l?
Ele tinha um ponto. Além disso, algo nele me passava segurança, um instinto que não conseguia ignorar. Suspirei e cedi.
— Nesse caso, eu aceito. Confesso que sempre fico apreensiva pegando Uber de madrugada.
Entramos no carro, e ele me pediu para colocar meu endereço no GPS. Assim que o fiz, deu a partida. O silêncio no veículo era estranho, e mesmo sabendo que não era da minha conta, eu não conseguia ignorar a sensação incômoda de que ele não estava bem.
— Sei que não tenho nada a ver com isso, mas… você está bem? — arrisquei perguntar.
— Estou, sim. — Sua resposta foi seca, pouco convincente.
Cruzei as pernas e encarei a rua pela janela antes de voltar a falar.
— Não parece. Você bebeu, mas não estava se divertindo. Não dançou, não conversou com ninguém e rejeitou todas as mulheres que tentaram se aproximar. Na minha experiência, isso significa que alguém está no fundo do poço.
Ele soltou um suspiro, mas não desviou os olhos da estrada.
— Talvez um pouco. Mas é um assunto chato e doloroso. Não quero te importunar com isso.
Inclinei a cabeça para o lado, estudando sua expressão.
— Sou boa ouvinte.
Ele sorriu de lado, mas sua resposta foi um corte sutil na conversa:
— Obrigado, mas está tudo bem.
Entendi o recado. Ele realmente não queria falar sobre isso, e eu não estava disposta a forçar. Mas, lá no fundo, minha curiosidade gritava.
O trajeto não demorou muito, e logo reconheci meu prédio. Só que, para minha infelicidade, parado na frente da entrada estava Iron, o ajudante do agiota.
Meu estômago revirou na hora.
Iron era a personificação da ameaça. Alto, com uma presença intimidadora e sempre com aquele olhar de quem se divertia em ver os outros com medo. Eu nunca quis conhecer o chefe dele, e honestamente, preferia que continuasse assim.
Felizmente, eu tinha um dinheiro guardado para pagar essa parcela da dívida. Não queria imaginar o que aconteceria se não tivesse.
A voz grave ao meu lado me arrancou do transe.
— Acho que seu namorado está te esperando.
Virei para Felipe, soltando um riso curto, sem humor.
— Não é meu namorado, só um conhecido.
— Hum. — Ele murmurou, analisando Iron com atenção.
Desci do carro e me inclinei na janela.
— Obrigada pela carona.
Ele deu de ombros.
— Não foi nada. Aliás, meu nome é Felipe.
Sorri de leve.
— Angelina.
— Boa noite, Angelina.
— Boa noite, delegado.
E então me virei, sentindo os olhos de Iron me acompanhando enquanto eu caminhava em direção ao prédio.