Capítulo 54

1016 Words
O sol da manhã atravessava as cortinas finas do apartamento de Hideo, arrancando-o de um sono inquieto. Ele piscou, ajustando-se à luz, e sentiu um incômodo estranho apertar o seu peito. Levantou-se, escovou os dentes e desceu para preparar o seu café da manhã, mas deu de cara com a sua mãe, Mei, sentada tranquilamente no sofá, lendo uma revista. A memória da conversa da noite anterior caiu sobre ele como uma marreta. O rubor subiu por seu rosto. Hideo pigarreou, desconfortável, evitando encarar a mãe diretamente. — Bom dia, mãe... — murmurou, passando a mão pelos cabelos bagunçados. Mei levantou os olhos, um sorriso brincando em seus lábios. — Dormiu bem, Hideo? Ele engoliu em seco, apressando-se em pegar a chave do carro e a carteira. — Tenho trabalho a fazer. Não posso ficar, a gente se fala depois! — disparou, quase correndo para fora do apartamento antes que Mei pudesse dizer mais alguma coisa. — Está fugindo de quem, Hideo? — perguntou Jin, dando de cara com Hideo. — Da minha mãe, e não faça perguntas. — disse ele, passando pelo amigo e entrando no elevador. Jin o seguiu com um sorriso no rosto. No carro, Hideo batucava os dedos no volante, a mente um turbilhão de pensamentos. A imagem de Sayuri surgia em flashes insistentes. Era ciúmes? Era. Mas ele não queria admitir, nem para si mesmo. Quando dobrava a esquina próxima ao seu bar, algo prendeu o seu olhar. Num pequeno café com mesas na calçada, Sayuri estava sentada. E não estava sozinha. Matteo ria ao lado dela, inclinando-se de um jeito íntimo, os olhos presos nos dela. O sangue de Hideo ferveu instantaneamente. Sem pensar, estacionou o carro de qualquer jeito e saiu, Jin ao seu lado tentando acompanhá-lo. — Hideo! Espera! Mas ele já atravessava a rua a passos largos. A raiva queimava em seu peito ao ver aquela cena. Ao se aproximar, viu Matteo tocando a mão de Sayuri de forma leve, mas confiante. E o pior: ela não recuava. Estava rindo, corada. Algo dentro de Hideo se partiu. — Sayuri! — rugiu ele, a voz cortando o ar. Os dois se viraram, surpresos. Matteo apenas sorriu de maneira provocativa, enquanto Sayuri arregalava os olhos. — Que cena é essa?! — Hideo continuou, aproximando-se perigosamente. — Você não está vendo? Estou tomando café com o Matteo. — disse Sayuri com a sobrancelha arqueada. — Não deveria estar fazendo isso! — cortou ele, a voz tensa. — Você é minha noiva, Sayuri! Minha noiva! E está aqui, se expondo desse jeito, manchando o meu nome! Sayuri olhava para Hideo sem acreditar no que estava ouvindo, e pior ainda, aquilo estava vindo de Hideo, que sempre a desprezava. — Eu não sou sua propriedade, Hideo! E saio com quem eu quiser! Matteo assistia à cena com interesse, os olhos brilhando com diversão maldosa. Ele podia ver o quanto Hideo se corroía de ciúmes. — Engraçado... — disse ele em tom leve. — Você fala como se cuidasse dela, mas à primeira oportunidade a deixa sozinha. Hideo virou-se para ele, o punho cerrando-se. — Fique fora disso, Matteo! Matteo ergueu as mãos num gesto de falsa paz, mas o sorriso nunca deixou o seu rosto. — Não se preocupe, só estou aquecendo o seu lugar. Até porque... — ele se inclinou ligeiramente para Sayuri, — algumas pessoas sabem reconhecer o que realmente têm na frente delas. O coração de Hideo batia descompassado, um misto de raiva e medo o dominando. Sayuri olhava para ele com os olhos faiscando de emoção, desafiando-o a dizer mais. — O que você disse? — perguntou Hideo, dando um passo em direção a Matteo. — Esqueça isso, Hideo, vamos. — disse Jin, tentando puxá-lo, mas seu amigo se desvencilhou do seu toque. — Me deixe, Jin! — disse ele, voltando-se para Matteo. — Você sabe que ela é minha noiva e mesmo assim está com ela! — Todos sabemos que você pediu o fim do noivado, Hideo. E, diferente de você, os pais de Sayuri gostam de mim. — Matteo assistia com prazer os olhos de Hideo se escurecerem diante das suas palavras. — Você vem comigo, Sayuri! — disse ele, pegando em seu braço e a puxando para si. Matteo se levantou e tentou impedi-lo, mas Jin entrou na frente. — Vamos deixar os dois se acertarem. — disse ele com a voz firme, encarando Matteo. — Me solte, Hideo! — disse Sayuri, mas Hideo não a ouviu. — Fique quieta, Sayuri! — disse ele, a jogando por sobre o ombro e caminhando em direção ao seu carro. Hideo a colocou no banco do carona, apertou o cinto dela, entrou e arrancou com o carro em alta velocidade, a sua raiva queimando no peito. — Para onde está me levando, Hideo? — perguntou Sayuri, olhando para ele. Ela nunca o tinha visto daquela forma, e o fato daquele lado sombrio dele estar fora de controle fazia um arrepio subir por sua espinha. — Tarde para se preocupar com isso, não acha? — disse ele de forma sarcástica, enquanto fazia uma curva cantando pneu. — Seu maluco! Vai acabar me matando! — disse ela, segurando com força no painel do carro. — Ah! Eu quero você bem viva para poder pagar pela raiva que está me fazendo sentir! — respondeu ele sem olhar para ela, a suas mãos apertando o volante com tanta força que os nós dos dedos estavam brancos. — Enlouqueceu de vez, Hideo! Foi você que pediu o fim do nosso compromisso! — gritou ela para ele. — E você acha que eu não sei disso, Sayuri! — gritou ele de volta, parando o carro bruscamente, os pneus cantando. O coração de Sayuri batia de forma descontrolada enquanto ela observava Hideo se virar para ela, os seus olhos mais sombrios do que ela jamais tinha visto em toda a sua vida. A pessoa à sua frente era totalmente diferente da que ela conhecia. Olhando nos olhos assustados de Sayuri, Hideo percebeu que, pela primeira vez, poderia perdê-la de verdade. E essa ideia era insuportável.
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