A noite de Mei tinha sido inquieta, pesadelos com a morte de Harukia a tinha deixado acordado por longas horas, e aproveitando que não conseguiria dormir mais, ela se arruma e se levanta.
Mei descia as escadas da mansão com a leveza de quem já tinha tomado a sua decisão. O dia estava claro, o céu tingido de azul e com poucas nuvens, como se a própria manhã a convidasse a sair, mesmo que o seu espírito não tivesse tão animado com aquilo.
Ela ajeitou a bolsa no ombro e caminhou até a porta, mas antes que pudesse girar a maçaneta, a voz grave e tranquila de Vito a fez parar.
— Para onde você vai? — perguntou ele, surgindo no corredor, os olhos atentos e a postura serena, embora uma tensão discreta marcasse os seus ombros largos.
Mei virou-se com um sorriso gentil. Ao menos era o que ela pensava que tinha lhe dado.
— Chegou uma nova coleção de roupas no shopping... — começou ela, com aquele brilho animado no olhar que há tempos não se via. — Quero comprar algo especial para Sayuri. Ela vai ficar noiva do Hideo em breve, e eu quero presenteá-la.
Vito assentiu, aproximando-se e, com um gesto natural, abriu a porta para ela. Ele tinha a visto chorar durante dias, e o seu rosto sempre estava abatido, ver ela animada por algo tão simples o deixava mais aliviado.
— Eu vou com você — disse, num tom firme, mas sem invadir o espaço dela. — Para garantir a sua segurança.
Mei soltou uma risada leve, sacudindo a cabeça. Vito era como a sua sombra naqueles dias, nunca a deixando só e aparecendo quando ela menos esperava.
— Besteira, Vito... Não precisa. Eu só vou ao shopping.
Ele arqueou uma sobrancelha, como quem não precisava de argumentos para justificar a sua decisão. Ele não cederia, ela podia estar tranquila com tudo o que tinha acontecido, mas Vito não gostava dos últimos eventos e não confiava nas pessoas a sua volta o suficiente para cuidar da mão de seu amigo.
— Mesmo assim... eu vou — repetiu, e havia ali algo mais do que apenas preocupação profissional. Vito não sabia o que estava acontecendo com ele, e esperava que Mei também não percebesse.
Mei deu de ombros, aceitando silenciosamente a companhia. Caminharam juntos até o carro estacionado, e Vito abriu a porta para ela, aguardando que estivesse confortável antes de contornar o veículo e assumir o volante.
Durante o trajeto, a cidade passava ao redor deles como um cenário desfocado, mas Vito não via as ruas, nem as pessoas: via apenas Mei. Os seus olhos a seguiam discretamente, registrando o modo como ela ajeitava os cabelos quando o vento os bagunçava pela janela entreaberta, o jeito como apertava a alça da bolsa ao pensar, o sorriso suave que brotava de vez em quando, ao lembrar, talvez, de Sayuri ou de alguma memória distante.
E, a cada gesto dela, o coração de Vito batia mais rápido, como se a lembrança constante de que ela ainda vestia o luto pelo marido o impedisse de se permitir sentir o que, claramente, já estava sentindo. Ou talvez fosse apenas seu espírito otimista desejando que ela o notasse de alguma forma.
Ele apertou levemente o volante, desviando o olhar para a rua, tentando afastar o conflito interno que o consumia. Como podia desejar a felicidade de Mei e, ao mesmo tempo, sentir-se culpado por perceber que, aos poucos, o espaço vazio ao lado dela era o lugar que ele queria ocupar?
E pior que isso, as memórias do seu primeiro amor invadiam a sua mente de forma constante o lembrando que o seu coração tinha um dono, ou era o que ele pensava.
Mei virou o rosto, olhando pela janela, alheia ao turbilhão silencioso de emoções que agitava o homem ao seu lado.
— O dia está bonito hoje... — comentou ela, distraída.
Vito sorriu de canto, sem conseguir evitar o olhar que se demorou um segundo a mais sobre o perfil dela.
— Está, sim — respondeu, num tom quase inaudível.
O silêncio confortável se instalou entre eles, enquanto o carro avançava pelas avenidas movimentadas. Para Mei, aquele era apenas mais um passeio; para Vito, era uma batalha silenciosa, onde o desejo e a culpa duelavam a cada batida de seu coração.
Ao chegarem ao shopping, Vito estacionou o carro e, antes que Mei pudesse descer, ele já havia dado a volta e aberto a porta para ela, num gesto automático, mas cheio de zelo.
— Obrigada — disse ela, sorrindo.
— Sempre à disposição — respondeu ele, desviando rapidamente o olhar para não se perder naquele sorriso.
E então, lado a lado, caminharam para dentro do shopping, sem saber que aquele dia seria apenas o início de algo muito maior do que ambos podiam imaginar.
Os olhos de Vito estavam atentos a tudo a sua volta, o seu objetivo era garantir a segurança de Mei e iria cumprir aquilo. Eles rapidamente encontram a loja que ela desejava ver e entram.
Mei observa os vários quimonos a sua frente pensando com cuidado em qual ficaria mais incrível em Sayuri. Ela se distrai em meio a escolha do quimono e acaba escolhendo dois, um branco com flores de cerejeira e outro rosa claro com detalhes em dourado. Assim que paga Vito a acompanha até a saída.
— Espero que ela goste. — Diz Mei observando a sacola em suas mãos.
— Ela vai. Conheço pouco de Sayuri, mas ela parece ser alguém... amável. — Diz ele após pensar com calma.
— Sim, ela realmente é. — Diz Mei entrando no carro.
Vito fecha a porta e assume o volante. Os seus olhos atentos a estrada a sua frente. Após alguns minutos o seu olhar escurece ao ver um veículo os seguindo pelo retrovisor. Ele pega alguns desvios tentando despistar o veículo, mas ele insiste em os acompanhar.
— Esta com o cinto de segurança Mei? — Pergunta Vito.
— Sim. Por que? — Pergunta ela.
— Estamos sendo seguidos.