Shiro caminhava à frente, com passos firmes e pesados, enquanto Mariana e Sora o seguiam em silêncio, os olhos como duas braças de fogo, uma mistura de medo e revolta. O portão da casa que durante tanto tempo haviam chamado de lar abriu-se lentamente, como se também ele relutasse em testemunhar aquela despedida forçada.
Hideo tinha sido claro com seu chefe dos soldados, tudo o que eles poderiam levar da casa era as roupas, isso por que ele se sentia misericordioso para aquilo. Tudo o que Mariana e Sora usavam era sobre as lágrimas e sofrimento da mãe de Hideo e eles não permitiria que isso continuasse, e aquilo era apenas o começo.
— Têm dez minutos. — disse Shiro, a voz seca, sem qualquer traço de compaixão. — Levem apenas as suas roupas, nada mais.
— O que você quer que eu faça? Que agradeça meu irmão por sua generosidade? — Diz Sora com sarcasmo encarando o homem a sua frente.
— Seria um como, algo que vocês dois nunca fizeram ao longo desses anos. É bom que conheçam a partir de hoje o seu lugar. — Shiro assiste com prazer os olhos de Sora se escurecerem, mas ele não o retruca.
Sora trocou um olhar rápido com Mariana; ambos cerraram os punhos, mas sabiam que discutir seria inútil. Avançaram para o interior da casa, cada passo mais pesado do que o anterior. O lugar ainda cheirava às flores que Mariana gostava de colocar na sala, as mesmas que Sora comprava para ela dias atrás. Agora, tudo aquilo parecia-lhes tão distante, como se não lhes pertencesse mais.
— Aquele desgraçado está nos humilhando publicamente! — Diz Mariana espumando de raiva. Ela pensava que seria fácil criar discórdia entre os conselheiros e fazer seu filho acender ao poder, mas ela estava profundamente errada, se eles queriam o lugar de Hideo, teriam que tomar a força.
— Não será por muito tempo. Meu querido irmão se esquece do que sou capaz, mas ele vai descobrir muito em breve. — Diz Sora.
Em silêncio, começaram a enfiar roupas e pequenos objetos em duas malas. Mariana olhou para os quadros na parede, para as fotografias de momentos felizes... e soube que não poderia levar nada daquilo.
Na cabeça dela não entrava o fato daqueles momentos terem sido construidos sobre a dor da esposa de Haruki, mas Hideo pensará naquilo quando havia decidido recuperar os imóveis que seu pai havia dado a eles.
— Só o essencial — murmurou, mais para si do que para Sora. Ela vai até a sua penteaderia e paga a caixa de joias que havia ali, era uma pequena fortuna e Mariana era grata por Haruki ter lhe dado tantas ao longo dos anos.
Quando terminaram, desceram com pressa, arrastando as malas pelo chão de mármore frio. Caminharam em direção à garagem, onde o carro preto que Haruki lhes tinha dado brilhava sob a luz pálida do entardecer. Sora apertou o comando, destrancando as portas, e colocou a mala no banco traseiro. Mariana já abria a porta do passageiro quando a voz ríspida de um soldado os interrompeu:
— Esse carro não. Vocês não têm permissão para usá-lo, ou nenhum dos outros.
Eles se viraram, e ali estavam dois soldados armados, bloqueando a saída com uma postura imponente.
— O quê? — Sora arregalou os olhos, a voz tremendo de indignação. — Este carro é nosso!
O soldado não esboçou qualquer reação além de repetir, com mais frieza:
— Esse carro agora pertence a Hideo. Vocês não podem usá-lo.
Um riso seco e amargo escapou dos lábios de Sora, enquanto Mariana apenas balançava a cabeça, incrédula.
— Levem essas malas. — disse Shiro, que havia se aproximado com passos calmos. — Não se esqueçam: tudo o que Haruki lhes deu agora pertence a Hideo. Vocês não têm mais qualquer direito aqui.
Aquelas palavras, lançadas como lâminas frias, rasgaram a dignidade de ambos. Sora sentiu o sangue ferver, o ódio queimando-lhe o peito. Não era apenas a perda das posses, mas o desprezo, a humilhação deliberada que os esmagava. Mariana, ao seu lado, lutava para conter as lágrimas, agarrando a mala como se fosse a última âncora de quem ela era.
Shiro fez um gesto e os soldados se moveram, escoltando-os até o portão. Não houve espaço para despedidas, nem mesmo para um último olhar para a casa que fizera parte das suas histórias por tanto tempo. O portão fechou-se atrás deles com um estrondo metálico, frio e definitivo.
Ali, na rua poeirenta, com duas malas e um mundo inteiro despedaçado, Sora apertou a mão de Mariana. Ele não precisava de nada daquilo, tinha a sua própria renda e fortuna, algo que tinha conquistado ao longo dos anos trabalhando como espiã para os inimigos de seu pai. Ao que parecia todo o seu esforço tinha valido a pena.
— Eles podem ter levado tudo... — murmurou ele, a voz carregada de raiva e dor. — Mas vamos recuperar tudo de novo.
Mariana assentiu em silêncio, o olhar endurecido pela humilhação, mas também pela determinação silenciosa de quem não pretendia desistir.
— Sim, aqueles malditos pagarão por tudo o que estão nos fazendo filho. — Diz Mariana segurando o braço de Sora. — Eu quero que Mei morra!
Sora Sorri com as palavras da mãe, ele sabia que ela guardava profundo ódio de Mei por nunca ter conseguido conquistar o amor de Haruki. Por maias que seu pai mimasse a sua mãe e os protegesse ela nunca tinha conseguido o que mais queria do poderoso líder da Yakuza, seu coração.
— Isso eu posso fazer por você mãe. E vai ser muito divertido ver Hideo chorar no túmulo dela. — Diz ele rindo ao imaginar como aquilo destruiria Hideo de uma vez por todas.
E, ao longe, do outro lado do portão, Shiro observava-os partir, indiferente, como se nunca tivessem sido mais do que sombras passageiras. O seu trabalho ali estava cumprido, com uma última olhada para o lugar ele junta seus soldados e parte.