Hideo ergueu o olhar lentamente. A sua expressão, até então controlada, estalou em incredulidade. Os punhos se cerraram, e a mandíbula se contraiu num espasmo de fúria. Como ousavam?
O ódio dominava o seu coração enquanto ele olhava para a mulher à sua frente. Ela havia ultrapassado todos os limites ao entrar naquele lugar com o seu bastardo, esfregando na cara da sua mãe a infidelidade do pai em um momento tão delicado.
— Eu tenho o direito de estar aqui — declarou Mariana, com a voz firme, quase desafiadora. — Eu amei Haruki… e este — pousou a mão sobre o ombro de Sora — é o nosso filho.
Hideo olhou para o meio-irmão com desprezo. Ele podia fingir bem, mas não era páreo para Hideo. Ele via a intenção nos olhos do garoto — queria apenas causar uma cena, e estava conseguindo.
As palavras cortaram o ar como uma lâmina afiada. Hideo ficou imóvel por um instante. O sangue parecia ferver em suas veias. O mundo à sua volta encolheu-se até caber apenas naquela imagem: Mariana, altiva, diante do corpo do homem que destruíra a sua família… e agora reclamava espaço no luto.
As lembranças surgiram como um vendaval. As lágrimas da mãe, as noites em que chorava em silêncio, humilhada pelas escapadas de Haruki, pela arrogância de Mariana. E agora, aquela mulher ousava profanar até o último adeus?
— Cale-se! — disse ele, a voz rouca, mas carregada de uma fúria sombria. — A menos que você queira que eu a cale à força.
Ricardo e os outros se aproximaram lentamente de Hideo, temendo que ele pudesse fazer uma besteira com a mulher à sua frente. Nunca o tinham visto tão fora de si como naquele instante.
Mariana deu um passo à frente, ignorando o aviso. Os seus olhos fuzilavam os de Hideo em desafio, diante de todos os presentes.
— Não vou me calar, Hideo. Seu pai nos amava. Quis estar conosco até o fim, mas você e a sua mãe...
O estalo ressoou como um trovão no silêncio do salão. Mariana caiu no chão, atônita, os olhos arregalados de choque e dor. O rosto ardia com a marca vermelha da mão de Hideo. Ela passou a mão no rosto, sentindo-o dormente, sem acreditar no que acabara de acontecer.
Todos olhavam para Hideo sem acreditar no que ele tinha acabado de fazer. Era como se a pessoa diante deles não fosse o amigo que conheciam tão bem.
Ele se aproximou, olhos fixos nela, sombrios como a noite sem lua. Era como se a desafiasse a abrir a boca novamente diante da sua presença.
— Nunca mais pronuncie o nome da minha mãe com essa boca suja. Nunca mais! — sibilou ele, a raiva misturada com uma dor profunda, há muito entalada em seu peito. — Isso já não é mais o tempo em que podia humilhá-la e sair impune. Eu sou o chefe desta família agora… e não vou permitir mais vergonhas. Cortarei a sua língua se disser mais uma palavra sobre a minha mãe.
Sora, ainda mudo, olhava tudo com olhos impenetráveis. Hideo sentiu o olhar do garoto se cravar nele como uma pergunta muda. E naquele instante, o ódio que sentia por aquelas pessoas apenas ganhava mais vida. Para Hideo, eles eram como abutres sobre a carcaça do pai, tentando tirar proveito de tudo o que podiam, mesmo em um momento tão delicado.
— Não pode falar assim com a minha mãe — disse Sora, dando um passo à frente e encarando Hideo.
— p**a! — gritou Hideo em alto e bom som, deixando todos chocados. — v***a! c****a! Me diga, Sora, como quer que eu chame uma vagabunda que se deita com um homem casado por interesse?
O choque percorreu cada rosto naquele lugar. Mei se aproximou do filho, tocando-lhe o braço de leve. Ela não desejava que ele continuasse com aquilo no dia do velório do pai.
— Filho... — Hideo apenas se virou para ela, e, quando Mei viu o reflexo nos olhos do filho, travou no lugar. Aquilo era algo que jamais imaginou ver em Hideo — era sombrio e cheio de raiva.
— Não. Chega, mãe. Você nunca mais vai passar por isso por causa dessas pessoas — disse ele, voltando-se novamente para Mariana e Sora.
— Ele também era meu pai — insistiu Sora.
— O que quer que eu faça? Eu não engravidei a p**a da sua mãe! — disse ele. Então, um sorriso curvou os seus lábios. — Deixe-me resolver isso.
Com um movimento rápido, Hideo agarrou Sora pelo pescoço, torcendo o braço dele para as costas com a outra mão. Arrastou-o até onde estava o corpo do pai, encostando a cara de Sora na beirada do caixão.
— Olhe só o que temos aqui, papai: o seu bastardo veio se despedir — disse ele com uma voz ácida. — Achei que seria injusto que ele não o visse antes que não reste mais nada do seu corpo.
— Senhor Shinoda, eu... — começou um dos homens, mas apenas um olhar de Hideo o silenciou.
— Me interrompa de novo e teremos mais um velório esta semana — disse Hideo, e o homem se encolheu diante do tom frio de sua voz, permanecendo em silêncio.
Hideo pegou o irmão e o jogou para trás, derrubando-o no chão. Mariana correu até ele, desesperada.
— Sora!
— Eu estou bem, mãe — disse ele, tentando se levantar.
— De joelhos! — ordenou Hideo, aproximando-se deles.
— Você enlouqueceu! — gritou Mariana, com os olhos marejados.
— Prestem atenção, todos aqui — pediu ele, e o salão caiu em silêncio, observando o que ele faria a seguir. — Quem é a dama da Yakuza?
A pergunta pairou no ar. Todos sabiam que Hideo não toleraria nenhuma afronta à sua mãe naquele dia.
— A senhora Mei Shinoda, senhor — disse um dos aliados, fazendo uma leve reverência.
— Não conhecemos outra senão Mei, sua mãe, Hideo — disse Kyota, o pai de Sayuri.
— Sim, Mei Shinoda é a dama da Yakuza — disse outro, e outros o seguiram, enchendo o salão com aquela confirmação.
— Ótimo. Agora vocês percebem o que são no meu mundo — disse Hideo. — Nada!