Capítulo 15

1055 Words
Hideo permanecia encostado numa das colunas de madeira do salão lateral, afastado do centro da festa. O copo de uísque na mão já estava quase intocado, o gelo derretendo lentamente, como a sua vontade de permanecer ali. Os risos ao redor, as danças, a música — tudo lhe parecia distante, abafado por pensamentos que giravam em círculos. Ele não tirava os olhos de Sayuri. Não tinha como fazer isso depois da discussão que eles tiveram; a culpa o corroía como ácido. Ela dançava novamente, agora com um homem que ele reconhecia vagamente de reuniões diplomáticas entre famílias. E mesmo que o sorriso dela fosse bonito, havia algo forçado demais na leveza dos seus passos. Hideo não conhecia Sayuri, mas sabia quando ela estava tentando esquecer algo que a feria. Pois ele faria o mesmo. — Está aproveitando a vista, Shinoda? — A voz grave chegou antes do homem. Hideo virou-se lentamente e encontrou Yuki Matsumoto parado a poucos passos, a expressão firme como aço temperado. Os olhos puxados e escuros eram uma cópia dos de Sayuri, mas a frieza ali era toda dele. — Yuki. — Hideo inclinou levemente a cabeça em saudação, tentando manter a formalidade. Ele já tinha ouvido muitas coisas sobre Yuki, mas não esperava que ele fosse falar com ele tão cedo. — Sempre achei estranho como você consegue atrair tanto caos estando parado. Impressionante. — Hideo sorriu de canto, mas não havia humor em seus olhos. Ele conseguia ouvir as alfinetadas que Yuki lhe dava com aquelas palavras. — Eu não vim causar confusão. Não hoje. — E era verdade. Ele não esperava que fosse ter aquele tipo de discussão com Sayuri, ainda mais no aniversário dela. — Não parece — respondeu Yuki, cruzando os braços, a postura ereta, protetora. — Você conseguiu estragar a noite da minha irmã antes mesmo de a festa alcançar o auge. Parabéns. Hideo se manteve em silêncio por um segundo. Olhou para o fundo do copo, como se ali encontrasse respostas. Ele podia perceber o sarcasmo escorrendo das palavras de Yuki, e não podia culpá-lo por aquilo. — Eu não queria isso. Só... não consigo lidar com tudo isso do jeito que esperam. Yuki deu um passo à frente, aproximando-se. Ele não acreditava nas palavras que saíam da boca de Hideo e se perguntava onde estava o homem que era temido por todos? — A questão é exatamente essa, Hideo. Ninguém está pedindo que você finja um amor. Mas respeito... isso sim é o mínimo. A minha irmã tem sido forte demais por tempo demais. Ela não merece as suas fugas. — Você acha que eu não sei disso? — Hideo elevou o tom, pela primeira vez deixando transparecer frustração. — Você acha que é fácil, Yuki? Yuki cerrou o maxilar. — Então não diga nada. Mas não a machuque mais do que já fez. Não serei gentil com você se a fizer sofrer novamente — disse ele, fuzilando Hideo com o olhar. — Um acordo não vai te proteger das minhas mãos se magoar a minha irmã, Hideo. Ninguém poderá. Hideo acreditava naquilo. Podia ver a raiva queimar nos olhos de Yuki, e não podia culpá-lo por aquele tipo de sentimento — ele mesmo o tinha causado. Mas, apesar de tudo o que havia ouvido naquela noite, ainda estava decidido a pôr um ponto final naquele compromisso. Ele não desejava mais ver Sayuri sofrer presa a algo que ela também não desejava. Hideo deu um passo à frente, encarando Yuki com intensidade. Não havia ameaça em seus olhos, apenas verdade. — Eu me importo com ela. E lamento que ela tenha sofrido todo esse tempo. — Pare de mentir para si mesmo, Shinoda. Essa besteira é o que diz a si mesmo sempre que se olha no espelho? A minha irmã virou motivo de chacota para todos desde que você fez questão de fugir do seu compromisso. Então, não me venha com esse papinho. Apenas se lembre de sair do meu caminho antes que eu passe por cima de você. Com um último olhar furioso, Yuki partiu até onde Sayuri estava, deixando Hideo com mais coisas em sua mente do que ele desejava naquele momento. — Você tem sérios problemas. — Ao som daquela voz, Hideo se virou imediatamente, encontrando os olhos atentos de Ricardo. — Ricardo! O que faz aqui? — disse ele, mais aliviado por ver um rosto familiar. — O seu sogro fez questão de me convidar, e, já que você é da família, eu queria estar aqui por você. — Ricardo havia relutado muito com aquele convite, mas, no fim, o senso de dever havia vencido. Ele precisava estar lá por causa de seus aliados e, depois, seria uma forma de demonstrar o seu apoio a Hideo. — Obrigado. Acho que, fora minha mãe, você é a segunda pessoa que me diz algo gentil hoje — respondeu ele, com um sorriso triste nos lábios. Quando o garçom passou, Hideo pegou dois copos de uísque, tomando um em um único gole. — Não sei o que houve, mas conheço a reputação de Yuki. E, se ele falou com você, é porque o assunto é sério. — Apesar de conhecer cada pessoa naquele salão, Ricardo nunca tinha tido interesse em se aproximar deles, mantendo sempre uma distância segura. — Sim, ele é um homem de poucas palavras — disse Hideo com um suspiro. — E Estela? Não veio com você? — Desta vez, não — disse Ricardo com um olhar sugestivo para Hideo. — Trabalho? — Sim. Já que estou aqui, preciso fazer valer o meu tempo, mas ainda hoje estarei retornando para casa. — Ricardo não gostava de estar longe da sua família, então aceitava poucos trabalhos para fora. — Quer companhia? — perguntou Hideo. Ele precisava espairecer um pouco depois de tudo o que tinha acontecido naquela noite. — Não acho uma boa ideia. Aurélio nos contou o que houve. — Claro que ele tinha contado. Hideo sabia que Aurélio não escondia nada de Ricardo, ainda mais sendo algo mais sério. — Estou bem já, e preciso de algo para me distrair desta noite. — Me deixe conversar com mais algumas pessoas, aí podemos sair para caçar — disse Ricardo, com um sorriso de canto, tomando um gole da sua bebida. Aquilo era tudo o que Hideo precisava ouvir.
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