III

2048 Words
Eu estava para levantar a tampa da lixeira imensa, mas a criatura se levantou de supetão, a tampa passou perto da minha cara e o homem sujo, cheio de lixo, tinha um risco na bochecha. O corte se fechou vagarosamente, mas ele olhava com fúria para o guaxinim que segurava pelos pêlos da nuca, enquanto o bicho silvava para ele e o grandão viking lhe mostrava os dentes. — Que merda é essa? — retruquei colocando a mão no peito, satisfeita por não ter sido afetada pela tampa — O que é que “cê” tá fazendo? — Eu vejo que ele me considera um intruso. Esta criatura diminuta e insolente, ousa me olhar com escárnio! — soltou entre os dentes. Eu pisquei, vi o guaxinim chiar, pisquei de novo e o cara estava mesmo mostrando os dentes, competindo com o animal, numa briga territorial. — Essa bosta de livro ainda tá no começo? — resmunguei fazendo uma negativa e puxando o ar da paciência pra me dar com aquela doideira de situação — Solta o guaxinim! — Não me darei por vencido! — Solta o guaxinim! — apontei um dedo pro chão, me mantendo firme no meu pedido e p**a, muito p**a. Como é que um cara que manejou uma espada como aquela estava pagando uma vergonha dessas? — Agora! Solta essa bosta agora! Ou eu vou jogar minha ingratidão no seu ** viking e vou embora, te deixando pra trás! O animal foi solto e para a minha surpresa ele se manteve de pé, silvou pro cara e ele rosnou em retorno. O Viking pareceu decepcionado pela discussão, saiu da lixeira e bateu em seus ombros nus, tirando os vestígios de sujeira. Eu pisquei, me perguntando que merda de brisa era essa, tem um monte de coisa precisando ser resolvida na minha vida e a merda da autora está escrevendo isso? — Você, realmente, discutiu com um guaxinim? — Não devia se impor em minhas batalhas — retrucou firme —, a menos que tenha voltado pra mim. — Voltado? — perguntei cuidadosa, peguei meu celular e solicitei um carro por aplicativo — A gente conversa sobre isso também. Tá com fome? O homem cerrou o maxilar, respirou um tom mais pesado e me olhou com desconfiança, uma vez que o dourado de seus olhos ficaram fortemente intensos. — Não devia se oferecer sem estar preparada, meu monstro a machucaria quando a tomasse. Alguém volta a fita um minutinho, ele tá falando sobre sexo? Como assim eu me ofereci? Certo, eu fiquei meio indignada e com as bochechas queimando miseravelmente e quase não consegui respirar olhando pro dourado daqueles olhos, mas isso era… Loucura! — Mantenha suas mãos longe de mim, eu tenho um canivete na minha bolsa. — falei com cuidado, vi o homem respirar fundo e dar um passo muito perto. O hálito quente soprou em meu rosto, o cheiro de suor e terra impregnou meu nariz e eu quase amoleci. Quase… — É sério, eu tenho um canivete na minha bolsa e um spray de pimenta. A buzina do carro tirou qualquer um de nós dois daquele transe, eu olhei para o lado, engoli em seco e consegui arrumar forças para me afastar. A brisa gelada me ajudou a colocar os pensamentos no lugar e caminhar até o veículo, abri a porta de trás, dei boa tarde para o motorista e apontei para ele entrar. O viking estava desconfiado com a porta aberta, franziu o cenho e acho que se preparou para falar alguma baboseira que não daria tempo de discutir. — É sério, entra. Por favor, só entra. Faz isso por mim. — o pedido pareceu comover o homem, o que me fez até engolir com cuidado, mas fez ele entrar. O homem teve de abaixar sua cabeça, a traseira do carro não parecia ter sido projetada para ele e eu literalmente fiquei no canto, atrás do banco passageiro, porque ele ocupava dois lugares. Ele ficou desconfortável, puxou a bainha da espada, eu fechei a porta e o motorista olhou pra trás. — Cara, você é grande! — admirou o motorista. — Agradeço que reconheça minha imensidão. — eu tentei esconder minha cara, mas para a minha sorte o motorista sorriu e levou na esportiva. — De nada! — respondeu rindo. Ele parecia admirado em estar dentro do carro, notei isso de um jeito divertido e percebi que reparava demais no homem. Em uma parte do trajeto nossos olhares se cruzaram e eu ousei perguntar. — Nunca andou de carro? — Devia saber esta resposta. — ele desviou o olhar e, por algum motivo, me senti estranha por isso. Era como se ele me cobrasse por algo que eu realmente não entendia. [...] — Chegamos, vê se não quebra nada dessa vez. — pedi abrindo a porta e dando passagem ao homem — Ah, não repara a bagunça, eu ainda tinha que ir trabalhar depois do que houve. — Tentei me justificar, vendo a sala ainda com reflexos catastróficos, mas menos bagunçado do que antes. — Sua fortaleza não faz jus ao teu posto. — respondeu olhando o lugar ao redor — Deves retornar imediatamente, este lugar não lhe trás proteção e segurança. — Legal… — respondi sem entender nada — Que a gente não fala a mesma língua, é meio óbvio. De onde você vem tem chuveiro? — ele piscou, mantendo o corpo em riste, os músculos bem desenhados e eu tentei não pensar no homem grande tomando banho — Não precisa responder, eu já saquei. Vem comigo, você precisa de um. — o chamei, deixando minha bolsa bagunçadamente sobre o sofá. Ele era curioso, eu mostrei o banheiro e o homem grande reparava em tudo. Perto da pia olhou a saboneteira, pegou o pote, cheirou, fez uma careta e de repente passou a ponta da língua no bico quando pressionou o dispositivo que despejava o líquido rosa. Por sorte, deu tempo de eu puxar o objeto antes que o homem comesse o sabão. — Ei, isso não se come. — avisei, me perguntando se o homem batia bem da cabeça. — É claro que devo comer, tem o cheiro de minha fêmea acumulado dentro deste objeto. Me pertence. — Eu pisquei atordoada, tentei raciocinar aquilo e voltei o pote em cima da pia. Vamos focar em outra coisa… Puxei a cortina que separava a banheira e tentei explicar. — Aqui é a torneira, você aciona e sai água. Quando a banheira encher o suficiente você desliga. Tem uma ducha, mas você é meio grande. Eu acho que vai se sentir mais confortável na banheira. Isso aí não se come, usa pra esfregar o corpo e se limpar. Me chama se precisar de alguma coisa. Eu sai, não olhei para trás, tentei não pensar nele tirando a roupa nem me perder olhando no dourado de seus olhos. Estava ficando cada vez mais esquisito aquela situação, com coisas estranhas e sensações estranhas, perto de um homem estranho. Eu estou apenas no capítulo três, é muita merda pra processar… — Surreal… — sussurrei para mim mesma. Eu já estava cortando alguns legumes quando olhei pro relógio na parede da cozinha. Já tinha uma panela no fogo e fazia o jantar com cuidado, curiosamente pensando o quanto eu estava maluca em querer agradar o homem. Distraída, levei a tábua com os picados pra dentro da panela e quase deixei o objeto cair no chão quando virei e vi o homem atrás de mim. Um segundo antes do objeto cair, ele segurou a tábua, a faca e a voltou para cima da pia com um reflexo absurdamente rápido. Foi um rápido susto, mas respirei fundo, me encostei na pia e tentei me acalmar. Estando mais tranquila, reparei em seus cabelos molhados, a barba comprida, o desenho do rosto e seus detalhes. Desci os olhos e senti uma batida do coração falhar. Ele tinha os pés no chão e minha toalha enrolada em volta de sua cintura, o corpo era um “V” invertido com os gomos endurecidos e bem alinhados, emanava calor e minha vontade de tocá-lo era fora de controle. Eu nem devo ter percebido quando levantei as mãos, mas senti quando espalmei o peito largo, suspirei hipnotizada e absorvi o calor forte de sua pele aquecer minha palma. Era muito quente para um humano comum, mas ele não parecia estar queimando de febre. Seria um momento romântico, sexy ou clichê. Sei lá, talvez a louca que escreva a minha vida deve ter alguma coisa fora do normal pra me dar um fogo na xoxota nessa altura, e por um estranho; porque se o cara me pegasse, eu ia tacar o f**a-se pras panelas. Ia queimar tudo, mas se minha xana ficasse assada eu não ia ligar. Olhei pra cima, vi ele fazer aquele lance de respirar fundo de novo, encher o dourado de seus olhos com um brilho hipnotizante e enfiou as mãos em minha nuca, sem nem mesmo me avisar. Quando fechou os punhos, prensando meus cabelos, me fez sentir um pouco de dor. Disposta a pestanejar e dizer pra ele afrouxar o toque, ele se aproveitou do momento que abri a boca e tapou meus lábios. Eu não consegui fechar os olhos, tive um lapso estranho de me sentir quase hipnotizada e inerte com o toque, junto a algumas imagens que vieram com força em minha mente. Eu vi uma mulher caindo, um bebê chorando e quase perdi o ar quando me vi apontando para um céu partindo. Por algum motivo eu foquei no bebê, no seu choro, na sua presença e num sentimento que eu não conseguia controlar em meu peito. Forte demais, intenso demais… Era pra ser a droga de um beijo, mas o vento que soprou era extremamente anormal, bagunçava os meus cabelos e começou a bagunçar meu apartamento. As coisas começaram a tremer, a luz piscou e o homem se atentou ao redor, me olhou espantado como se eu tivesse culpa do mau tempo e voltou a procurar por algo no ar. — Fêmea, pare com isto agora! — ordenou na loucura. As coisas na cozinha começaram a cair, preocupando minha carteira e meu salário. Prato, copo, vaso de flor e quase que a minha cafeteira se foi. Eu comecei a xingar a mãe natureza por nos enviar o c*****o de um terremoto no meio de um beijo e da minha crise financeira, mas fui pega de surpresa pelas mãos do homem me olhando com precisão, aproximando sua face na minha e berrando no meio da ventania. — Fêmea, é perigoso, feche isto agora! — D-do que está falando? Fechar o quê? O tempo não estava legal, ficou nublado do nada e eu comecei a temer que podia se tratar de um furacão não avisado. Mas, antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa, o raio que surgiu dentro do apartamento me fez gritar, eu assustei, fui para trás do homem e me aninhei na proteção que ele tinha a me oferecer. Quando foi que ele pegou sua espada, eu não sei, mas estava ali na minha frente de toalha e segurando a espada na mão, olhando para o raio que brilhava intensamente e se preparando para atacar qualquer coisa que fosse. O raio sumiu, o vento parou, o nublado se foi e apenas o início da noite apontava nos céus. Meu apê estava uma zona e só então eu criei coragem para levantar a cabeça e olhar pelas costas gigante do homem, e o que quer que fosse que ele estava olhando. O rapaz que segurava uma espada em posição de batalha no meio da minha sala, nos olhava com uma sobrancelha arqueada. Ele não tinha o peito nu, mas tinha uma espécie de bata n***a, não muito justa em volta do corpo, tinha cabelos loiros e os olhos dourados. Parecia um projeto de adolecente que vivia a base de whey protein muito cedo, com duras feições no rosto, mas abaixou a espada quando me viu. — Quem é esse cara? — perguntei só pra mim, nem era pro viking grande ter ouvido, mas a resposta me calou no momento em que ele respondeu. — Zeus. — a voz grave ocupou o ambiente e fixei meus olhos no rapaz da sala — Nosso filhote.
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