6

1021 Words
MILENA NARRANDO O dia amanheceu rápido, e a verdade é que eu nem consegui dormir. A cabeça fervilhava. Eu só conseguia pensar na furada que eu tinha me metido, em tudo que deixei pra trás e no que ainda estava por vir. Gabi dormia tranquila do meu lado, completamente alheia ao caos que a vida da mãe tinha virado. A porta se abriu devagar e uma mulher que eu nunca tinha visto apareceu. O rosto dela era sereno, mas os olhos estavam atentos, como se medisse cada segundo. — Milena? — ela falou. — Aqui estão suas mochilas. Você tem quinze minutos pra sair daqui antes que alguém chegue. Eu não precisava perguntar quem era esse “alguém”. Era um aviso disfarçado de gentileza. Eu peguei Gabi no colo com cuidado, ela ainda dormia, e fui seguindo a moça. O coração batia acelerado, não só pelo medo, mas pela ansiedade de ir embora. Aquele lugar me deixava sufocada. — O motorista do táxi vai te levar direto pro Morro do Alemão — ela disse. — Meu nome é Natacha. Quem entrou em contato comigo foi a sua amiga Claudia, mulher do GB. Lá você procura um cara chamado DC. — Obrigada — respondi, com sinceridade. Entrei no táxi e o carro começou a se mover. Respirei fundo. Pela primeira vez em muito tempo, senti um fio de esperança. Eu não sabia o que me esperava, mas pelo menos eu estava indo embora. Isso já era alguma coisa. A estrada foi longa. A cabeça doía, o corpo doía, e a alma estava em pedaços. Eu ainda vestia as mesmas roupas de quando saí do morro. Thiago… ele tentou me matar. As marcas dele ainda estavam no meu corpo. Pequenas feridas, superficiais, mas que ardiam como brasa acesa. Era como se cada corte carregasse um pouco do que a gente viveu: dor, arrependimento e medo. — A senhora tem certeza que quer ir pra esse destino? — o taxista perguntou, olhando pelo retrovisor. — Tenho — respondi. — Por favor, me deixe o mais perto que conseguir. Tô com uma criança pequena, e eles estão sabendo que eu vou chegar. Ele assentiu em silêncio. Depois de algumas horas, finalmente avistei a cidade do Rio de Janeiro. Meu coração se apertou. Eu queria mandar mensagem pra Claudia, avisar que eu estava perto, mas meu celular estava sem bateria desde metade do caminho. — Aqui é o máximo que consigo te levar — disse o taxista. — Duas quadras do Alemão. — Tá ótimo — respondi. — Quanto deu? — A corrida já tá paga — ele respondeu. Eu só consegui sorrir. Mesmo cansada, mesmo machucada, mesmo sem rumo certo, eu senti um calor no peito. Ainda tinha gente que cuidava de mim. Peguei Gabi no colo de novo, ela continuava dormindo como se nada estivesse acontecendo. Com as duas mochilas penduradas em mim, segui pelas ruas. Cada passo doía. Cada olhar que recebia me fazia apertar mais minha filha contra o peito. Quando cheguei na entrada do morro, havia homens armados ali na frente. Fuzis atravessados nas costas, olhares desconfiados. Um deles me encarou. — Quem é a dona? — um moleque perguntou, com a arma apoiada no ombro. — Meu nome é Milena. Sou amiga da Claudia e do GB. Tô procurando o DC. Ele tá sabendo que eu tô chegando. O clima ficou tenso por um segundo, até que uma voz grave soou atrás dos garotos: — Pode deixar subir. Olhei na direção da voz. Um homem descia as escadas com passos firmes. Ele me encarava com seriedade, mas sem hostilidade. — Milena, né? — Sim — respondi. — DC — ele disse, estendendo a mão. — Gabriel passou a visão. Disse que você tava chegando. Seja bem-vinda ao Morro do Alemão. — Obrigada. — Vou te levar até onde você vai ficar — ele falou. — Deixa que eu levo a garota. — Não precisa, eu levo — falei rápido, instintivamente. — Você veio pra cá pra ficar em segurança, mas como é que você vai se sentir segura se não confia em mim pra pegar tua filha no colo? Eu que vou garantir que vocês estejam seguras aqui, filhona — ele disse, me olhando nos olhos. Eu não consegui responder. Por um segundo, eu congelei. — Pode pegar — falei, rendida. — Ela tá pesada. Ele pegou Gabi com jeito, e ela se ajeitou no colo dele como se estivesse em casa. O gesto me emocionou. Talvez, só talvez, a gente tivesse encontrado um lugar seguro de verdade. Subimos o morro juntos. Eu ao lado dele, chamando atenção de quem cruzava nosso caminho. As pessoas olhavam, cochichavam. Mas eu não me importava. Eu só queria um teto, um canto, um começo. — Você é mulher do TH, do Paraisópolis, né? — ele perguntou. — Não sou mais — respondi. Ele me encarou. — Ele foi preso, então? — Foi — confirmei. — Aquele filho da p**a vai ter sorte se sair vivo de lá — ele murmurou, sem esconder o desprezo. — Ela é filha dele — falei, apontando para Gabi. Ele olhou pra ela. — Ainda bem que puxou a mãe — disse com um sorriso torto. — Fica tranquila, aqui ele não sobe. E vai ser bem difícil descobrirem que vocês estão aqui. GB é meu parceiro, e só por isso eu tô te deixando ficar. Porque se o TH quiser… isso aqui tudo pode virar uma guerra entre os morros. — Eu não quero trazer problemas — falei com sinceridade. — Não vai trazer — ele disse. — Eu espero que não. — Ele me olhou de novo, agora com um sorriso no rosto. — Chegamos. Aqui é minha casa. Tem um quarto pra vocês. — A gente vai ficar na sua casa? — perguntei, surpresa. — Qual é? Tá com medo de mim? — ele disse, me olhando de cima a baixo. Se quiser que eu continue a partir daí ou acrescente alguma cena específica (como uma lembrança da Milena com o TH, ou uma conversa com a Gabi depois que acorda), posso seguir!
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD