De volta em seu quarto. Anélisse se jogou em sua cama, deixando as lágrimas caírem. Ela não entendia direito o que sentia, mas, sentia. Desde pequena Mattheo sempre esteve com ela, ensinou feitiços, ajudou ela em poções.
Anélisse com a cabeça afundada no travesseiro, se lembrava de memórias felizes com Mattheo.
A primeira lembrança veio suave.Ela tinha uns oito anos, talvez, estava sentada no jardim que ficava atrás da casa dos Ross.
Mattheo, ainda um garoto de cabelo rebelde e olhar curioso, tentava encantá-la mostrando como fazer pétalas de rosa levitarem com um feitiço de levitação que aprendeu
— “Levictaciuum!” — ele dizia, com o tom cheio de orgulho, errando a pronúncia.
A flor subiu torta, tremendo no ar, e depois caiu na testa dele.
Anélisse gargalhava até as lágrimas escorrerem, e ele ria junto, sem se importar em parecer bobo.
Foi o primeiro momento em que ela percebeu: Mattheo a fazia se sentir leve.
A segunda lembrança era de um dia frio, o primeiro inverno que passaram brincando na floresta.
Os dois, com varinhas minúsculas e casacos grandes demais, tentavam criar pequenas chamas mágicas para aquecer as mãos.
Mattheo conseguia, ela não. E quando ele percebeu o lábio dela tremendo, pegou as próprias luvas e colocou nas mãos dela.
— “Se você congelar, eu vou ficar sem quem humilhar nos feitiços, Lisse"
Ela lembrou de sorrir, e ficar brava, batendo de leve em seu braço.
Aos dez anos, veio a lembrança do primeiro segredo compartilhado.
Eles haviam descoberto uma passagem escondida dentro da estufa da família Tomeras , um túnel que levava até o lago n***o.
Ficavam ali por horas, imaginando mundos, criando feitiços inventados, rindo das histórias de fantasmas que Mattheo jurava serem verdadeiras.
— “Se um dia quiser fugir de tudo, me encontra aqui,” ela disse, estendendo a mão.
Ele apertou a dela, prometendo que lembraria.
Aos doze, veio o primeiro gesto de cuidado.
Anélisse tinha escorregado se desviando de um feitiço que ele lançou em um duelo de brincadeira.
Mattheo sem hesitar foi correndo até Anélisse, se abaixou colocando a mão no rosto dela.
— Lisse, me perdoa, eu não quis te machucar. Você tá bem ?
Foi a primeira vez que ela sentiu o coração bater diferente.
Aos catorze, as coisas começaram a mudar.
As conversas ficaram mais longas, os silêncios mais significativos.
Mattheo já não era o mesmo menino, estava mais sério, mais reservado, mas os olhos... os olhos ainda tinham o mesmo brilho quando olhavam para ela.
Lembrava-se de um dia específico no jardim das rosas.Ele estava deitado na grama, ela ao lado, observando as nuvens.
Mattheo virou o rosto e perguntou:
— “Você acha que dá pra amar alguém mesmo sem entender o que é amor?”
Ela não soube responder na época. Mas agora, lembrando daquela cena, sabia que a resposta sempre foi sim.
Aos quinze, veio o primeiro beijo.
Foi tímido, doce, mas cheio de promessas que o tempo ainda não tinha coragem de cobrar.
Lembrava do frio na barriga, do toque das mãos dele nas dela, do jeito como Mattheo parecia hesitar até o último segundo antes de se inclinar.
O beijo foi verdadeiro. Ela se permitiu lembrar de cada detalhe. E naquele instante, ela teve certeza de que nada, nem o medo, nem a distância, nem os pais poderiam apagar o que sentiam um pelo outro.
De volta ao presente, uma lágrima escapou dos olhos de Anélisse.Ela sorriu, sem tristeza era uma mistura de saudade e gratidão.
Mattheo sempre esteve lá.
Em cada risada, em cada medo, em cada promessa silenciosa. Em cada fase da vida dela.
Anélisse se levantou limpando as lágrimas do rosto. E desceu para a sala, ela sabia que uma hora ou outra teria que enfrentar seu pai.