A viagem.( Larissa)

1333 Words
(Continuação) "No quarto frio da solidão você me prendeu, não teve pena de mim, virou-me as costas enquanto eu gritava a plenos pulmões que te amava." Por: Larissa. Pela janela, vejo a vida passar: pessoas que embarcam cheias de esperanças em busca de seus sonhos, outras em busca de oportunidades, algumas querendo rever um ente querido, além de tantas outras que desembarcam nesse terminal rodoviário pelo mesmo motivo. E eu sou só mais uma a ser somada aos passageiros que ocupam esse transporte coletivo. Encosto minha cabeça no vidro da janela, me sentindo vazia por dentro, oca como o tronco de uma velha árvore que vai sendo corroído por dentro aos poucos pelos parasitas. Uma lágrima escorre pelo meu rosto e, rapidamente, eu limpo a trilha da tristeza em minha face. Sem saber o que será de mim, desejo apenas que amanhã a dor seja menor do que a que me enverga hoje. Ele foi meu primeiro amor e minha maior decepção, meu desejo mais profundo que me arrastou pelo chão, me quebrando em pedaços e deixando em mim um rastro de pura destruição. Mostrou-me o infinito em segundos de prazer e me lançou ao tártaro sem hesitar. O mesmo homem que fortaleceu as cores que pintam o meu mundo fez esmaecer meu sol, tornando tudo disforme. Estou desolada, enfrentarei uma jornada em busca de um recomeço, viajarei durante um dia mais quinze horas da Estação Rodoviária de Alegrete para Belo Horizonte, onde, depois de desembarcar, terei que comprar uma passagem para Uberlândia e serão mais longas horas dentro de outro veículo até chegar ao meu destino. Respiro fundo quando o ônibus começa a se mover, saindo do terminal rodoviário. Eu estava deixando meus pais para trás. Ambos estão de pé do lado de fora, me olhando partir. Meu pai me dá um tchauzinho com a mão, enquanto minha mãe chora com a cabeça apoiada em seu peito. Sibilo um "amo vocês" para o meu herói sem capa. A máquina de metal vai ganhando velocidade, manobrando, enquanto isso meus olhos não desviam deles, até que não consigo maie vê-los e o asfalto começa a ser cortado pelo coletivo. Em minha cabeça, eu me martirizo por ter elevado tanto as expectativas que tinha em relação ao meu envolvimento com o italiano. Agora vejo que Marina tinha toda razão quando disse que às coisas relacionadas a relacionamentos e sentimentos são na prática, bem diferentes dos romances água com açúcar que os livros nos vendem e que eu adorava ler. A pura verdade e realidade dos desdobramentos de um amor e uma entrega, a vida real apresentou para mim o seu lado c***l e sórdido. Conheci a dor, a humilhação, a rejeição e o desprezo. Olho para o horizonte vendo a quantidade de casas diminuir conforme deixamos a zona urbana e nos encaminhamos para uma região mais rural. Lembro dos olhares que ele me dirigia enquanto me chicoteava com suas palavras, seu meio sorriso evidenciando o depreciação que sempre sentiu por mim, mas soube camuflar, assim como uma serpente faz para abocanhar sua presa. A decepção dói, esmaga uma pessoa em fração de segundos, porque destrói toda uma estrutura frágil que construímos em torno de qualquer sentimento, principalmente do amor. Esse sentimento t**o que é abrigado por um órgão encéfalo, é capaz de deixar o ser humano cego e passível de cometer as piores loucuras só para estar perto de quem se ama, para obter migalhas de atenção. O pior é o contentamento que sentimos ao ganhar tão pouco, sendo que merecemos muito mais. Esse sentimento que deveria ser pleno, lindo e expelndoroso nos reduz a meras marionetes manipuladas por suas vontades. Mas é assim que somos, reles mortais consumidos por essa chama poderosa que nos enebria, nos atrela aos anseios que são formados em nossa cabeça, e tudo isso repercute pelo poder que esse sentimento possui e acaba se refletindo em nossos espíritos. E o meu espírito está fragilizado, atormentado pelos duros golpes de que fui alvo. Não sei quando e muito menos como, mas a decepção vai passar; no entanto, as lembranças, essas ficarão comigo. O que me resta é seguir em frente. Não vai ser fácil com todas essas feridas que carrego, no entanto, preciso me refazer, ou pelo menos tentar. Ao telefone minha tia disse para o meu pai que consegue uma vaga de vendedora para mim na loja de sapatos que uma amiga dela possui. Omitimos a verdadeira razão para eu ser enviada às pressas para morar com Roberta, irmã do meu herói sem capa. Apenas foi dito que eu queria trabalhar e que Alegrete é muito r**m de serviço para os jovens da minha idade. O temor de todos era uma recusa por parte da minha tia. No entanto, ela ficou radiante diante do pedido. Roberta é a solteirona da família, vive para cuidar da minha avó, dona Caetana, uma senhora no auge dos seus oitenta e três anos. O amor também não foi afável com minha tia. Em seu primeiro casamento, ela sofreu muitas agressões e até mesmo chegou a abortar devido a uma surra que levou do ex-marido. Lembro de ver meu pai furioso quando, depois de três anos, ela revelou a ele, numa visita que nos fez, tudo o que passou nas mãos do Ítalo com quem foi casada por três anos. Como muitas mulheres fazem por medo ou vergonha, Roberta escondeu da família que era maltratada por quem deveria ama-la e protegê-la. Fecho os meus olhos, apoiando a minha cabeça no encosto, tentando não pensar, não lembrar, não sentir. Porém, é impossível. As cenas se baralham na minha cabeça, mesclando os momentos que vivi com ele. As lágrimas não escorrem pelo meu rosto, elas fazem um caminho irnverso em meu interior, as pequenas gotas estão inundando o meu coração e transbordando até a minha alma. "Por que você fez isso comigo, Pietro? Por quê? Eu só te amei, o tempo todo só te amei?" - pergunto mentalmente, sabendo que nunca terei essa resposta. Se eu soubesse que seria assim, tudo por nada, eu não mergulharia de cabeça, acreditando nas ilusões que criei. Amei alguém que nunca me quis. "Como pude ver nele alguém que tem um coração brilhante escondido por trás daquela casca grossa que ele sustenta? Como?" - indago a mim mesma. _ As pessoas são enganadas, Larissa. Ninguém vem com uma plaquinha dizendo se prestam ou não. Você só é mais uma mulher ferida por um homem ardiloso. - murmuro para mim mesma. Não entendo por que o nosso coração escolhe as pessoas erradas para se entregar. Seria tudo mais fácil se eu tivesse me apaixonado pelo Daniel ou pelo Rodrigo. Sou trazida a realidade quando uma voz calma, me tira dos meus pensamento sofridos _ Moça, você sabe quando faremos a primeira parada? - uma senhora sentada na poltrona ao lado da minha me pergunta. _ Infelizmente não sei, mas acredito que ocorrerá logo - falo, tentando dar um sorriso e falho miseravelmente. _ O que houve? Você me parece triste. Já sei, é a primeira viagem sem os pais, o coração está apertadinho, né, querida? - a senhora fala com ternura. "É muito mais do que isso o motivo das minhas tristezas ."- falo mentalmente. - Sim. - respondo. - Oh, querida, é assim mesmo. Nós pais criamos os filhos para o mundo, partir do ninho dói mesmo. Com o tempo passa, sabe, o tempo tem o poder de curar tudo. Ele é um remédio que tomamos a longo prazo para as coisas que não podemos resolver imediatamente. Saudade, dor, decepção, ex-amor, sentimento não correspondido... tudo isso ele se encarrega de curar e .... Não podendo mais aguentar a senhora dizer nenhuma palavra, me levanto. - E... eu preciso ir ao toalete. - falo passando apressada por ela. Praticamente corro pelo corredor do ônibus, me tranco no pequeno espaço e deixo o dilúvio presente em meus olhos cair, desejando arrancar essa página da minha vida e esquecer que Pietro fez parte dela.
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