Prólogo
Wynta havia se algemado com Prata e se acorrentado a uma árvore na parte mais profunda, escura e isolada da matilha, onde não havia patrulhas de fronteira, pois essa extremidade do bosque ficava na base de um desfiladeiro íngreme e inacessível.
Seu amante e futuro Alfa, Nolan, ela acreditava, estava tentando coagi-la a crer que ela não era apenas sua Companheira Predestinada pela Deusa, mas também a do Beta dele, Yale. Tudo, para que os dois pudessem tê-la na cama ao mesmo tempo, e ela sabia disso. Tinha sido apenas ela e Nolan nas últimas duas semanas, depois que ela o tinha deixado tirar suas roupas pela primeira vez nos três meses de namoro. Mas agora ele trouxera seu Beta para o quarto dela e lhe dissera que queria que ela os deixasse tê-la; que ela veria as estrelas porque ambos a tinham farejado, eram seus verdadeiros Companheiros predestinados pela Deusa.
Ela poderia ser órfã e sem lobo, mas não era estúpida o suficiente para acreditar em Nolan quando ele tinha vindo até ela há apenas dois dias, trazendo Yale consigo. Ela havia declarado simplesmente que não sentia aquilo, então, não, e eles a tinham deixado um pouco incomodados, e ela tinha ouvido Nolan dizendo:
— Eu vou convencê-la, não se preocupe. — Para seu Beta, da janela dela. Eles pensavam que, por ela ser sem lobo, não os ouviria, mas eles estavam a apenas alguns metros da janela dela. Até um humano os teria ouvido.
Então, ela tinha decidido testá-los. Faltava apenas uma semana para a lua cheia e ela tinha 18 anos agora. Ela seria capaz de farejar os dois em apenas 7 dias. Se eles fossem seus Companheiros, por que não esperariam até saberem que ela poderia lidar com eles e que os quereria ambos? Ela não tinha interesse nenhum em dormir com Yale e, na verdade, não o achava atraente. Ele era bonito, mas não era o tipo dela.
Mas agora eles tinham vindo até ela mais uma vez, justamente ontem, e realmente tinham se esforçado para convencê-la na privacidade do seu dormitório individual, para onde tinha sido transferida assim que completou 18 anos e não podia mais ficar no orfanato. Chegaram ao ponto de prometer que iriam reivindicá-la, e que ela seria a futura Luna.
Ela não tinha acreditado neles, porque era, de fato, sem lobo e de linhagem desconhecida. Tudo o que ela tinha a seu favor era seu rosto bonito, corpo agradável e sua inteligência. Ela tinha gostado da atenção doce e encantadora de Nolan nos últimos meses, e tinha se apaixonado por ele de forma meio estúpida ao longo do relacionamento. Ele nunca a tinha apressado para nada, ia devagar e sempre queria que as coisas fossem no ritmo dela.
Eles só estavam dormindo juntos há duas semanas, e agora, com isso? O que ele tinha dito e lhe contado estava simplesmente errado, e ela sabia que seria tudo uma mentira.
Quatro dias ela ficou sentada ali, acorrentada e algemada com Prata, com o cheiro mascarado para que ninguém a cheirasse ou pudesse localizá-la com um laço da matilha. Ela não tinha tomado água ou comida, e estava se expondo à fome e à desidratação para provar que era tudo mentira.
Quando o primeiro dia se transformou no segundo, não houve procura por ela. O terceiro dia chegou e ainda não havia guerreiros vasculhando a matilha em busca de um m****o desaparecido, algo que ela tinha visto o Alfa fazer. Vasculhando cada centímetro da matilha ao procurar alguém que estava desaparecido. O quarto dia veio e, novamente, nada: se Nolan e Yale fossem seus Companheiros, eles teriam ido aos seus pais e lhes contado a verdade sobre o assunto, informado que ela estava desaparecida e que não conseguiam encontrá-la em lugar nenhum. Eles estariam, de fato, em pânico total porque sua Companheira estava desaparecida e eles não tinham contato com ela.
Naquela noite, no quarto dia, ela se desacorrentou e removeu a algema, cambaleou de volta para seu dormitório e afundou no chuveiro, completamente exausta pela longa caminhada, pois já estava desidratada. Ela meio que simplesmente caiu para fora do chuveiro quando tentou se levantar e usou o elo mental para avisar o médico da matilha de que precisava de ajuda, e então sucumbiu à escuridão da inconsciência.
Wynta acordou no hospital da matilha com um soro intravenoso no braço e o médico da matilha cuidando da queimadura em seu pulso causada pela algema de Prata.
— Finalmente acordada depois de um dia inteiro. O Alfa ficará feliz, ele precisa saber o que aconteceu. Ele está investigando agora, rastreando seu cheiro até de onde você veio.
Ela não disse absolutamente nada; aquilo apenas confirmou mais uma vez que nem Nolan, nem Yale sabiam que ela estava sequer desaparecida. Ela o observou colocar um curativo em seu pulso.
— Isso vai deixar cicatriz, Wynta. — Ele lhe disse, e ela assentiu.
— Deixaria mesmo que eu tivesse um lobo — ela comentou, porque era Prata. — Recebi alguma visita? — ela perguntou curiosa.
— Não, sinto muito, Wynta. — Ele parecia se desculpar. — Ninguém além do Alfa e da Luna querendo saber seu estado real.
— Certo. — Ela sabia que não tinha família. O nome dela tinha sido dado pela Luna da matilha, nomeada em homenagem à estação em que tinha sido encontrada, Winter (Inverno), e recebera o sobrenome Morgan por qualquer razão que a Luna achou adequada. Foi assim que ela se tornou Wynta Morgan.
Naquela mesma noite, enquanto estava deitada na cama do hospital, imaginando o que diria a Nolan e Yale sobre o comportamento deles, Nolan conectou um elo mental com ela às 23h, e perguntou de forma bem simples:
— Onde você está? É a nossa noite do encontro, e eu estou no seu quarto. Você não está aqui. — Ela podia ouvir o franzir de testa em sua voz.
— Estou no hospital da matilha — ela lhe disse honestamente.
— Na nossa noite de encontro? Por que você pegaria um turno sabendo que vamos ficar juntos? — ele perguntou de volta.
Ele só estava preocupado com o fato de que eles não teriam relações. Ele apenas presumiu que ela estava trabalhando no hospital, sendo que ela nunca tinha trabalhado no hospital antes.
— Tenho certeza de que você pode esperar até a lua cheia — ela afirmou de forma inexpressiva e cortou o elo. Não havia um pingo de preocupação em sua voz. Ela sabia, sem dúvida alguma, que era coerção.
A lua cheia veio e se pôs apenas dois dias depois, e fazia duas horas que ela tinha farejado um Companheiro dentro desta matilha. Ela até sabia quem era, pois reconheceu os dois cheiros naturais de seu amante. Contudo, não havia outro cheiro para ela de forma alguma. Ela não farejou Yale; era apenas mais uma prova da mentira que eles tinham lhe contado, para conseguir o que queriam dela, era só isso.
Ela ainda estava no hospital da matilha, ainda ligada ao soro intravenoso com fluidos correndo. A cicatrização das queimaduras estava lenta porque ela não tinha um lobo. Havia uma enfermeira sentada ao lado da sua cama com um carrinho de curativos, cuidando da limpeza e da troca do curativo da queimadura, quando Nolan entrou no quarto.
Finalmente, ele a tinha rastreado. Ele ficou a olhando, um pouco mais que chocado. Ela o observou enquanto os olhos dele percorriam-na naquela cama, sendo tratada por uma enfermeira, e ele pediu à enfermeira que lhes desse um minuto. Disse a ela que o pai dele o havia pedido para vir e discutir algo em particular com ela.
Ele teve que esperar até que o ferimento estivesse vestido. Ela o observou pegar o prontuário dela e lê-lo por completo, sabia que ele estava vendo todos os detalhes do que estava errado com ela, como ela tinha sido encontrada; ela própria tinha lido. Ele o colocou de volta com uma carranca no rosto, sem dizer absolutamente nada.
Ela havia se apaixonado estupidamente por aquele homem à sua frente, que tinha a mesma idade que ela e partiria para a Faculdade de Alfas amanhã de manhã, caso não farejasse uma Companheira nesta lua cheia. Ela também sabia, apenas pelo fato de ele estar ali sozinho, sem os pais o seguindo para ver quem era sua Companheira, que ele estava ali para rejeitá-la.
Isso, e o fato de terem se passado duas horas desde o pôr da lua; ele teria reconhecido o cheiro dela também. Ninguém esperava tanto tempo para caçar uma Companheira que queria reivindicar. A enfermeira finalmente saiu e Nolan fechou a porta. Ela entendeu aquilo também: o ato seria feito em particular, para que ninguém naquela matilha soubesse que eles haviam se unido.
— Por que você não me disse que estava ferida quando perguntei onde você estava? — ele perguntou diretamente.
Ela ergueu uma sobrancelha para ele; ela lhe tinha dito que estava no hospital. Isso deveria ter sido tudo o que ela precisava dizer.
— Eu estava desaparecida por quatro dias — ela afirmou. — Você nem sequer sabia, sabia? Eu estava algemada com Prata e desaparecida... se você tivesse me farejado naquela época, como disse, você teria sabido e caçado por toda parte por mim... Você e seu Beta só queriam ter relações comigo ao mesmo tempo, e eu não deixaria. Você também está aqui duas horas depois do pôr da lua, Nolan, isso diz muito... Você não é o homem que eu pensava que fosse. — Ela balançou a cabeça. — Rejeite-me e vá embora logo... vá para a Faculdade de Alfas pela manhã, como planeja.
Ele ficou parado olhando para ela, e ela se perguntou se ele pensava que ela contaria aos pais dele o que ele tinha feito. Ela não disse nada, deixando-o na dúvida. Ele suspirou pesadamente após um minuto inteiro e balançou a cabeça, e ela se perguntou se ele estava realmente debatendo consigo mesmo se a rejeitaria ou não.
Mas ela não aceitaria uma rejeição de um como ele.
— Tudo bem, eu farei isso — ela afirmou e olhou-o diretamente nos olhos. — Eu, Wynta Morgan, rejeito você, Nolan Holland, como meu Companheiro. — Ela expressou simplesmente, mas sentia cada palavra.
Novamente, ele apenas ficou parado olhando para ela, quase sem compreender que ela o rejeitaria.
— Imagine, Nolan, se eu tivesse sido influenciada por você e Yale, e deixasse vocês dois fazerem aquilo comigo. Você estaria agora me rejeitando com base no fato de que eu fiz isso, tive relações com seu próprio Beta... — ela balançou a cabeça para ele. — Eu não quero estar ligada a alguém que claramente tentou me coagir. Apenas aceite isso, Nolan.
Ele assentiu lentamente.
— Eu, Nolan Holland, aceito sua rejeição, Wynta Morgan. Você não é minha Companheira ou a futura Luna desta matilha. — ele declarou.
Ela sentiu o rompimento completo do laço e ouviu-o chiar de dor. Isso apenas causou uma dor s***a em seu peito. Ser sem lobo tinha algumas vantagens, parecia.
— Wynta, voltaremos a este assunto quando eu voltar para casa da Faculdade de Alfas — ele declarou, virou-se e saiu do quarto.
Eles discutiriam isso em um ano, discutiriam? Ele esperava que ela simplesmente ficasse sentada esperando que ele mudasse de ideia? Porque ele era um Alfa e ela era sem lobo. Isso não ia acontecer.