O beco escuro e a luz da esperança
Nunca pensei que algum dia da minha vida eu estaria entrando nesse beco estreito e escuro por livre e espontânea vontade. O cheiro de cigarro misturado com urina tomava conta de todo o lugar, fazendo minhas narinas arderem. Me senti em um carnaval de rua decadente e sem glitter.
Enquanto caminhava ansiosa, notei diversas pessoas sentadas no chão, escoradas nas paredes, e senti que observavam cada um dos meus movimentos. Apressei os passos. Eu estava realmente assustada. Definitivamente, aquele lugar não era para mim — ao mesmo tempo, era minha última esperança.
Com passos mais apressados, continuei andando. Mesmo sabendo que não havia ninguém atrás de mim, tive a sensação de estar sendo seguida. Talvez fossem os olhares dos drogados jogados pelo beco. Mais um motivo para encontrar logo essa maldita empresa de empréstimos e sair dali o mais rápido possível.
Quando já estava na metade do beco, vi a placa com o nome que Dará havia me indicado. Um homem baixinho, calvo e acima do peso estava na porta, parecendo fechar o local. Corri em sua direção, tentando impedir.
— Espera! — gritei, me aproximando dele rapidamente. Esperava que ao menos ele parasse e me olhasse, mas continuou fechando a porta, me ignorando completamente.
— Desculpe. Estamos fechados. Volte amanhã — disse, sem nem olhar na minha cara.
— Eu não posso esperar até amanhã. Preciso fazer isso hoje. E a placa aqui diz que é até às 18h. Ainda são 17h38. A vida da minha filha está em jogo. Não posso esperar até o dia seguinte. — Respondi nervosa — E ainda está dentro do horário!
— Eu não me importo nem um pouco com a vida da sua filha. Nem com a sua. Meu turno acabou. Não posso fazer nada sobre seus problemas. Se quiser, volte amanhã cedo. Se sua filha durar até amanhã, podemos avaliar se a senhora pode receber o empréstimo.
Ele olhou para mim com um sorriso malicioso, como se tivesse enxergado algo divertido em mim.
— Você é bem bonita, talvez possamos negociar. Uma mão lava a outra, não é? Se você deixar eu me divertir um pouco com você, posso tentar ajudar com seu problema.
Não havia nada mais irritante do que homens como aquele. Meu primeiro pensamento foi não revidar. Afinal, eu precisava dele para conseguir o empréstimo para a cirurgia da minha filha, Cecília. Tentei me acalmar, respirar fundo, não reagir... mas meu péssimo temperamento ignorou totalmente meu lado racional, que gritava para eu deixar passar.
— Eu não estou de brincadeira, seu merdinha. Abra esse lugar e vamos conversar imediatamente. Preciso agora desse dinheiro — gritei, agarrando sua gravata e apertando com força, fazendo-o tossir com dificuldade para respirar. Soltei logo em seguida. Afinal, precisava dele vivo para conseguir o empréstimo. Um susto seria suficiente para ele entender que eu era muito mais que um rostinho bonito.
— Você quer morrer, p*****a?! — Assim que recobrou a respiração, soltou a gravata e a jogou no chão, antes de puxar uma arma e apontar para mim, se sentindo superior.
— Só se garante apontando uma arma para uma mulher indefesa? Um homem desse tamanho... deveria ter vergonha, não é?
Eu sei, tenho o temperamento horrível. Minha avó sempre disse que acabaria presa ou morta por conta dele. Mas vamos admitir: essa era a melhor forma de fazer esse o****o abaixar a arma. Quanto mais submissa eu parecesse, mais ele iria abusar da situação. Eu não ia permitir.
— Agora tá com medo? Eu estava sendo super educado só por você ser gostosa, mas não estou com paciência para vadias que não sabem o seu lugar. Agora ajoelha. Vamos ver se sua boca tem outra utilidade além de falar merda! — Ele destravou a arma como ameaça. — Vamos logo! Não estou com paciência.
Naquele momento, eu travei. Não sabia o que fazer para sair daquela situação. Vim aqui para salvar a vida da minha filha, não para perder a minha. Meu erro foi insistir? Ou reagir? Não. Independente do que eu fizesse, o resultado seria o mesmo. O babaca iria dar um jeito de chegar nesse ponto. Ah, eu não quero ajoelhar para esse maldito. Ele jamais vai me dar o empréstimo. Para piorar, vou acabar sendo abusada e morta nesse beco esquisito e fedorento. Foi um erro vir aqui. Tenho que pensar em uma forma de escapar.
— O que está acontecendo aqui? — Ouvi uma voz grossa vindo atrás de mim.
— Chefe! — Na mesma hora, o homem baixou a arma, olhando preocupado para quem vinha atrás de mim.
— Wagner! Eu perguntei o que está acontecendo aqui. Terei que ser mais enfático? Ou você acordou com vontade de morrer pelas minhas mãos?
Por alguma razão, tive receio de olhar para trás. Apenas com a voz, eu sentia que aquele homem era perigoso.
— Essa p*****a chegou aqui querendo colocar moral. Falei que estava fechando, ela fez um show e ainda ousou tentar me machucar. Eu estava só ensinando ela a respeitar nossa área, chefe. Seja homem ou mulher, não podemos deixar que nos desrespeitem — Wagner respondeu com meias verdades. E isso me irritou profundamente.
Vou me transformar em vilã só para esse i****a se passar por herói? Nunquinha. Se for pra morrer por causa da mentira desse merdinha, vou cair levando ele comigo.
— Que mentira! Deixe de ser covarde e assuma seus B.O.s. O senhor disse que estava fechando a loja e me mandou vir amanhã, mesmo ainda estando no horário de funcionamento. Negou me atender. Quando insisti, você veio tentar se aproveitar de mim. Te ataquei porque você sugeriu que só me atenderia hoje se eu fizesse alguns favores sexuais. Seja homem. Assuma suas atitudes deploráveis — respondi, me virando para o homem atrás de mim.
Ele tinha uma musculatura impressionante, com um torso esculpido que mostrava cada detalhe dos músculos bem definidos. Seu peitoral e abdômen eram adornados por tatuagens intrincadas, conferindo um ar de mistério e intensidade à sua aparência. Seu rosto era marcado por traços fortes, mandíbula robusta e lábios firmemente cerrados. A barba cheia e bem aparada realçava ainda mais seus traços faciais, diferente do cabelo, baixo e curto. Estava com um blazer preto ajustado, aberto o suficiente para revelar o peitoral tatuado e abdômen. Era impossível não olhar.
— Levem ele e se divirtam um pouco. Façam com esse inseto, o mesmo que ele propôs a cliente. — ele me olhava com um sorriso estranho, acenando para os homens que estavam atrás dele.— Eu mesmo farei o atendimento dessa senhorita
— Eu agradeço — respondi, vendo Wagner ser levado à força.
— Não agradeça ainda, Ariela — o homem disse, abrindo a porta e acenando para que eu entrasse. — Entre. Acho que temos muito o que conversar. Afinal, faz muito tempo que não nos vemos, não é? Estou surpreso. Você não mudou nada, ainda tem a mesma cara que tinha no ensino médio. Eu definitivamente não esperava te encontrar em um lugar como esse.
Era verdade. Mesmo com meus vinte e quatro anos, ainda parecia aquela menina do ensino médio: magricela, com rosto de dezesseis, cabelos loiros que faziam cachos nas pontas e olhos azuis da cor do céu. Mesmo depois de ter Cecília, não mudei nada. Talvez gravidez na adolescência tenha essa vantagem.
Mas isso não é importante agora. Esse homem me conhece do ensino médio? Espera... talvez ele seja quem estou pensando? Eu espero que não tenha me metido em mais problemas, mas quanto mais olho para ele, mais certa estou de que acabei de me meter num problemão daqueles.
— E então, o que aconteceu para alguém como você acabar procurando um agiota? Drogas? Vícios? Dívidas? — Ele me olhava como se se divertisse, embora seu olhar tivesse uma pitada de desgosto. Não faço ideia do que passava pela sua cabeça. — Me diga: como posso ajudar alguém como você?